Política

Prisão na CPI da Covid: como foi a detenção de Roberto Dias em depoimento

Segundo Aziz, Dias cometeu perjúrio ao dizer que não havia marcado um encontro com o empresário e policial Luiz Paulo Dominguetti em 25 de fevereiro, num restaurante em Brasília.

O presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), determinou a prisão do ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Ferreira Dias, sob acusação de que ele teria mentido em seu depoimento.

Segundo Aziz, Dias cometeu perjúrio ao dizer que não havia marcado um encontro com o empresário e policial Luiz Paulo Dominguetti em 25 de fevereiro, num restaurante em Brasília.

Dominguetti, que se apresenta como representante da Davati Medical Supply, diz que o encontro serviu para tratar de uma oferta de 400 milhões de doses da vacina Astrazeneca ao Ministério da Saúde.

Segundo ele, Dias pediu propina durante esse jantar para que o contrato fosse fechado.

A versão do ex-diretor de Logística é que estava tomando um chope com um amigo quando Dominguetti chegou de surpresa no restaurante em companhia do tenente-coronel Marcelo Blanco, ex-assessor do Ministério da Saúde.

Dias também nega que tenha pedido propina e disse que não levou adiante a oferta da Davati dentro do ministério porque, ao receber oficialmente Dominguetti no dia seguinte, ele não apresentou documentos comprovando que a empresa tinha as vacinas para entregar.

A AstraZeneca já disse oficialmente que não trabalha em parceria com a Davati.

Aziz, no entanto, pressionou o depoente a admitir que o encontro com Dominguetti não foi por acaso.

Segundo ele, as mensagens trocadas por Dominguetti, obtidas pela CPI a partir da apreensão do celular do policial, incluem uma troca de áudios em que ele confirma no dia 25 de fevereiro, por volta de 15h, que estava marcado um encontro com Dias naquela noite.

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Ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde é acusado de pedir propina durante negociação de vacinas

O senador, porém, não identificou quem seria o interlocutor do policial nesses áudios, nem divulgou a íntegra das gravações durante a sessão.

"O Dominguetti, no dia 25 às 14h55, ele recebe um áudio dizendo assim: "Tá tudo acertado hoje à noite o encontro seu com o senhor Roberto Dias?". Ele disse: "Está, sim". Isso três horas da tarde. Está nos áudios que temos do senhor Dominguetti", afirmou Aziz.

Pouco depois, o canal CNN Brasil reproduziu o áudio, informando que, na verdade, a gravação é do dia 23 de fevereiro, uma terça-feira, enviado às 16h22. Nessa gravação, o policial fala com um interlocutor identificado apenas como Rafael confirmando encontro com Roberto Dias.

"Rafael, tudo bem? A compra vai acontecer, tá? Estamos na fase burocrática. Em off, pra você saber, quem vai assinar é o Dias mesmo, tá? Caiu no colo do Dias... e a gente já se falou, né? E quinta-feira a gente tem uma reunião para finalizar com o Ministério", diz Dominguetti, segundo a gravação reproduzida pela CNN Brasil.

Até o momento, não foram revelados áudios ou mensagens do próprio Dias marcando ou confirmando o encontro informal com Dominguetti.

Alguns senadores tentaram dissuadir Aziz de decretar a prisão, mas não conseguiram convencer o presidente da CPI.

O senador Marcos Rogério (DEM-RO) questionou o presidente sobre a falta de um fato concreto para prender Dias e disse que outros depoentes cometeram antes falso testemunho à comissão sem terem sido presos.

Rogério afirmou que Aziz cometeu abuso de autoridade ao pedir a prisão de Dias.

"Isso é uma ilegalidade sem tamanho, um absurdo", protestou também a advogada do depoente, Maria Jamile José.

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Simone Tebet tentou demover Aziz da prisão, sem sucesso

Exaltado, Aziz respondeu às críticas. "Ele está preso por mentir, por perjúrio. E, se eu estiver tendo abuso de autoridade, que a advogada dele ou qualquer outro senador me processe, mas ele vai estar detido agora pelo Brasil, porque nós estamos aqui pelo Brasil, pelos que morreram, pelas vítimas hoje sequeladas. Nós não estamos aqui para brincar de ouvir historinha de servidor que pediu propina".

Já o senador Ciro Nogueira (PP-PI) questionou o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEMRO), sobre a manuntenção da prisão, já que ela foi determinada pela CPI quando o plenário da Casa já havia começado uma votação. Segundo o regimento da Casa, nenhum comissão pode atuar quando o plenário está em funcionamento.

"Foi efetuada uma prisão totalmente arbitrária e ilegal, durante a realização da sessão, que é mais ilegal ainda", criticou Nogueira.

Pacheco respondeu que iria apurar os acontecimentos para tomar uma decisão.

"A premissa fundamental é: iniciando-se os trabalhos no plenário do Senado Federal, as comissões devem interromper os seus trabalhos. Essa é a previsão regimental sob pena de todos os atos realizados na comissão que funciona concomitantemente ao plenário sejam nulos. Cabe a todos os senadores da República cumprirem o regimento", disse.

Aziz afirma que Dias fez um dossiê

Antes de decretar a prisão de Dias, o presidente da CPI sugeriu ainda que ele estava escondendo informações da comissão.

De acordo com o senador, os integrantes da CPI sabem que Dias fez um "dossiê para se proteger" e também "onde está esse dossiê e com quem está". O ex-diretor de Logística não respondeu a esses comentários de Aziz.

O presidente da CPI também questionou com insistência se Dias ou o ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde, Elcio Franco, deixaram de seguir alguma ordem do então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, por não acharem correta. O ex-diretor respondeu não se recordar de ordem não cumprida.

Aziz disse então que Dias recebeu ordens da Casa Civil para atender "gente nossa" no Ministério da Saúde.

"O senhor recebeu várias ordens da Casa Civil por um email lhe pedindo para atender (porque) 'era gente nossa, essa pessoa é nossa'. Não foi agora não, isso foi durante o tempo todo que vossa excelência estava nesse cargo", afirmou Aziz.

'Estou sendo massacrado sem provas'

Na abertura do seu depoimento, Dias negou que tenha solicitado propina durante negociação para compra de vacinas contra covid-19 e também rebateu acusações de que teria pressionado para acelerar o contrato firmado pelo Ministério da Saúde para compra de 20 milhões de doses da vacina indiana Covaxin.

Em sua defesa, Dias questionou a integridade dos seus acusadores e afirmou que não há provas que sustentem essas denúncias contra ele.

"Estou há mais de dez dias sendo massacrado e citado em todos os veículos de comunicação sem que haja uma única prova ou indício que sustente tais alegações", disse Dias, em sua apresentação inicial à CPI.

Senadores da CPI questionaram o ex-diretor sobre por que recebeu uma pessoa sem credibilidade como Dominguetti para negociar vacinas.

"Com a Pfizer é difícil, com a Davati é fácil", ironizou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), em referência ao Ministério da Saúde ter demorado meses para responder às propostas da farmacêutica americana.

Dias respondeu que inicialmente presumiu que fosse uma pessoa séria e que estava agindo rápido em busca de vacinas para conter a pandemia.

Também afirmou que o encontro no ministério não era para negociar vacinas, mas apenas para checar a documentação dos ofertantes e avaliar se a proposta deveria ser encaminhada ao então secretário-executivo do ministério, Elcio Franco.

Segundo Dias, porém, o policial não apresentou os documentos necessários comprovando ter as doses das vacinas.

"Os documentos (apresentados por Dominguetti) mostraram mais do mesmo. Não havia carta de representação do fabricante. Entretanto, o mesmo alegou que a receberia em instantes", relatou.

"Tempos depois o mesmo se despediu, disse que teria que ir embora e nunca mais tive notícias, como diversos outros ofertantes de vacina", acrescentou.

Dias disse ainda que o policial é "um picareta que tentava aplicar golpes em prefeituras e no Ministério da Saúde". "Nunca pedi nenhum tipo de vantagem ao senhor Dominghetti e nem a ninguém", afirmou também.

Acusações envolvendo Covaxin

Já os irmãos Miranda alegam que Dias foi uma das autoridades que pressionaram Luís Ricardo Miranda para acelerar o contrato das vacinas Covaxin no Ministério da Saúde, embora, segundo o servidor, houvesse indícios de irregularidades na documentação.

À CPI, o ex-diretor de Logística diz que não há provas de que ele tenha feito essa pressão. Segundo Dias, a mensagem que ele enviou em um sábado à noite, 20 de março, a Ricardo Miranda, apresentada pelo servidor como prova da pressão, não se referia ao contrato da Covaxin, mas à chegada de novas doses da vacina AstraZeneca ao país, no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo.

Segundo Dias, sua preocupação era garantir que não haveria qualquer problema na chegada das vacinas.

"Em 25 de junho, fui injustamente acusado nessa CPI de pressionar um funcionário chefe da divisão de importação (Ricardo Miranda) e como prova foi apresentada uma mensagem encaminhada às 20h46 de um sábado dia 20 de março onde eu perguntava como está à LI (licença de importação) da vacina", disse Dias.

"O teor da minha mensagem se referia a LI da vacina AstraZeneca que chegaria no domingo dia 21 de março um dia depois do envio daquela mensagem e contaria com a presença do ministro da Saúde (então general Eduardo Pazuello) e outras autoridades no seu desembarque, como de fato aconteceu", acrescentou.

O contrato firmado em fevereiro para compra da Covaxin levanta suspeitas porque o Ministério da Saúde aceitou pagar US$ 15 por dose da vacina que ainda estava em fase de testes, mesmo havendo proposta para compra da vacina da Pfizer, já em uso em países desenvolvidos, por US$ 10.

A Pfizer havia feito propostas desde agosto de 2020, mas o governo federal fechou contrato com a farmacêutica apenas em março deste ano.

Os irmãos Miranda dizem ainda que avisaram o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) dos indícios de ilegalidade no contrato da Covaxin em março. Bolsonaro está sendo investigado pela Procuradoria-Geral da República (PGR), acusado de ter cometido o crime de prevaricação ao supostamente não ter tomado providências para investigar o contrato, como acionar a Polícia Federal (PF).

A versão do governo é que o presidente solicitou internamente no Ministério da Saúde a apuração do caso e que nenhuma irregularidade foi detectada. O contrato da Covaxin, porém, foi suspenso no final de junho, após as denúncias serem reveladas.

Dias levanta suspeitas sobre irmãos Miranda

Sem apresentar provas, Dias levantou questionamentos sobre possíveis interesses dos irmãos Miranda em atingi-lo com as acusações.

Ele disse que chegou a negar um cargo ao servidor Ricardo Miranda, que era seu subordinado no ministério. Além disso, afirmou que o deputado Luís Miranda pode ter interesses econômicos em contratos com o Ministério da Saúde.

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Dominguetti, policial militar de Minas Gerais, surpreendeu a CPI com um áudio de Miranda

Nesse sentido, Dias destacou o áudio em que Miranda fala sobre venda de luvas clínicas ao governo que foi levado à CPI por Dominguetti. O policial surpreendeu a CPI na semana passada com esse áudio do deputado e sugeriu que a fala de Miranda se referia à negociação de vacinas, mas isso não se comprovou.

"Até o momento, se noticiava que o deputado (Miranda) tinha sido preterido em expectativas políticas que almejava. Terá então tido pretensões negociais e econômicas frustradas também?", questionou Dias, ao especular sobre o que motivou as denúncias.

"Confesso que neguei um pedido de cargo para seu irmão servidor, e por um momento imaginei que pudesse ser uma retaliação. E confesso que sempre achei desproporcional de mais (isso ter provocado as denúncias). Mas agora o que se deslinda é a possibilidade de ter ocorrido uma frustração no campo econômico também", prosseguiu.

Dias disse ainda que apresentou notícias crimes contra Dominguetti e os irmãos Miranda solicitando que sejam investigados por falsas denúncias contra ele.

Dias nega relação com Bolsonaro e indicação por Ricardo Barros

Questionado se tinha alguma relação com Bolsonaro ou os filhos do presidente, Dias negou qualquer proximidade com a família presidencial. "Acho que o mais próximo que cheguei ao presidente da República foi cinco metros. Nunca falei com ele", disse.

O ex-diretor do Ministério da Saúde também negou que tenha sido indicado ao cargo pelo deputado federal Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo Bolsonaro na Câmara.

Segundo os irmãos Miranda, quando ambos em março apontaram ao presidente os sinais de irregularidade no contrato da Covaxin, Bolsonaro teria dito que o caso era mais um "rolo" de Barros. O deputado nega envolvimento no contrato e o presidente até hoje não negou ou confirmou o que disse os irmãos.

Dias disse que foi convidado a integrar a pasta no início do governo Bolsonaro pelo primeiro ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM), após ser recomendado pelo ex-deputado federal Abelardo Lupion (DEM-PR).

"Eu recebi um convite do então ainda deputado federal Henrique Mandetta, que recebeu o meu currículo através das mãos do ex-deputado federal Abelardo Lupion, com o qual eu trabalhava no Paraná", continuou.


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