O anúncio feito pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, na última quinta-feira, no programa Conversa com Bial, da Rede Globo, teve o condão de precipitar o debate eleitoral de 2022 para questões envolvendo costumes e sexualidade. Ao afirmar para o apresentador Pedro Bial “sou um governador gay, não sou um gay governador”, anulou aquilo que poderia ser uma arma de adversários eleitorais para tentar desqualificá-lo — e usar essa questão no jogo sujo das redes sociais, atrelando-a a mentiras.
“Alguém tem que abrir esse caminho para mostrar que não é um assunto. Então, eventualmente, o meu papel é o de mostrar que isso é um ‘não assunto’, mesmo que, para mim, signifique não alcançar determinadas posições, mas talvez esteja abrindo caminho para que, no futuro, alguém possa”, afirmou.
Ao anunciar ser gay num programa de tevê, o movimento do governador foi interpretado por alguns como um elemento de aglutinação de um público que não é alcançado pelo governador João Doria — contra o qual disputa a indicação do PSDB para a candidatura presencial, junto com o senador Tasso Jereissati (CE) e o ex-prefeito de Manaus Arthur Virgílio Neto, nas prévias de novembro —, nem por uma grande parte dos partidos de centro, já que a bandeira LGBTQIA+ é tradicionalmente das legendas de esquerda. Leite ressalta que a questão gay seja um assunto a debater.
“Nesse momento que o Brasil tem essa crise de integridade, entendi que era importante me apresentar desde o início dessa trajetória para o meu partido. Entendi que era o momento de falar. Não teve qualquer cálculo do ponto de vista político-eleitoral”, afirmou.
Confira a seguir os principais pontos da entrevista concedida ao Correio:
O PSDB não é um partido que carrega um certo conservadorismo? Esse anúncio do senhor vai prejudicá-lo nas prévias,em novembro?
Eu discordo que seja um partido conservador. Acho que tem uma visão mais progressista, mesmo que não seja a bandeira do partido. Mas sempre trabalhou em prol da diversidade. Nunca defendi voto em mim porque eu sou o jovem. Também não vou defender voto em mim porque sou gay. Não é algo que me torne melhor ou pior, me torna diferente.
Mas o senhor acha que não o prejudica nas prévias?
Tenho confiança que não prejudica.
E com o eleitorado?
O mais importante de tudo é deixar claro que não tenho nada a esconder. Para que fique claro que, mesmo sendo um tema ainda sensível para muitos, não há nada a esconder. Se as pessoas estão buscando integridade, podem ter certeza que do lado daqui tem um político que se apresenta por inteiro. Eu busquei, com esse movimento, ser absolutamente transparente em relação a um tema que eventualmente pode afastar determinados públicos. Mas (a minha orientação sexual) não é carro-chefe da campanha, nem da minha atuação política. O que importa é a capacidade de tocar na vida dos outros. Agora, ter a coragem de publicamente falar sobre este tema, num país que tem uma liderança homofóbica, como a do presidente (Jair Bolsonaro), a coragem, sim, pode ser um atributo que faça com que as pessoas votem em mim, mas não a orientação sexual.
Mas o senhor tem receio de que isso o prejudique, tendo em vista que o Brasil é um país homofóbico?
Já tive muito espaço para mostrar minha capacidade de gestão, minha capacidade política, estou tranquilo em relação ao que posso fazer para o país. E se for um problema ainda para muita gente, paciência. Alguém tem que abrir esse caminho para mostrar que isso não é um assunto. Quantas mulheres, há 100 anos, lutaram por representatividade feminina, e elas não conseguiram, mas abriram caminho para outras? Então, eventualmente, o meu papel é o de mostrar que isso é um ‘não assunto’, mesmo que para mim signifique não alcançar determinadas posições. Mas, talvez, esteja abrindo caminho para que, no futuro, alguém possa. Estou menos preocupado com o resultado eleitoral, se vai me prejudicar, mas com um valor que, para mim, é muito importante, que é de honestidade e transparência. Não tratei desse tema antes porque não era um tema nas outras campanhas. Mas, nesse caminho novo que se apresenta, se transformou num assunto, e por isso eu deixo claro para que não seja acusado, de forma nenhuma, de estar escondendo qualquer coisa.
O Aécio (Neves, deputado) disse, em entrevista, que o PSDB tem que tomar cuidado para não deixar de existir. O senhor acha que o partido está correndo risco de extinção?
Não entendo que haja um risco. O partido tem uma história. Mas, de fato, há um momento político ainda diferente no país que teve impacto nos partidos mais tradicionais. A gente veio de um ambiente de Lava-Jato, de frustrações do eleitorado com os partidos tradicionais, que geraram a diminuição dos partidos maiores. Não tem uma preocupação do partido desaparecer, mas acho que é legítimo que se tenha uma preocupação em como recuperar a conexão com o eleitorado.
O senhor acha que o nome do governador de São Paulo, João Doria, depois da atuação na pandemia em favor da vacinação, já deveria ter crescido mais nas pesquisas?
O tema que a população está mais vinculada é a pandemia, no qual o governador mais teve evidência. Tem que se entender que pesquisa não é eleição. Mas, de fato, há de se compreender porque, eventualmente, esse resultado nas pesquisas não se apresenta ao governador. Como eu disse e insisto, (Doria) tem meu respeito, acho que faz um governo importante, tem o seu mérito nas vacinas. Mas, talvez, o eleitor esteja procurando algum outro tipo de caminho.
Saiba Mais
- Política Eleitores de municípios de RS e MG escolhem prefeitos hoje
- Política Eduardo Paes rebate crítica de Bolsonaro sobre eficácia da Coronavac
- Política Doria repudia ato de vandalismo em manifestação em SP: "O caminho é da racionalidade e do bom senso"
- Política Eduardo Leite nega cálculo político-eleitoral em decisão de anunciar que é gay
- Política Caso Covaxin: 5 pontos em que a PGR investigará Bolsonaro por suposta prevaricação
- Política Carlos Wizard: quais são os negócios do bilionário investigado na CPI da Covid
Notícias pelo celular
Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.
Dê a sua opinião
O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.
Conversas com diretórios
O governador Eduardo Leite (RS) tem se movimentado pelos diretórios do PSDB para emplacar o seu nome nas prévias da sigla para disputar a presidência da República. Após o evento no diretório do DF, foi a um almoço na casa do senador Izalci Lucas, presidente do PSDB-DF. Na mesa, entre os assuntos abordados, falou-se do anúncio do tucano sobre a sua sexualidade. Ele, porém, tem deixado claro dentro e fora do partido que esse não será o “carro-chefe” de uma eventual campanha presidencial. O encontro teve a presença do senador Reguffe (Podemos-DF), dos deputados Paula Belmonte (Cidadania-DF), Rodrigo de Castro (PSDB-MG) e Professor Israel Batista (PV-DF), e da ex-senadora Ana Amélia Lemos. Izalci tem conversado com os senadores Reguffe e Leila Barros (PSB-DF) para formar uma frente única contra o atual governador do DF, Ibaneis Rocha, em 2022. No evento no diretório, o governador gaúcho elogiou a atuação de Izalci no Senado.