O procurador-geral da República enfrentou mais um desgaste com o Supremo Tribunal Federal. Enquanto os ministros da mais alta Corte de Justiça se debruçam em inquéritos contra o presidente Jair Bolsonaro, o chefe da PGR, Augusto Aras, tem ignorado pedidos da Corte para que ele se manifeste acerca das acusações feitas contra o chefe do Executivo.
Em pouco mais de um mês, Aras recebeu o ultimato de três ministros diferentes para se pronunciar sobre os processos que envolvem o presidente. A situação tem gerado amplo descontentamento interno, quando procuradores e subprocuradores apontam que o procurador tem falhado na tarefa mais basilar do Ministério Público, que é se manifestar em processo quando requisitado pelo juízo.
Ontem, o STF cobrou mais uma vez uma resposta da PGR. A ministra Cármen Lúcia deu 24 horas para que Aras se posicionasse a respeito da live de Bolsonaro, transmitida pela TV Brasil no fim de julho, na qual o presidente da República descumpriu a promessa de apresentar provas acerca da vulnerabilidade das urnas eletrônicas. Ao invés de fundamentar as acusações, Bolsonaro criticou duramente a atuação do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso.
Na peça judicial apresentada por deputados do PT, Bolsonaro é acusado de ter praticado ato de improbidade administrativa ao fazer uso pessoal de um bem público, de propaganda antecipada e de crime eleitoral.
Cármen Lúcia já havia requisitado a manifestação de Augusto Aras em 3 de agosto, mas não foi atendida. Ao reforçar o pedido para Aras, a ministra destacou que os fatos narrados na peça são “graves” e “de interesse exponencial da República”. “O manifesto interesse público e superior da nação impõem a observância de prioridade no andamento processual do caso”, ponderou a integrante do Supremo.
No primeiro aviso ao PGR, a ministra destacou que “a despeito de se ter consolidado não ser deste Supremo Tribunal Federal o foro próprio para conhecimento e julgamento de ação de improbidade contra autoridade pública, há de se considerar que o grave relato apresentado pelos autores da petição conjuga atos daquela natureza com outros que podem, em tese, configurar crime”.
“Todo comportamento que atente contra a República, os poderes do Estado nacional, especialmente, contra a garantia de independência dos seus membros, os serviços públicos e o patrimônio da Nação constitui, nos termos constitucionais e legalmente definidos, atos de improbidade administrativa que podem conduzir a severas consequências para os seus autores”, alertou a magistrada.
Investigação preliminar
No início da noite de segunda (16/8), Augusto Aras se pronunciou. O procurador-geral da República, Augusto Aras, informou nesta segunda-feira, 16, ao Supremo Tribunal Federal (STF) que abriu uma investigação preliminar para apurar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu irregularidade ao atacar o sistema eleitoral.
No documento, Aras disse que determinou a instauração do procedimento (uma notícia de fato) na última quinta-feira (12/8) e que o Ministério Público Federal ‘apurará os fatos noticiados e discernirá, oportunamente, em torno de eventual(is) prática(s) de ilícito(s) penal(is) e de lastro probatório mínimo para oferecimento de denúncia’.
Aras prosseguiu. “A depender da robustez dos elementos obtidos por meio dessas diligências, cabe ao órgão ministerial, então, discernir em torno de oferecimento de denúncia, de dedução de pedido de instauração de inquérito ou ainda de arquivamento, comunicando-se, oportunamente, ao respectivo Relator”, disse o procurador-geral.
É a primeira vez que Aras se manifesta sobre as declarações de Bolsonaro contra o sistema eletrônico de votação. Embora viesse sendo pressionado por um grupo significativo de subprocuradores a optar por uma ação ‘enfática’ contra as ameaças do presidente, o procurador-geral evitou tomar partido na briga entre os Poderes.
Denúncia ao CNMP
A morosidade de Augusto Aras em relação à conduta de Jair Bolsonaro provocou forte reação no Ministério Público Federal. Na semana passada, um grupo de subprocuradores-gerais aposentados e o ex-procurador-geral Cláudio Fonteles encaminharam ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) um pedido de investigação criminal contra Aras por prevaricação em relação aos processos envolvendo o presidente Jair Bolsonaro e pessoas ligadas ao governo.
Procuradores e subprocuradores consideram um vexame o caso particular da live de Bolsonaro. Comentam que, além de não ser a primeira vez em que Aras demora a se pronunciar, a falha diz respeito a uma questão basilar no Ministério Público, que é se manifestar dentro do prazo estipulado por um juiz. Eles ressaltam que uma coisa é discordar do mérito da manifestação, algo natural. Outra coisa é não haver manifestação, e o juiz ter que reiterar o pedido de vista à procuradoria.
A “advertência” de Cármen Lúcia somou-se a um caso recente, que foi a perda de prazo da procuradoria no caso da prisão do ex-deputado federal Roberto Jefferson, presidente do PTB. O ministro Alexandre de Moraes procurou a PGR no dia 5 de agosto para que se manifestasse em 24 horas, mas a procuradoria só foi se pronunciar sobre a prisão sete dias depois, na noite do dia 12, e a manifestação só foi juntada ao processo no dia seguinte, 13 de agosto, às 13 horas, depois que Roberto Jefferson já havia sido preso (o que ocorreu naquele mesmo dia pela manhã).
A PGR afirmou, em nota, que se manifestou no tempo oportuno – mas ultrapassou o prazo de 24 horas determinado por Moraes. O caso, dentro da PGR, é visto com extrema gravidade. Integrantes da procuradoria entendem que, fosse um membro de primeira ou segunda instância, responderia na corregedoria por situações como essa, em razão de não responder no prazo determinado pelo juiz, em especial em um caso que envolve um pedido de prisão.
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Corregedor corta fonte de recursos
O corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Luís Felipe Salomão, identificou uma lista de canais envolvidos com a divulgação de notícias falsas, cujo objetivo seria ganhar dinheiro com a manipulação de espectadores a partir da monetização das páginas pelas redes sociais. Dentre os perfis ligados à propagação de desinformação, estão o do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), de seus filhos Carlos (Republicanos-RJ), Flávio (Patriota-RJ) e Eduardo (PSL-SP), assim como os de outros quatro deputados federais e influenciadores bolsonaristas.
No âmbito do inquérito administrativo em curso no TSE, Salomão determinou que as redes sociais YouTube, Twitch.TV, Twitter, Instagram e Facebook suspendam imediatamente as monetizações dos conteúdos publicados pelas pessoas e páginas indiciadas na investigação. Os recursos financeiros que vierem a ser obtidos pelos investigados serão transferidos para uma conta vinculada ao tribunal. O corregedor-geral ainda não decidiu se a medida se estende aos perfis de políticos.
Salomão determinou ainda a imediata suspensão de pagamentos às transmissões ao vivo, como as realizadas semanalmente por Bolsonaro. Os conteúdos publicados no canal do presidente no Youtube não são monetizados – a exemplo da tradicional live realizada às quintas-feiras, que o levou a ser investigado pelo TSE por divulgar notícias falsas que atentariam contra os ministros da Corte –, mas os usuários que retransmitem as suas publicações ainda podem se beneficiar financeiramente da disseminação de publicações mentirosas.