Pandemia

Secretário de Economia previu imunidade de rebanho sem consultar a Saúde

Secretaria de Política Econômica, chefiada por Adolfo Sachsida, considerou apenas estudos acadêmicos para afirmar que imunidade de rebanho poderia ser atingida no Brasil. Pasta ligada ao Ministério da Economia percebeu o equívoco a partir de janeiro de 2021, com a explosão de casos

Sarah Teófilo
postado em 12/07/2021 20:20
Sachsida: Secretaria de Política Econômica foi surpreendida por
Sachsida: Secretaria de Política Econômica foi surpreendida por "reversão" da Covid no Brasil - (crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press )

A Secretaria de Política Econômica (SPE), ligada ao Ministério da Economia, apostou na desaceleração da pandemia da covid-19 no Brasil, com chances baixas de uma segunda onda, sem dialogar com o Ministério da Saúde, conforme resposta enviada pelo departamento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19.

O documento foi uma resposta a um requerimento do vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Nele, ele questiona uma fala do secretário de Política Econômica do Ministério da Economia, Adolfo Sachsida, em novembro do ano passado, quando ele afirmou que considerava “baixíssima” a possibilidade de uma segunda onda do coronavírus no Brasil, afirmando que estudos feitos pela secretaria mostravam que a “imunidade de rebanho” estaria sendo alcançada.

Além das explicações sobre os estudos usados para embasar as falas do secretário, o senador pediu “todas as comunicações, e documentos recebidos, com o Ministério da Saúde sobre as projeções, previsões e planejamento para a pandemia no ano de 2021”, ao que a pasta respondeu que “não houve qualquer comunicação e/ou troca de documentos do Ministério da Saúde com a SPE”.

Imunidade de rebanho

No documento, a secretaria explica que Sachsida tomou conhecimento de uma série de informações levadas pela equipe técnica, dentre elas estimativas de subnotificação de casos de covid-19 e dois estudos, um da Universidade de São Paulo (USP) e outro da Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), que “apontavam para a desaceleração da epidemia no Brasil, com base na análise da presença elevada de anticorpos na população em função de taxas de infecção altas e possivelmente pela presença de imunidade pré-existente (imunidade “natural” ou cruzada)”.

A chamada “imunidade de rebanho natural” já era criticada por diversas instituições, inclusive pela Organização Mundial da Saúde (OMS), que descartava a estratégia para conter a pandemia. A OMS ressaltou o risco de o vírus circular livremente entre as pessoas, o que provocaria muitas mortes, sem a garantia de imunidade após o contágio. A autoridades de saúde só consideram uma imunidade de rebanho  por meio da vacina.

Antes de novembro, quando Sashsida se manifestou sobre as perspetivas da pandemia, o epidemiologista Pedro Hallal, da UFPEL, já criticava a proposta de “imunidade de rebanho natural”. Em entrevista à BBC, em julho do ano passado, ele disse que "mirar a imunidade de rebanho como uma política de saúde é uma ideia absurda, mal pensada e antiética”.

Expectativa e reversão

Ainda no documento enviado à CPI, a SPE detalha que a equipe técnica levantou que “muitos países haviam experimentado várias semanas (ou até 3 meses como no caso da França) de baixíssimas taxas de contaminação após a primeira onda, havendo indicação de que a segunda onda estaria fortemente associada ao inverno rigoroso do hemisfério norte, também porque não se tinham evidências consolidadas de reinfecções e novas cepas”.

“Diante disso, a expectativa era de que o Brasil (que, de meados de outubro a meados de novembro, registrava tendência de queda nos casos) seguiria padrão semelhante e gozaria de algumas semanas ou meses de queda e ameaça de repique somente no inverno de 2021, possivelmente, com uma segunda onda branda em função do inverno pouco rigoroso e geograficamente limitado no Brasil”, afirmou o documento. A secretaria pontuou, ainda, os resultados anunciados pela Pfizer no início de novembro, com estudos da fase 3 da vacina. O imunizante só foi adquirido pelo governo brasileiro em 8 de março deste ano, após muita pressão.

Assim, no documento, a SPE afirmou que diante dos estudos descritos, “resumidamente: altas prevalências, limiares de imunidade coletiva revisados, indicação de queda e distância da chegada do inverno (no hemisfério sul), ausência de fatos novos relevantes como nova cepas de maior transmissibilidade e expectativa positiva do início da vacinação”, o secretário fez o comentário a respeito da "baixíssima" possibilidade de recrudescimento da pandemia no Brasil.

Entretanto, conforme ressaltado, em janeiro deste ano, “em função da reversão da tendência de queda de casos que se verificava em outubro-novembro/2020”, o secretário corrigiu sua fala em uma apresentação, com pedido de desculpas. “Deve-se salientar que erros e acertos fazem parte de todas e quaisquer projeções econômicas, o que é sabido e comumente no meio técnico-científico”, ressaltou a Secretaria de Política Econômica.

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