A CPI da Covid teve, ontem, um dia de contradições e confronto de datas. Ao depôr no colegiado, Emanuela Medrades — diretora técnica da Precisa Medicamentos, representante no Brasil do laboratório indiano Bharat Biotech, fabricante da vacina contra o novo coronavírus Covaxin — apresentou informações diferentes das que foram prestadas por Luis Ricardo Miranda, responsável pelo setor de importações do Ministério da Saúde, e pelo consultor da pasta William Amorim Santana, sobre o contrato de compra do imunizante pelo governo brasileiro. Ela afirmou ter enviado ao ministério a primeira invoice (fatura para importação) em 22 de março, ao contrário do que asseguraram Luis Ricardo e William, que informaram a data de 18 de março. Segundo Emanuela, os dois “mentiram” à CPI — cujos trabalhos, aliás, foram prorrogados por mais 90 dias, conforme autorização do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG).
No depoimento prestado à comissão em 25 de junho, Miranda e seu irmão, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), disseram que relataram ao presidente Jair Bolsonaro, em 20 de março, no Palácio da Alvorada, suspeitas de irregularidades no contrato entre o ministério e a Precisa para a compra de 20 milhões de doses da Covaxin, por R$ 1,6 bilhão — ao custo de US$ 15 por dose, é a vacina contra a covid-19 mais cara contratada pelo governo federal. O contrato de compra do imunizante foi suspenso em 29 de junho pelo ministério, por recomendação da Corregedoria-Geral da União (CGU).
Os irmãos Miranda disseram à CPI que entregaram a Bolsonaro uma série de documentos, incluindo uma invoice que, segundo eles, foi enviada pela Precisa ao ministério dois dias antes, em 18 de março. Essa mesma informação foi dada aos senadores por William Santana, em depoimento no último dia 9. “Desafio o Luis Ricardo e o William Amorim a comprovarem que a invoice foi enviada em 18 de março”, disse a diretora da Precisa à CPI.
Mas Emanuela caiu em contradição ao ser confrontada com uma declaração dela própria, em uma audiência pública no Senado. No vídeo do evento, exibido na comissão, ela diz ter enviado ao ministério uma série de documentos relativos ao contrato da Covaxin, incluindo a invoice, “na quinta-feira”. Pelo calendário, essa quinta-feira foi 18 de março. Questionada pelos senadores, a diretora da Precisa reafirmou ter enviado o documento apenas em 22 de março. Diante da diferença de versões, o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), anunciou que haverá uma acareação entre ela, Luis Ricardo e William.
A diretora da Precisa também apresentou aos senadores informações que contradizem a ata de uma reunião da qual ela participou, no ministério, em 20 de novembro de 2020. O documento, enviado pela pasta à CPI, informa que, neste encontro, a empresa propôs um preço de US$ 10 por cada dose da Covaxin, mas o contrato para a importação foi fechado, em 25 de fevereiro, por US$ 15 a dose. Emanuela explicou à comissão que os US$ 10 jamais foram apresentados e que eram apenas uma “expectativa”. E tachou de “mentirosa” a ata da reunião.
Emanuela, por sinal, teve uma postura diferente da demonstrada na terça-feira, quando ficou em silêncio na CPI, após obter liminar do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux.
Mas diante da definição pelo magistrado, a pedido da CPI, de que ela só poderia ficar calada diante de perguntas que pudessem incriminá-la, a executiva mostrou-se colaborativa ontem.
Para o senador Humberto Costa (PT-PE), titular da CPI, Emanuela apenas reproduziu a defesa do governo, repetindo a estratégia de outros depoentes de desqualificar os depoimentos de Luis Ricardo e William. “Não foi empecilho para o ministério aceitar (a Precisa) como intermediária de um contrato de R$ 1,6 bilhão o fato de já ter aplicado um golpe (no ministério)”, criticou.