O ex-ministro do meio ambiente Ricardo Salles teve o passaporte apreendido pela Polícia Federal, ontem, por decisão da ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF). A medida foi tomada depois do envio de um ofício da deputada federal Vivi Reis (PSol-PA), enviado à Corte na última quarta-feira, alertando que o investigado já dera provas “de que não tem a menor intenção de colaborar com as investigações, como no episódio em que se recusou a entregar seu aparelho celular para análise da Polícia Federal” — algo que fez somente 19 dias depois de prestar depoimento, por conta da Operação Akuanduba, assim mesmo bloqueado pela senha pessoal.
O ex-ministro do Meio Ambiente de Jair Bolsonaro é investigado por advocacia administrativa — quando um servidor público usa do cargo para defender interesses pessoais — e por tentar obstruir as investigações da PF contra organização criminosa com fraude de documentos. Na decisão de recolher o passaporte de Salles, a ministra destaca que se trata de uma medida mais “branda”. “Para se evitar a medida mais gravosa, ou seja, prisão processual (preventiva ou temporária), parece razoável decretar-se medida cautelar mais branda, consistente na proibição do investigado Ricardo de Aquino Salles de deixar o país, a fim de atingir a finalidade pretendida de apuração dos fatos em benefício da segurança pública e da defesa da sociedade”, decidiu a ministra.
A situação de Salles começou a se complicar a partir da Operação Handroanthus, que apreendeu mais de 226 mil m³ de madeira extraída ilegalmente da Amazônia — a maior apreensão da história do Brasil. Policiais federais fotografaram balsas com toras em rios entre o Pará e o Amazonas e, além do que já estava sendo transportado, havia muita carga em pátios no meio da floresta, descobertos durante as investigações. O material apreendido tinha capacidade de lotar 6,6 mil caminhões e, após o início dos trabalhos, a PF recebeu reclamações de parlamentares. Além disso, o juiz Antonio Carlos Almeida Campelo, titular da 4ª Vara da Seção Judiciária do Pará, tentou devolver a carga apreendida.
Visita e filmagens
Salles chegou a visitar as madeireiras envolvidas, fez filmagem com os exploradores e questionou a conduta dos agentes. Depois, encaminhou à PF uma série de documentos que “garantiriam a legalidade” das operações das empresas. Segundo investigadores, porém, os papéis entregues pelo ex-ministro eram falsos.
Salles deixou o governo na última quarta-feira, alegando problemas familiares. Porém, fontes palacianas asseguram que caso não fosse desligado pelo presidente da República, o STF e o Ministério Público Federal pediriam o desligamento do então ministro por conta das investigações. Já havia uma movimentação de vários parlamentares pedindo a apreensão do documento por receio de que ele deixasse o país. O partido Rede Sustentabilidade e o PSB entraram com uma petição junto ao Supremo para pedir a apreensão do passaporte do ex-ministro.
A demissão deu ao ex-ministro fôlego para as batalhas judiciais que enfrentará. Isso porque ele passa a responder na 1ª instância da Justiça, e não mais ao STF, e terá um número maior de recursos para se interpor. Quem explica é o advogado criminalista João Paulo Boaventura, do Boaventura Turbay Advogados. “A perda do cargo implica a exoneração das respectivas prerrogativas funcionais, inclusive o foro privilegiado. Deve ser garantido agora o direito ao juiz natural, duplo grau de jurisdição e demais garantias processuais”, salientou.