CONGRESSO

Senadores voltam a criticar relatório da MP da Eletrobras

Relator apresenta novo relatório e parlamentares pedem mais tempo para avaliar o texto e os impactos. Senadora Simone Tebet (MDB-MS) diz que MP "é imoral no conteúdo"

Rosana Hessel
postado em 17/06/2021 14:24 / atualizado em 17/06/2021 21:56
 (crédito: Eletrobras/Divulgação)
(crédito: Eletrobras/Divulgação)

Medida Provisória que trata da privatização da Eletrobras, a MP 1031/2021 está sendo alvo de críticas de senadores que pedem um prazo maior para analisar o quarto relatório e seus impactos. A senadora Simone Tebet (MDB-MS) foi uma das mais enfáticas ao apontar problemas no texto, devido ao grande números de jabutis — emendas que não estão relacionadas ao tema principal —, que deverão encarecer a conta de luz para os consumidores. 

“Essa MP é imoral no conteúdo”, afirmou a senadora, nesta quinta-feira (17/6), durante audiência pública do Senado que trata do relatório do senador Marcos Rogério (DEM-RO), bastante criticado por parlamentares e especialistas. O relator sinalizou que poderá fazer “novos ajustes” ao texto. O prazo para que a medida caduque vence no próximo dia 22.

Simone Tebet confessou ser favorável à MP da privatização da Eletrobras, mas disse que é contra o relatório que virou uma “uma colcha de retalhos de jabutis”. “A proposta inicial era capitalizar e diminuir o preço da energia, mas esses jabutis grandes e pequenos criaram uma enorme insegurança jurídica”, afirmou a senadora, lembrando que, pelas estimativas iniciais, o consumidor vai ter que pagar uma fatura de R$ 20 bilhões a mais na conta de luz por conta dos jabutis adicionados pelo relator do senado ao texto que veio da Câmara e que é considerado ruim por analistas e parlamentares.

O senador Álvaro Dias (PODE-PR) criticou o texto e apontou problemas na redação que abrem espaço para uma ação direta de inconstitucionalidade, porque, segundo ele, “há uma tentativa bizarra de tirar o poder de veto do presidente da República em um artigo para impedir o veto pontual a determinados dispositivos da MP”. Ele ainda destacou a necessidade de mais tempo para a análise dos efeitos da medida para o bolso do consumidor. "Especialistas afirmam que é preciso mais de uma semana para analisar os impactos das emendas adicionadas”, acrescentou.

“Essa medida junta o pior de dois mundos e pega uma empresa estratégica fundamental para o país e impede a concorrência comprometendo a geração de emprego. Estamos sacrificando os consumidores”, afirmou Dias, sugerindo retomada ao início e que se discuta com a sociedade um plano de capitalização da Eletrobras.

O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) reforçou que a MP “deve aumentar a tarifa de energia” e frisou que, do jeito que está, o PSDB votará contra, apesar de ser favorável à privatização da Eletrobras e ao aumento da competição no mercado.

“O texto da Câmara já não era bom, agora ficou ruim. Estamos criando um dragão”, alertou o senador Paulo Paim (PT-RS), criticando o excesso de emendas ao projeto, que já teve quatro relatórios. Segundo ele, há uma busca da privatização a qualquer custo e coloca o Brasil na contramão do mundo prejudicando as fontes de energia renováveis ao manter subsídios às fontes de energia mais poluentes, como as usinas térmicas movidas a carvão. “O país está colocando em risco a soberania nacional”, acrescentou.

Ele lembrou que os órgãos de fiscalização do meio ambiente como o Ibama serão prejudicados com a MP. “O Brasil vai perder uma das jóias da coroa”, afirmou, acrescentando preocupação com a demissão dos trabalhadores.

Logo no início dos debates, o relator apresentou um novo parecer que continua recebendo críticas. Em seu discurso, o líder da minoria, Jean Paul Prates (PT-RN), solicitou o adiamento da votação. E foi acompanhado por Lasier Martins (PODE-RS), que apontou que os relatórios foram apresentados com duas horas de atraso do horário previsto para a sessão. “Tem que ser retirada essa MP da pauta, porque ela está sendo apresentada de afogadilho. É preciso um estudo aprofundado dos impactos e não temos isso. O bom senso recomenda a retirada. Do jeito que está não dá para votar”, afirmou.

Na contramão, os senadores Eduardo Braga (MDB-AM) e Vanderlan Cardoso (PSD-GO) fizeram discursos favoráveis à aprovação do texto do relator que, se aprovado, precisará retornar para a Câmara e ser aprovado antes do dia 22 para que a medida não caduque.

"O momento não é ideal para debater a privatização da Eletrobras. Estamos no meio da pandemia e o interesse público é que tem que ser defendido e não o interesse privado", frisou o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que afirmou que a MP é inconstitucional e declarou ser "radicalmente contra" a aprovação da matéria.

Críticas de especialistas e consumidores

Especialistas não pouparam críticas ao relatório de Marcos Rogério apresentado ontem no plenário do Senado. A MP da Eletrobras é extremamente negativa para pequenos consumidores, de acordo com Clauber Leite, coordenador do programa de Energia do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

Segundo ele, em vez de retirar os jabutis que encarecem a conta de luz para o consumidor no texto aprovado pela Câmara, o relator do senado conseguiu piorar o relatório, adicionando outras emendas que não tem a ver com o assunto principal da MP, que é a privatização da estatal responsável por 30% da geração de energia do país. “O ideal é retirar todos os jabutis, porque a maioria dessas emendas vai gerar mais custo para o consumidor”, alertou.

Na avaliação de Leite, o texto do senador Marcos Rogério é extremamente negativo para os pequenos consumidores de energia. “Inúmeras emendas acrescentadas na Câmara dos Deputados e no Senado agregam custos muito significativos ao setor elétrico que pressionarão muito as tarifas dos consumidores residenciais de energia”, disse.

O especialista citou entre as medidas nocivas ao consumidor, por exemplo, a prorrogação dos subsídios para usinas térmicas a carvão — emenda que foi retirada hoje pelo relator —, e a criação de reserva de mercado para a contratação de energia de determinadas fontes, independentemente de eventuais vantagens que possam agregar. Segundo ele, a seleção das fontes tem de ser feita com base em critérios técnicos, conforme o planejamento do setor elétrico, e os projetos têm de se mostrar competitivos nos leilões de contratação da energia.

No caso das usinas a gás em estados que não dispõem do combustível, Leite informou que o Idec vê com preocupação também a necessidade de construção de novos gasodutos e linhas de transmissão para o escoamento da energia, cujos custos também sobrarão aos consumidores, além do problema das emissões de gases de efeito estufa. “Nesse contexto, aliás, não faz sentido prever a contratação de mais energia gerada em usinas a carvão no contexto de transição global das economias para baixo carbono”, completou.

Original

O União pela Energia, grupo formado por 45 associações do setor produtivo, também não poupou críticas ao relatório a MP da Eletrobras apresentado no Senado. Segundo a entidade, o relator conseguiu piorar um texto que já era ruim. A entidade defendeu que os senadores retomem o original da MP. “Entendemos que ele agrava as adições feitas na Câmara, que ficaram conhecidas como jabutis. As definições invadem o espaço do planejamento setorial e ampliam o risco de investimentos no setor por sinalizar grande instabilidade para investimentos de capital intensivos e de longo prazo, assim como a governança da operação do setor elétrico”, afirmou a entidade, em nota.

Segundo a entidade, a MP sinaliza também que a tendência é de que, a cada MP, podem surgir novas decisões que afetam a concorrência no mercado de energia “e perturbam a competição, alterando os resultados entre vencedores e perdedores do setor”, acrescentou. A organização criticou a criação e a prorrogação de subsídios, o incentivo ao carvão, “em um cenário onde o mundo fala em descarbonização”.

Além disso, a MP define a abertura total do mercado de energia de forma desassociada dos mecanismos que garantam a adequada alocação de riscos entre produtores e consumidores de energia, desprezando o projeto completo de modernização do setor elétrico, já aprovado no Senado e em avaliação pela Câmara dos Deputados. “Afetam também o Tesouro Nacional ao ampliar benefícios a geradores e prever indenização a antigos proprietários de empresas privatizadas. Ou seja, o relatório piora o que já era ruim e prevê novos custos aos consumidores brasileiros. Nosso entendimento segue pela rejeição dos velhos e dos novos jabutis”, adicionou.


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