Em uma semana, o Congresso retornará do recesso, e as atenções da sociedade e do mundo político estarão voltadas para o Senado. Além da CPI da Covid, focada nas investigações de irregularidades do governo no enfrentamento à pandemia, a Casa fará duas sabatinas de peso. Os parlamentares vão avaliar a indicação do advogado-geral da União, André Mendonça, à vaga no Supremo Tribunal Federal (STF) e decidirão, também, se darão aval à recondução ao cargo do procurador-geral da República, Augusto Aras. As avaliações ocorrerão num cenário de crise, com o governo e as Forças Armadas criticando os congressistas.
Mendonça e Aras são alinhados com o presidente Jair Bolsonaro. O AGU, quando ministro da Justiça, chegou a perseguir críticos do governo — usou a Lei de Segurança Nacional para determinar à Polícia Federal que abrissem investigações contra opositores do mandatário. Ele encontra resistência no Senado à sua indicação, em especial do presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP). O parlamentar ainda está magoado com o governo por não ter assumido nenhum ministério depois que deixou o comando do Senado. Já o PGR, desde que assumiu o cargo, tem mostrado subserviência ao chefe do Planalto. É acusado por seus pares de se omitir e engavetar ações contra o presidente e demonstrado afastamento do princípio de independência do Ministério Público.
Parlamentar da ala dos independentes, o senador Lasier Martins (Podemos-RS) acredita que as votações de Aras e Mendonça serão apertadas, embora descarte, a princípio, que a Casa recuse as indicações. “O voto é secreto, mas acho que Aras não merece ser reconduzido. Ele se transformou em um pião do presidente, e acho que vai ter dificuldades para passar. Com relação a Mendonça, acho que vai ser uma aprovação renhida, na parelha, com muitos votos contra”, diz.
Da oposição, o senador Otto Alencar (PSD-BA) pensa diferente, ao menos, em relação a Aras. Ele destaca que o PGR tem bom trânsito entre os parlamentares. Já no caso Mendonça, o sinal de discordância ocorre indiretamente. O PSD, segundo ele, ainda não conversou sobre o caso do AGU. Por sua vez, o governista Jaime Campos (DEM-MT) declara apoio aberto aos dois nomes e não vê como os indicados enfrentariam resistência na Casa.
Avaliação
Rodolfo Tamanaha, professor de direito constitucional do Ibmec Brasília, destaca que existem mais regras para escolha de um integrante do Supremo do que para normatizar a escolha e recondução do procurador-geral da República. “A Constituição, no artigo 52, estabelece que compete privativamente ao Senado a arguição dos indicados e, por intermédio de uma votação secreta, aprova ou não”, frisa. “Tanto o cargo de ministro do Supremo quanto de procurador-geral da República ocorrem por meio desse voto secreto. A avaliação do Senado é política, mas, no caso do Supremo, pelo menos, tem de ter os requisitos, como notório saber jurídico e reputação ilibada.”
Conforme enfatiza, a “eventual não recondução de Augusto Aras depende de decisão política”. “Parece-me que o Senado está bem dividido, por conta da atuação da própria CPI da Covid e pela busca por contrapartida do Executivo. Aras, por já ser procurador da República, tem mais ferramentas para convencer os senadores.”
Pressão
Ao mesmo tempo em que aguarda as decisões do Senado sobre seus indicados, Bolsonaro, assim como seus aliados, tenta pressionar pela aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Voto Impresso, em tramitação na Câmara. O mandatário insiste que as urnas eletrônicas são inseguras e sustenta que houve fraudes nas eleições de 2014 e 2018, mas nunca apresentou provas.
Militares compraram as alegações do chefe do Executivo e defendem abertamente a PEC, caso do ministro da Defesa, Braga Netto. Em nota, na semana passada, o general afirmou que “a discussão sobre o voto eletrônico auditável por meio de comprovante impresso é legítima, defendida pelo governo federal e está sendo analisada pelo Parlamento brasileiro, a quem compete decidir sobre o tema”. Na mesma nota, ele negou reportagem do Estadão de que teria pressionado o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) para aprovar a PEC, caso contrário, não haveria eleições em 2022.
A proposta deveria ter sido votada na comissão especial no último dia 16, mas o governo percebeu que o texto não seria aprovado e manobrou para adiar a apreciação, o que deve ocorrer na volta do recesso. Líderes partidários se organizam para derrubar a matéria, impulsionados, também, pelas supostas ameaças de Braga Netto ao processo democrático.
Ataques
Na defesa do que chama de “voto auditável”, o presidente Jair Bolsonaro tem, seguidamente, atacado o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Luís Roberto Barroso. O comandante do Planalto acusa o magistrado de influenciar o Congresso para derrubar a PEC.