A médica Nise Yamaguchi negou, em depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da covid-19, nesta terça-feira (1º/6), ter havido uma reunião com autoridades do governo para discutir mudança na bula da cloroquina e da hidroxicloroquina, a fim de indicar as substâncias sem eficácia comprovada a pacientes com covid-19, e afirmou que no encontro houve apresentação de uma minuta relativa à distribuição dos medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS) no combate à doença.
O encontro se deu no dia 6 de abril do ano passado. A afirmação da médica contradiz falas do ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta e do diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Barra Torres, que disseram que na reunião havia uma minuta para mudança da bula do medicamento a ser indicado a pacientes com covid-19. Barra Torres afirmou, ainda, que a sugestão teria partido de Nise e que ele teve uma reação “deselegante” após fala da médica.
A médica afirmou que a minuta era para inclusão do uso do medicamento no tratamento precoce e a sua distribuição. Ela não soube dizer de quem era a minuta, contudo. Apesar da negativa de Nise, na prática, a minuta visava distribuir os medicamentos sem eficácia comprovada cloroquina, hidroxicloroquina e azitromicina no SUS para uso em pacientes com covid-19, ainda que não haja indicação na bula - ou seja, "passar por cima da bula e da Anvisa", como comentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
A referida reunião ocorreu no Palácio do Planalto, com Mandetta, Barra Torres, general Braga Netto e o médico Luciano Dias Azevedo, da Marinha, apontado pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) como um dos integrantes do chamado "gabinete paralelo" de assessoramento ao presidente.
Nise afirmou que descobriu ao final da reunião a referida minuta, mas que antes estava discutindo uma resolução da Anvisa (348) e uma nota informativa (número 6) do Ministério da Saúde que falava sobre recomendação do uso da cloroquina em casos moderados e graves. Ela negou que tenha escrito a minuta. “O que estava discutindo era o medicamento, e não a bula, e que o medicamento tinha que ser combinado entre o médico e o paciente”, afirmou. “Esse papel só falava sobre dispensação de medicamentos”, disse.
O documento
A minuta traz a proposta de disponibilizar esses medicamentos “a toda a rede de saúde garantindo ao médico prescrito e equipe de saúde que obrigatoriamente dará acompanhamento clínico do paciente, e o paciente, seguindo protocolos de tratamento estabelecidos na atualidade, decidirem pela adesão ao uso experimental das medicações descritas na doença covid-19 no intuito de tratar e iniciar protocolos de pesquisas clínicas”.
O documento diz que a adesão ao tratamento “ora em estudo da covid-19 deverá ser acordado entre médico e paciente voluntariamente e de livre e espontânea vontade com obrigatoriedade de assinatura de Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), assim como enviar compulsoriamente as informações para o sistema de notificações em vigilância sanitária ”, no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
A minuta aponta que é “dever do estado garantir os meios indispensáveis à prevenção, à promoção e à recuperação da saúde”. “Considerando a necessidade de oferecer alternativas de acesso a assistência farmacêutica com vistas ao fortalecimento da integralidade do atendimento à saúde; Considerando a meta de assegurar medicamentos essenciais para o tratamento dos agravos com maior incidência na população, mediante redução de seu custo para os pacientes”, traz o documento.
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