INVESTIGAÇÃO

CPI da Covid: depoentes usam lista de Calheiros para pedir silêncio ao STF

Sessões de depoimentos desta semana na comissão podem ficar prejudicadas. Responsável técnica da Precisa Medicamentos obtém recurso no Supremo para se manter em silêncio, e reverendo alega problema médico para não comparecer ao colegiado

Os convocados pela CPI da Covid, para esta semana, estão tentando se esquivar das oitivas, marcadas, a princípio, para hoje e amanhã. A responsável técnica da Precisa Medicamentos, Emanuela Medrades, conseguiu, ontem, o direito de permanecer em silêncio. O aval foi dado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux, mas o ministro negou outro pedido dela, de não comparecer à sessão. Apesar disso, a tendência entre senadores é de não ouvir a convocada, assim como ocorreu com o sócio da empresa, Francisco Maximiano, que teve o direito ao silêncio concedido pela Corte e cujo depoimento acabou desmarcado na noite do dia anterior. Até o fechamento desta edição, a CPI ainda não tinha decidido se cancelaria ou não a oitiva de Medrades.

A comissão já aprovou a quebra de sigilo telemático e telefônico da responsável técnica. No pedido ao STF, a defesa afirma que ela é investigada pelo colegiado, assim como pelo Ministério Público Federal (MPF) e pela Polícia Federal por causa do contrato do governo com a empresa para a compra da vacina Covaxin.

De acordo com a decisão de Fux, Medrades pode se recusar a responder perguntas que a incriminem e a assinar termo de compromisso de dizer a verdade, “uma vez que os fatos indicam que será ouvida na condição de investigada”, conforme destacou.

Anteriormente, os senadores de oposição e independentes, que formam maioria na CPI, haviam definido que pediriam quebra de sigilo antes dos depoimentos, a fim de embasar as oitivas com informações coletadas nos dados. Entretanto, diante de vários pedidos de convocados ao STF, para se manterem em silêncio, a estratégia mudou. Agora, eles têm dito que aprovarão quebras de sigilo após as oitivas.

Outro ponto que acaba atrapalhando os depoimentos é a lista de investigados elaborada pelo relator, Renan Calheiros (MDB-AL), com o objetivo de pressionar por respostas. A relação acabou sendo usada por depoentes para pedir o direito de permanecer em silêncio, como foi o caso da ex-coordenadora do Programa Nacional de Imunizações (PNI) Francieli Fantinato, que citou isso em seu pedido ao STF.

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Atestado

Também tenta não ir à CPI o reverendo Amilton Gomes de Paula. Ele encaminhou, ontem, à comissão um atestado médico apontando “impossibilidade momentânea de comparecer ao depoimento”, marcado para amanhã. O religioso alega crise renal, com afastamento do trabalho por 15 dias, contando de 9 de julho.

O presidente do colegiado, Omar Aziz (PSD-AM), disse ao Correio que pediu para a junta médica analisar o atestado médico. “Tem que saber quais são as condições. Problema renal, qualquer um pode ter. Ele não pode sair, andar? Está internado?”, questionou.

O reverendo é presidente da Secretaria Nacional de Assuntos Humanitários (Senah). No pedido para que ele fosse ouvido, o vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), argumentou que o religioso teve autorização do então diretor de Imunização do Ministério da Saúde, Laurício Monteiro Cruz, para negociar 400 milhões de doses da vacina AstraZeneca, em nome do governo, com a Davati Medical Supply. Amilton de Paula chegou a postar nas redes sociais fotos de uma reunião no Ministério da Saúde, ao lado de Laurício Cruz. O então diretor foi exonerado na última quinta-feira.

O nome da Senah foi citado no depoimento do cabo da Polícia Militar de Minas Gerais (PM-GO) Luiz Paulo Dominghetti, apontado pela Davati como vendedor autônomo de vacinas da empresa. Ele denunciou que recebeu um pedido de propina de US$ 1 por dose do imunizante quando tentou vender os 400 milhões de doses ao então diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias.

À CPI, Dominghetti disse que, no primeiro contato com o ministério, esteve em Brasília com a Senah, “onde eles se propuseram a ofertar a vacina por um valor humanitário”. “Essa primeira agenda que eu tive aqui foi com o senhor Laurício. Nós levamos a proposta. Ele nos recebeu, disse que o setor não era ali e que nos encaminharia para uma agenda com o senhor Elcio Franco (então secretário-executivo da pasta)”, relatou. O cabo afirmou que, na segunda vez que esteve em Brasília para tratar de vacina, também foi com a Senah.

Participação direta

A Precisa Medicamentos é a representante no Brasil do laboratório Bharat Biotech, fabricante da Covaxin. Foi a empresa que intermediou o contrato entre o Ministério da Saúde e a farmacêutica indiana para a compra de 20 milhões de doses do imunizante a R$ 1,6 bilhão. A negociação, alvo de investigação da CPI por suspeita de superfaturamento, teve participação direta de Medrades.