O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria para anular o acordo de colaboração premiada do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, com a Polícia Federal. O placar foi de 7 a 4.
O acordo entre Cabral e a Polícia Federal foi homologado em 14 de maio pelo ministro Edson Fachin, apesar de manifestação contrária da Procuradoria-Geral da República (PGR). A PGR recorreu da decisão, sob alegação de que parte dos valores recebidos pelo colaborador teria sido ocultada, além de questionar a justa causa para a concessão do benefício.
A divergência refere-se à possibilidade de Sérgio Cabral — condenado a mais de 300 anos de reclusão envolvendo crimes investigados pela Operação Lava Jato — receber benefícios em troca de sua colaboração com o Estado. A discussão voltou à tona no STF após Cabral denunciar, aos investigadores da Polícia Federal, um pagamento de R$ 4 milhões ao ministro Dias Toffoli, quando ele integrava o Tribunal Superior Eleitoral, pela venda de decisões judiciais favoráveis a dois prefeitos do RJ.
O cerne da discussão é a autonomia da Polícia Federal para fechar acordos de colaboração premiada sem o crivo do Ministério Público Federal (MPF). O STF concedeu tal prerrogativa à PF, em 2018, com placar de 10 a 1. Apesar de a maioria dos ministros votarem contra a delação de Cabral, não há consenso no colegiado acerca do benefício ofertado à PF.
Votos
Os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Gilmar Mendes, Kássio Nunes Marques, Ricardo Lewandowski, Luiz Fux e Dias Toffoli votaram para anular a delação do ex-governador do Rio. Fachin, apesar de homologar o acordo de Cabral com a PF, foi contrário ao acordo.
“Sendo assim, como o acordo de colaboração, tal qual o concebo, pressupõe transação e, portanto, disposição de interesse constitucionalmente afeto às atribuições exclusivas do Ministério Público, entendo inconstitucional compreensão que permite às autoridades policiais, em nome do Estado, dispor desses interesses”, escreveu Fachin.
Gilmar Mendes, em sua justificativa, considerou sem efeito a delação de Cabral, mas ao contrário de Fachin, defendeu a reforma da decisão que possibilitou a colaboração premiada do ex-governador. "O resultado desse processo mostra que as narrativas do colaborador e o seu acordo em si revelaram-se absolutamente imprestáveis para a persecução criminal. As estratégias do colaborador voltadas ao constrangimento dos órgãos de persecução criminal e deste próprio Tribunal tinham como finalidade não a elucidação da verdade material, mas sim a profusão de narrativas falsas como combustível da sua aventura em busca de liberdade a qualquer custo”, comentou.
Já os ministros Luís Roberto Barroso, Marco Aurélio, Rosa Weber e Carmen Lúcia votaram contra a tentativa da PGR impedir a homologação do acordo de delação.
“Apenas cumpre apreciar os aspectos formais, sem adentrar o conteúdo do acordado. No caso, as formalidades legais, consideradas a espontaneidade, a voluntariedade e a legalidade do ajuste, foram atendidas. A eficácia do que versado pelo delator, levando em conta a veracidade das declarações, é definida mediante sentença, observado pronunciamento do Órgão julgador”, avaliou o decano Marco Aurélio Mello.
Especialistas aprovam o entendimento do Supremo. “A delação deve ser anulada. Imprestável como meio de produção de prova por ser despida de qualquer credibilidade. É importante o Supremo recolocar nos eixos a investigação, sob pena de solapar a boa-fé objetiva, responsável por reger os acordos de colaboração premiada”, comentou o advogado criminalista Luis Henrique Machado.
Preso desde 2016, Sérgio Cabral foi condenado a 346 anos, 9 meses e 16 dias de prisão. Cerca de 18 sentenças são direcionadas ao ex-governador que, com o acordo de delação premiada, seria cumprido em regime domiciliar. Entre as condenações, estão crimes de corrupção passiva, recebimento de vantagem indevida, lavagem de dinheiro, organização criminosa, formação de quadrilha, etc.
* Estagiários sob supervisão de Carlos Alexandre de Souza
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