Um dos aliados mais ideológicos do presidente Jair Bolsonaro enquanto permaneceu no Executivo, o ex-ministro Ernesto Araújo, que ocupou a pasta das Relações Exteriores até o mês passado, publicou uma série de críticas ao governo nas redes sociais, ontem. Nas postagens, criticou, indiretamente, a proximidade do Palácio do Planalto com parlamentares do Centrão.
Para Araújo, desde o ano passado, o governo Bolsonaro se tornou uma “administração tecnocrática sem alma nem ideal”. “Um governo popular, audaz e visionário foi-se transformando numa administração tecnocrática sem alma nem ideal. Penhoraram o coração do povo ao sistema. O projeto de construir uma grande nação minguou no projeto de construir uma base parlamentar”, escreveu.
Para o ex-ministro, as reformas ficaram em segundo plano, diante do avanço da influência do Centrão no governo. “Leilões, privatizações, reformas tributária e administrativa? Se não for combatida a essência do sistema, essas serão reformas ‘Gattopardo’: mudanças para que tudo permaneça igual. Nenhuma ‘articulação política’ vai mudar o Brasil. Somente a pressão popular”, declarou.
Araújo pediu demissão atendendo a pedido de Bolsonaro. A saída dele ocorreu após pressão de parlamentares e de negociações com o Congresso. O ex-chanceler é apontado como um dos principais responsáveis pela deterioração da imagem do país no exterior, além do próprio chefe do Executivo.
O avanço da pandemia da covid-19 e declarações com críticas à China, principal parceira comercial do Brasil e fornecedora de insumos para a fabricação de imunizantes, contribuíram para a queda de Araújo.
Com os disparos que fez contra o governo, ele se junta a uma série de autoridades que deixaram seus cargos e viraram críticos do Executivo. O personagem de maior destaque desse grupo é o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que saiu da pasta acusando Bolsonaro de tentar interferir na Polícia Federal. Além dele, outros integrantes da Esplanada viraram detratores do Executivo, como os ex-ministros da Secretaria de Governo Santos Cruz e da Saúde Luiz Henrique Mandetta.
“Penhoraram o coração do povo ao sistema. O projeto de construir uma grande nação minguou no projeto de construir uma base parlamentar”
Ernesto Araújo, ex-ministro das Relações Exteriores
Atos a favor e contra Bolsonaro
Sergio Lima/AFP
Num 1º de maio marcado por manifestações a favor e contra seu governo, o presidente Jair Bolsonaro sobrevoou a região central de Brasília. Em um helicóptero escoltado pela Força Aérea Brasileira (FAB), o chefe do Executivo viu uma carreata de apoiadores no Eixo Monumental e a reunião de simpatizantes no gramado em frente ao Congresso. Ele, porém, não pousou no local. Os atos ocorreram dias após o mandatário dizer que espera uma sinalização do povo para agir — embora não tenha deixado claro que ações tomaria, ele criticou, na ocasião, as medidas restritivas adotadas por governadores e prefeitos para conter a pandemia da covid-19.
A carreata teve início pela manhã. A Esplanada chegou a ser fechada pela polícia, mas foi reaberta logo em seguida, para evitar aglomeração de pessoas a pé. Em cima de um trio elétrico, diversos parlamentares bolsonaristas sem máscaras discursaram para os participantes aglomerados em frente ao Congresso. O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) chegou a tirar fotos com os manifestantes sem usar a proteção facial contra a transmissão do novo coronavírus. O uso de máscaras é obrigatório no Distrito Federal.
Mais cedo, um grupo menor levantou faixas antidemocráticas pedindo intervenção militar, com as frases “Intervenção militar com Bolsonaro no poder” e “Presidente Bolsonaro acione as Forças Armadas”. No momento em que os parlamentares discursaram, essas faixas não foram mais vistas.
Além de Brasília, manifestações de apoiadores do presidente ocorreram em pelo menos 10 estados. Muitos criticavam os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e governadores, principalmente o de São Paulo, João Doria.
Em quase todas as cidades, havia cartazes com a frase “eu autorizo”. O mesmo se repetiu nas redes sociais, com mais de 200 mil mensagens em apoio a investidas autoritárias do presidente. Muitos dos perfis que fizeram postagens com esse teor têm comportamento robotizado, evidenciando o uso de programas de computador para potencializar a difusão das mensagens. O Congresso também foi alvo das críticas dos manifestantes.
O maior ato a favor do governo ocorreu na Avenida Paulista. Apoiadores do presidente se concentraram no local vestindo verde e amarelo, portando bandeiras do Brasil e entoando gritos a favor do chefe do Executivo. A deputada Carla Zambelli (PSL-SP), uma das aliadas de Bolsonaro, acompanhou a movimentação em cima de um trio elétrico. Um integrante do Movimento Brasil Livre que filmava o ato acabou hostilizado pelos integrantes e precisou sair do local sob escolta da Polícia Militar. O número total de participantes não foi informado.
Bolsonaro postou nas redes sociais um vídeo do ato na capital de São Paulo e escreveu: “Av. Paulista/SP. O Brasil é verde e amarelo. Obrigado pela confiança. Devemos lealdade a vocês”.
Também ocorreram protestos contra Bolsonaro. Em Brasília, um pequeno grupo reuniu-se na Esplanada e exibiu faixas pedindo impeachment. Em Belo Horizonte, manifestantes contrários ao governo se mobilizaram na Praça da Estação, no Centro. Eles pediram agilidade na vacinação e a saída do presidente. Em Natal, houve manifestação pela ampliação do auxílio emergencial, o impeachment do chefe do Executivo e a vacinação em massa.
Críticas
Em participação virtual na abertura da 86ª ExpoZebu, de Uberaba (MG), Bolsonaro criticou as centrais sindicais e seus antecessores no comando do país. “Este momento também é muito importante, afinal de contas, quando no passado, nesta data, 1º de maio, o que nós mais víamos no Brasil eram camisas e bandeiras vermelhas tremulando, como se aqui fosse um país socialista”, reprovou. “Essa questão, hoje, mudou, e bastante”, emendou ele, ao lado da ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Tereza Cristina.
“Hoje, estamos tendo o prazer e a satisfação de ver bandeiras verde e amarela por todo o nosso país. Homens e mulheres que trabalham de verdade, que sabem que o bem maior que nós podemos ter em nossa pátria é a nossa liberdade. É a união dessas pessoas de bem que nós garantiremos, então, esse nosso sagrado direito”, completou. (RS, com Agência Estado)