O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para anular o acordo de colaboração premiada do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, com a Polícia Federal. O placar foi de 7 a 4. O acordo entre Cabral e a Polícia Federal foi homologado em 14 de maio pelo ministro Edson Fachin, apesar de manifestação contrária da Procuradoria-Geral da República (PGR). A PGR recorreu da decisão, sob alegação de que parte dos valores recebidos pelo colaborador teria sido ocultada, além de questionar a justa causa para a concessão do benefício.
A divergência refere-se à possibilidade de Sérgio Cabral — condenado a mais de 300 anos de reclusão envolvendo crimes investigados pela Operação Lava Jato — receber benefícios em troca de sua colaboração com o Estado. A discussão voltou à tona no STF após Cabral mencionar, a investigadores da Polícia Federal, um pagamento de R$ 4 milhões ao ministro Dias Toffoli, quando ele integrava o Tribunal Superior Eleitoral entre 2012 e 2016, pela venda de decisões judiciais favoráveis a dois prefeitos do RJ.
O cerne da discussão é a autonomia da Polícia Federal para fechar acordos de colaboração premiada sem o crivo do Ministério Público Federal (MPF). O STF concedeu tal prerrogativa à PF, em 2018, com placar de 10 a 1. Apesar de a maioria dos ministros votarem contra a delação de Cabral, não há consenso no colegiado acerca do benefício ofertado à PF.
Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Kássio Nunes Marques, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e Dias Toffoli votaram para anular a delação do ex-governador do Rio. Fachin, apesar de homologar o acordo de Cabral com a PF, entendeu que a delação era inválida. Na avaliação do relator, se o Ministério Público não considerou “suficientemente relevantes e inéditas” as informações prometidas no acordo, o ex-governador não poderia ter procurado outro órgão de investigação para negociar a colaboração premiada. A proposta de delação de Cabral já havia sido rejeitada pela força-tarefa da Lava Jato no Rio.
Gilmar Mendes, em sua justificativa, considerou sem efeito a delação de Cabral, mas ao contrário de Fachin, defendeu a reforma da decisão que possibilitou a colaboração premiada do ex-governador. "O resultado desse processo mostra que as narrativas do colaborador e o seu acordo em si revelaram-se absolutamente imprestáveis para a persecução criminal. As estratégias do colaborador voltadas ao constrangimento dos órgãos de persecução criminal e deste próprio Tribunal tinham como finalidade não a elucidação da verdade material, mas, sim, a profusão de narrativas falsas como combustível da sua aventura em busca de liberdade a qualquer custo”, comentou.
Já os ministros Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio, Rosa Weber e Carmen Lúcia votaram contra a tentativa da PGR de impedir a homologação do acordo de delação. “Apenas cumpre apreciar os aspectos formais, sem adentrar o conteúdo do acordado. No caso, as formalidades legais, consideradas a espontaneidade, a voluntariedade e a legalidade do ajuste, foram atendidas. A eficácia do que versado pelo delator, levando em conta a veracidade das declarações, é definida mediante sentença, observado pronunciamento do Órgão julgador”, avaliou o decano Marco Aurélio Mello.
Preso desde 2016, Sérgio Cabral foi condenado a 346 anos, nove meses e 16 dias de prisão. Cerca de 18 sentenças são direcionadas ao ex-governador que, com o acordo de delação premiada, seria cumprido em regime domiciliar. Entre as condenações estão crimes de corrupção passiva, recebimento de vantagem indevida, lavagem de dinheiro, organização criminosa, formação de quadrilha, etc.
* Estagiários sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza