No dia seguinte ao arquivamento do pedido de impeachment formulado pelo presidente Jair Bolsonaro contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente da Corte, Luiz Fux, criticou de forma contundente a iniciativa do chefe do Executivo.
Segundo Fux, o impeachment “é um remédio extremo” e a sua utilização contra um ministro do STF “tem uma roupagem de uma ameaça, de cassação do juiz” por conta das opiniões proferidas por ele. O presidente do Supremo ainda disse que “juízes têm independência jurídica para decidir de acordo com a lei e a Constituição Federal” e ponderou que “suprir a independência jurídica de um juiz (significa que) não haverá ordem, não haverá paz”.
Fux destacou que juízes e ministros “não podem atender esses reclames exacerbados, sob pena de nós contemplarmos uma ditadura sectária inadmissível numa democracia”. “Não é possível que, em uma democracia, as decisões judiciais sejam criminalizadas. Aqueles que não aceitam as decisões judiciais devem se utilizar dos recursos próprios, das vias próprias jurisdicionais, e não do impeachment”, reprovou, ao participar de um evento. “A democracia brasileira não admite que juízes trabalhem sob o páreo de ter de corresponder à vontade de A ou de B, sob pena de sofrer impeachment.”
Segundo o ministro, o impeachment é um remédio que exige a observância de determinadas tipicidades, como a adequação do fato ao cabimento do impedimento. Conforme frisou, no caso envolvendo Moraes, “não havia absolutamente nenhum reflexo de um ato praticado que se enquadrasse na previsão das instâncias de impeachment”.
Fux sustentou que o arquivamento do pedido de impeachment de Moraes preserva a independência dos magistrados. “Sabe o que restou dessa decisão? Restou exatamente a consagração de um dos requisitos que a sociedade exige do juiz, qual seja, a sua independência. A sociedade espera do juiz nobreza de caráter, conhecimento enciclopédico e, acima de tudo, independência”, enumerou. “E essa independência vem consagrada na Constituição Federal, por meio das garantias da magistratura, que não podem ser conjuradas, sob pena de atentado à democracia, sob pena de uma violação às garantias da magistratura garantidas na Constituição.”
Bolsonaro resolveu pedir processo de impeachment contra Moraes em reação à prisão do ex-deputado e presidente nacional do PTB, Roberto Jefferson, seu aliado. Ele foi preso por ordem do ministro dentro do inquérito, em andamento no STF, sobre a atuação de milícias digitais. Além disso, o presidente não digeriu o fato de ter sido incluído, pelo magistrado, no inquérito das fake news.
Fux também defendeu as investigações iniciadas pelo STF “de ofício”, sem a provocação da Procuradoria-Geral da República (PGR). “Se tem uma operação para invadir o STF, vamos esperar? Não. vamos agir imediatamente e, a posteriori, enviar os autos para o Ministério Público, como foi com o das fake news”, explicou. Bolsonaro tentou impedir que a Corte pudesse tomar decisões “de ofício”. Ele entrou com uma ação contra o artigo 43, do regimento interno do tribunal, que permite a medida, mas o ministro Edson Fachin arquivou o pedido do chefe do Planalto na última quarta-feira.
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Pacheco ignora críticas de Bolsonaro
Alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro por ter arquivado o pedido de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), preferiu não rebater o chefe do Executivo. “Não farei disso um cavalo de batalha”, afirmou.
Pacheco explicou que rejeitou o pedido de Bolsonaro contra Moraes por motivos jurídicos e políticos. Segundo ele, a solicitação não apresentou fatos que se adequassem às hipóteses em que o processo de impedimento é admitido. “Fiz com a consciência jurídica e política. O fato narrado na denúncia não tinha adequação legal”, reforçou, durante um evento.
Além disso, o presidente do Senado comentou que “não se pode questionar decisões judiciais com esse instrumento”. “A decisão jurisdicional é uma decisão que se revê e se rebate por meio dos recursos próprios, na própria instância do Poder Judiciário. Então, com essa consciência jurídica de que não há tipicidade, não há justa causa para o processo de impeachment”, justificou.
O senador ponderou ser “importante respeitar decisões divergentes, inclusive quando nos desagradam”. “Respeito toda e qualquer crítica do presidente Bolsonaro em relação a essa decisão, que é natural que ele tenha”, frisou. Ele disse esperar que o cenário possa ser superado rapidamente. “Marcas são cicatrizadas. Essa marca também será cicatrizada, porque somos experientes e patriotas o suficiente para poder restabelecer o diálogo e conversar aquilo que interessa à sociedade brasileira.”
Horas antes, Bolsonaro reclamou do fato de Pacheco ter rejeitado o pedido dele contra Moraes, mas ter acatado determinação do ministro Luís Roberto Barroso, do STF, de abrir a CPI da Covid na Casa (leia Memória). “Os Poderes são independentes. Eu entrei com a ação para com o intuito de que o processo fosse avante. Nem vou dizer cassar, ou não, o ministro Alexandre de Moraes. O presidente do Senado, o senhor Pacheco, ele entendeu e acolheu uma decisão da advocacia lá do Senado”, afirmou, em entrevista à Rádio Jornal, de Pernambuco. “Agora, quando chegou uma ordem do ministro Barroso para abrir a CPI da Covid, ele mandou abrir e ponto final. Ele agiu de maneira diferente de como agiu no passado. A gente lamenta a posição do senhor Pacheco no dia de ontem (quarta), mas nós continuaremos aqui no limite, dentro das quatro linhas, para buscar garantir a liberdade para o nosso povo.”
Bolsonaro disse estar “praticamente sozinho” e voltou a acusar Moraes de ignorar a Constituição. “Vocês sabem que, nesta briga, eu estou praticamente sozinho. O que são as acusações contra o senhor Alexandre de Moraes? Ele simplesmente ignora a Constituição Federal. Ele desconhece e ignora vários incisos do artigo 5º. Ele ignora o direito de ir e vir, a liberdade de expressão”, sustentou. “Ele abriu o inquérito das fake news, e fake news nem estão tipificadas no Código Penal, e simplesmente começa a investigar qualquer um”, acrescentou, citando a prisão de aliados como as do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ); do presidente do PTB, Roberto Jefferson; e do blogueiro Oswaldo Eustáquio.
“A nossa Constituição é bem clara. A sua liberdade de expressão, se você extrapola, qualquer um entra na Justiça, vai pedir danos morais, ressarcimento, seja lá o que for. Nunca prender as pessoas”, protestou.
Memória
Acionado por senadores
O ministro Luís Roberto Barroso, do STF, determinou ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que instaurasse a CPI da Covid, em resposta ao mandado de segurança apresentado pelos senadores Jorge Kajuru (GO) e Alessandro Vieira (SE), ambos do Cidadania. Eles argumentaram à Corte que Pacheco estava ignorando o requerimento para a instalação do colegiado, protocolado no início de fevereiro pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), com a assinatura de 31 parlamentares, acima do número mínimo necessário, de 27. Após receber a ordem de Barroso, Pacheco leu o requerimento de instauração da CPI, em 13 de abril. A comissão tem como objetivo investigar as ações e omissões do governo no enfrentamento à pandemia.