As supostas ameaças do ministro da Defesa, general Braga Netto, à realização das eleições de 2022, caso o Congresso não aprove o voto impresso, provocou indignação no Poder Judiciário. Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e associações que representam juristas repudiaram a possibilidade de as Forças Armadas embarcarem na tese do presidente Jair Bolsonaro de não aceitar o pleito do ano que vem se o sistema eleitoral não for modificado.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luís Roberto Barroso, chegou a declarar ter conversado com Braga Netto e com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) — que teria recebido o ultimado do militar — e que ambos desmentiram ameaças às eleições. O magistrado destacou, ainda, que “temos uma Constituição em vigor, instituições funcionando, imprensa livre e sociedade consciente e mobilizada em favor da democracia”.
Apesar da declaração de Barroso, outros ministros da Corte resolveram se manifestar sobre a situação. Gilmar Mendes ponderou que “os representantes das Forças Armadas devem respeitar os meios institucionais do debate sobre a urna eletrônica”. “Política é feita com argumentos, contraposição de ideias e, sobretudo, respeito à Constituição. Na nossa democracia, não há espaço para coações autoritárias armadas”, frisou.
Vice-presidente do TSE, Edson Fachin reforçou que “o discurso autoritário, no Brasil e em diversos países, está trazendo para a arena pública o cavalo de troia que começa a passar pelas portas institucionais”. Segundo ele, “é nesta medida que se vivencia uma política hostil, antipluralista e antidemocrática”.
“Os populistas autoritários são os novos engenheiros do caos. Está em curso no Brasil o processo de demolição das instituições democráticas. No Brasil de hoje, não é de se espantar que um líder populista se recuse a obedecer às regras vigentes, queira suas próprias regras para disputar as eleições e se recuse a ter seu legado escrutinado pela sociedade no bojo de uma eleição política”, disparou Fachin, durante evento promovido pela organização Transparência Eleitoral.
Saiba Mais
Entidades
O Grupo Prerrogativas, que reúne profissionais e docentes da área jurídica, reprovou a suposta “conduta absolutamente deformada” de Braga Netto. “Todas as autoridades públicas estão submetidas ao respeito à Constituição da República, cuja natureza democrática não admite ameaças, tampouco condicionamentos autoritários e golpistas à normalidade do calendário eleitoral”, ressaltou.
Para a entidade, “é inconcebível que o ministro da Defesa cometa a exorbitância delirante de coagir o presidente da Câmara dos Deputados a admitir e implementar uma exótica alteração no sistema de votação, sob pena de acenar com o cancelamento das eleições de 2022”.
“É preciso que os representantes das Forças Armadas, de uma vez por todas, restrinjam-se às suas atribuições específicas, abdicando do desempenho de performances perturbadoras no palco dos embates políticos, que de forma alguma lhes dizem respeito. No momento atual, o gesto de desatino alegadamente praticado por Braga Netto simboliza um flerte com a anarquia”, completou o Prerrogativas, que também pediu “uma apuração rigorosa, assim como eventuais consequências proporcionais ao risco institucional que decorre de uma atitude irregular desse tipo”.
A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), Associação de Juízes para a Democracia (AJD) e Associação Advogadas e Advogados Públicas para a Democracia (APD) divulgaram uma nota conjunta para também expressar a insatisfação com o suposto comportamento de Braga Netto.
“A negativa verbal é frágil e parece intentar manter a sociedade brasileira em um clima de insegurança e medo. Ao manifestar sua repulsa às ameaças golpistas do presidente da República, que teriam sido reiteradas pela fala atribuída ao general Braga Netto, as entidades exigem das instituições democráticas e demais Poderes respostas firmes e atitudes severas em defesa da democracia brasileira”, destacaram as instituições.