O vice-presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Covid-19, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), e o relator, Renan Calheiros (MDB-AL) fizeram um balanço da sessão desta terça-feira (18/5), em que os parlamentares inquiriram o ex-chanceler Ernesto Araújo. No depoimento, o diplomata tentou eximir o presidente da República de responsabilidade pelo agravamento da pandemia e, consequentemente, seus efeitos na economia.Como estratégia, um dos principais representantes da ala olavista do governo Bolsonaro tentou atribuir as falhas ao ex-ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello.
Para Randolfe Rodrigues, o ex-ministro se omitiu em várias respostas, foi confuso em outras, mas, ainda assim, “trouxe esclarecimentos importantes”. “Ficou patente a contradição em relação à participação do Brasil no consórcio internacional Covax Facility. O consórcio é lançado em 21 de abril, o Brasil só vem a aderir em setembro. Ele confirmou. E confirmou que até essa data, 170 países haviam aderido. Trouxe a sexta negativa em relação à Pfizer. Já tinham cinco anteriores, declinadas por Fabio Wajngarten e o CEO da Pfizer, Carlos Murillo. Em 15 de setembro a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos comunicou sobre a carta. O senhor Ernesto Araújo diz que não comunicou o presidente da República, pois tinha conhecimento que o presidente já sabia”, destacou o senador.
Outro ponto que chamou a atenção de senadores foi a participação do segurança de Jair Bolsonaro, o ex-policial militar Max Moura na comissão que foi à Israel conversar sobre um medicamento de sprai nasal contra o Covid. “Max Moura foi um convidado ilustre a um passeio que custou meio milhão aos cofres públicos e não teve resultado concreto nenhum para o Brasil e o combate à pandemia. E ficou evidente que o MRE se tornou um apêndice do gabinete da doença, que atuava negando a gravidade da pandemia, transformando o instituto Alexandre Gusmão, a escola de diplomacia do Itamaraty, em uma espécie de politiburo do negacionismo”, criticou.
Para o vice-presidente da CPI, as falas de Ernesto também reforçaram a tese do gabinete paralelo, apelidado de “gabinete da doença”, e da omissão criminosa durante a crise de falta de oxigênio nos hospitais de Manaus e outros municípios amazonenses. “Temos aqui, inclusive declaração do Embaixador da Venezuela, de que a quantidade de oxigênio que socorreu os amazonenses foi doada pelo governo venezuelano. Um gesto de solidariedade, que o governo brasileiro não articulou nem agradeceu. Quando o governo brasileiro deveria socorrer os manauaras, foi necessário o socorro e solidariedade de um país vizinho”, reforçou Rodrigues.
Situação difícil
O vice-presidente da CPI destacou, ainda, que o depoimento comprometeu gravemente o ex-ministro Pazuello. “Ele deixa claro que quem aderiu ao Covax Facility com 10% e não com 50% de quantidade de vacinas foi o Ministério da Saúde. Deixa o senhor Eduardo Pazuello em uma situação muito difícil”, afirmou o senador.
Sobre o Gabinete da Doença, Randolfe afirmou que o depoimento de Araújo aponta para um grupo de trabalho paralelo ao Ministério da Saúde, que claramente atuava com as medidas contrárias ao que foi preconizado nas gestões dos ex-ministros Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. “Está ficando cada vez mais clara uma omissão em relação à aquisição de vacinas. A pergunta que temos que fazer aos brasileiros é a seguinte: quantas vidas de compatriotas, tios e tias, pais, mães, irmãos, não poderiam ter sido salvas, se pelo menos uma das propostas de vacinas rejeitadas fosse confirmada?”, questionou.
Já a respeito da viagem a Israel, segundo Randolfe, a comitiva deixou o Brasil “sob os efeitos mais obscuros”. “Não tinha articulação sobre o Ministério da Saúde. O próprio Itamaraty, em resposta a um requerimento do Psol na Câmara, diz que as tratativas da viagem ocorreram desde maio de 2020. Nada teve a ver com contato com o premier Benjamin Netanyahu como havia sido dito. Tinha um conjunto de personagens nessa viagem que nada tinham a ver com vacina ou remédio. Esse senhor, que vem das sobras, Max Moura, perguntamos o que ele tinha a ver com essa viagem. É segurança pessoal do presidente. Uma viagem de R$ 500 mil, mobiliza uma aeronave da FAB e não tem resultado prático algum? Essa aeronave podia ir para a Venezuela buscar oxigênio para Manaus”, apontou.
Ônus a Pazuello
O relator concordou com Randolfe sobre o comprometimento cada vez maior de Pazuello. “O ministro (Araújo) carregou no Ministério da Saúde e, carregando no ministério, carregou no ex-ministro Pazuello. E disse que suas tratativas todas foram consequências de indicações da pasta, à exceção da importação da cloroquina, que ele falou com o presidente, e da viagem a Israel. Com esse esforço, com essa declaração, ele transfere o ônus dos equívocos para o Ministério da Saúde e quem o ocupou”, avaliou Calheiros.
O relator negou que tenha sido mais ameno com Ernesto em comparação, por exemplo, com o ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten. “Não sou mais afável ou menos afável. Procuro, em todos os casos, utilizar da mesma gentileza e fazer todas as perguntas que precisam ser feitas. Evidente que quando, peremptoriamente, o depoente se recusa a responder, isso causa indignação. Mas não com depoimento. E sim pelo que aconteceu no Brasil. Mais de 430 mil mortos, famílias querendo saber o que aconteceu. E temos a obrigação em nome da CPI de dizer o que aconteceu. Isso, em alguns momentos causa indignação. Mas tenho pedido desculpas, baixado o tom e tentado trabalhar com civilidade”, afirmou.
Renan destacou que até mesmo o atual ministro da Saúde, o médico Marcelo Queiroga, tentou lavar as mãos do que se passou no interior da pasta durante a gestão do militar do Exército. “O Queiroga se recusou sistematicamente a dizer para a CPI o que havia encontrado no ministério de políticas públicas, equipamentos e insumos. Ele fez questão de dizer que não teve acesso a esse balanço para não se comprometer com o que se passou na gestão do Pazuello”, destacou.
Gabinete paralelo
Sobre o futuro das investigações, o relator considera necessário detalhar os trabalhos e integrantes do gabinete paralelo. “Era uma espécie de ministério da doença, em contraposição ao Ministério da Saúde, que despachava com o presidente e fazia suas reuniões no Palácio do Planalto. Estabelecia políticas públicas, dizia onde deveria ser gasto o dinheiro da forma que entendesse como correta ou incorreta, e pensava em modificar a bula de remédio por decreto presidencial. E o Ministério da Saúde, sequer podia comprar vacina”, destacou.
“No dia que o ex-ministro (Pazuello) disse que estava concluindo negociação para compra de vacina (22 de outubro de 2020), o presidente fez questão de desautorizá-lo, que aquilo não iria acontecer e que ele iria continuar sentado nos R$ 20 bilhões que o Congresso lhe destinou”, recordou.
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