Depois de assegurar que vetaria o aumento dos recursos para o Fundo Eleitoral de R$ 2 bilhões para R$ 5,7 bilhões, o presidente Bolsonaro refez as contas. Em conversa com apoiadores à porta do Palácio da Alvorada, disse que deverá retirar apenas o que chamou de “excesso” e, sem dar maiores detalhes, disse que sancionará o Fundo Eleitoral em cerca de R$ 4 bilhões para as eleições do próximo ano. Esse valor, no entanto, não corresponde aos critérios estabelecidos pela legislação eleitoral.
O presidente citou a inflação dos últimos dois anos para justificar os R$ 4 bilhões do Fundo Eleitoral. Ocorre que o valor de 2020, mais a correção inflacionária, elevaria o financiamento eleitoral para R$ 2,197 bilhões. É a soma da despesa de 2020 (R$ 2,034 bilhões) mais os índices do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) de 2021 e 2022 projetados na LDO. Esse valor é muito inferior aos R$ 5,7 bilhões aprovados pelo Congresso Nacional, e ainda bem distante do total mencionado pelo chefe do Planalto. Nas contas de Bolsonaro, seriam retirados cerca de R$ 2 bilhões do valor estabelecido pelos parlamentares na votação da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO).
Na porta do Alvorada, Bolsonaro alegou que pode incorrer em crime de responsabilidade se vetar o restante. Disse esperar não ser atacado pela sanção e, mais uma vez, atacou adversários políticos. Em tom de ironia, avisou que, se os eleitores reclamarem muito, poderão escolher entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Ciro Gomes no segundo turno das eleições de 2022.
“(Quero) deixar claro uma coisa: vai ser vetado o excesso do que a lei garante, tá? A lei garante quase R$ 4 bilhões de fundo. O extra de R$ 2 bilhões vai ser vetado. Se eu vetar o que está na lei, estou em curso de crime de responsabilidade. Espero não apanhar do pessoal, como sempre. Porque se o pessoal começar a bater muito, vai escolher para segundo turno Lula ou Ciro. A crítica é válida quando ela tem fundamento, pessoal”, reclamou.
As últimas declarações de Bolsonaro diferem do discurso da semana passada. Em uma rede social, o presidente afirmou que vetaria, na íntegra, a proposta aprovada pelos parlamentares: “Defendemos, acima de tudo, a harmonia entre os Poderes, bem como a sua autonomia. É partindo deste princípio que jogamos, desde o início, dentro das quatro linhas da Constituição Federal. Dito isso, em respeito ao povo brasileiro, vetarei o aumento do fundão eleitoral”, escreveu.
Antes, Bolsonaro também sugeriu que a correção deveria ter sido feita pela inflação. “No ano retrasado, eu sancionei algo parecido, mas levando-se em conta a inflação do período. Eu não tinha como vetar”, alegou. Fica a cargo do presidente decidir se veta ou não a lei. Ele já repetiu, porém, que a palavra final é do Congresso, que poderá manter ou derrubar o veto.
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“Vete tudo”
Em resposta às considerações do presidente da República, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), afirmou que “a máscara” de Jair Bolsonaro caiu. Para o parlamentar, ficou claro que o chefe do Executivo sempre desejou o aumento do Fundo Eleitoral. O deputado fez a declaração nesta segunda-feira (26/7), horas depois de Bolsonaro anunciar que vai aprovar R$ 4 bilhões para o fundo. Antes, o Congresso elevou o montante de recursos de R$ 1,8 bilhão para R$ 5,7 bilhões.
“A verdade é uma arma muito poderosa, e ela sempre se impõe. Desde que iniciou essa polêmica, alertei da minha desconfiança de que o presidente estava fazendo um jogo de cena para, através dos seus líderes, aprovar os 5,7 bi, vetar e apresentar uma proposta de 4 (bilhões) sob o argumento de que estaria reduzindo quando, na verdade, estaria mais que dobrando o Fundo Eleitoral dos atuais 1,8 bilhão”, disse o parlamentar, em vídeo divulgado pela sua assessoria.
“Não precisou de muito tempo para a máscara do presidente cair e ficar claro que ele sempre desejou e deseja o aumento do Fundo Eleitoral. Bolsonaro, cumpra a sua palavra, vete tudo!”, desafiou Marcelo Ramos.
No último dia 20, o parlamentar avisou que Bolsonaro estava “armando um acordão” para dobrar o fundo eleitoral para R$ 4 bilhões. Na ocasião, Ramos disse que as declarações do presidente de que vetaria o aumento do fundo eram “fanfarronices” e que a verdade “sempre aparece”.
Nas redes sociais, o vice-presidente desafiou o presidente a vetar o fundão. “Cumpra sua palavra e vete tudo, Bolsonaro! R$ 4 bi de fundo eleitoral é golpe nos seus eleitores que acreditaram que você vetaria”, defendeu.
Na conta do contribuinte
Entenda a polêmica do Fundo Eleitoral, que pode chegar a R$ 4 bilhões para as eleições de 2022.
Quando surgiu o Fundo Eleitoral?
O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) foi criado em 2017.
Por que esse fundo foi criado?
O Fundo Eleitoral foi criado após o Supremo Tribunal Federal proibir empresas de financiar campanhas políticas. Os recursos do fundo, provenientes do Tesouro Nacional, são repassados ao Tribunal Superior Eleitoral. O TSE, por sua vez, distribui o dinheiro aos diretórios nacionais dos partidos políticos. Na LDO de 2020, último ano eleitoral, o valor de R$ 2,03 bilhões foi definido internamente pela Comissão Mista de Orçamentos e aprovado pelo Congresso.
Como é a divisão do Fundo?
Segundo a legislação eleitoral, 48% dos recursos do Fundo são divididos entre os partidos, de forma proporcional ao número de representantes na Câmara dos Deputados na última eleição geral; 35% vão para os partidos na proporção do percentual de votos válidos obtidos pelas siglas que tenham pelo menos um representante na Câmara; 15% são distribuídos entre as legendas na proporção do número de representantes no Senado; e 2% são divididos igualmente entre todos os partidos registrados no TSE. No texto da LDO aprovado este mês pelo Congresso, o relator do projeto e deputado federal Juscelino Filho (DEM-MA) incluiu a soma de 25% do valor das emendas de bancada de 2021 e 2022.
Quais partidos se beneficiam mais?
Segundo os cálculos, o PT e o PSL receberão o maior volume de recursos. Cada legenda teria direito a, aproximadamente, R$ 200 milhões. O presidente Jair Bolsonaro, no entanto, sinalizou que vai vetar a proposta aprovada pelo Congresso Nacional. O valor total do Fundo Eleitoral, portanto, deve mudar.