CPI da Covid

"Bolsonaro cumpriu um papel de disseminar o vírus", diz Humberto Costa

Fazendo um balanço da primeira semana de oitivas da CPI da Covid, o senador afirma, em entrevista ao Correio, que foram reforçadas suas suspeitas de que o governo optou por promover a chamada "imunidade coletiva", na tentativa de frear a doença

Jorge Vasconcellos
postado em 07/05/2021 15:40 / atualizado em 07/05/2021 15:41
 (crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)
(crédito: Ed Alves/CB/D.A Press)

O senador Humberto Costa (PT-PE), titular da CPI da Covid do Senado, avalia como positivo o balanço da primeira semana de tomada de depoimentos sobre as ações e omissões do governo federal na pandemia do novo coronavírus. Em entrevista ao Correio, ele destaca a importância das revelações feitas pelos ex-ministros da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM) e Nelson Teich, que deixaram o cargo por pressões do presidente Jair Bolsonaro pelo uso da hidroxicloroquina contra a covid-19 — o medicamento não tem eficácia comprovada cientificamente contra a doença.

O senador avalia que, na primeira semana de oitivas da Comissão Parlamentar de Inquérito, foram reforçadas suas suspeitas de que o governo optou por promover a chamada "imunidade coletiva", na tentativa de conter a disseminação do vírus.

Durante a entrevista, Humberto Costa fala também sobre o requerimento que vai apresentar para que a CPI convoque para depor o vice-governador do Amazonas, Carlos Almeida Filho (sem partido). Ao jornal Folha de S. Paulo, ele revelou que o governador do estado, Wilson Lima (PSC), e o presidente Jair Bolsonaro fecharam um acordo para utilizar a cidade de Manaus em uma experiência sobre a imunidade de rebanho. "Vai ficando cada vez mais claro que Bolsonaro cumpriu um papel de disseminar o vírus, e eu acho que isso caracteriza, sem dúvida, crime contra a saúde pública, crime de responsabilidade e crime contra a humanidade". A seguir, os principais trechos da entrevista:

O fato de a secretária de Gestão do Trabalho do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, assumir, em depoimento ao Ministério Público Federal, que recomendou a médicos de Manaus o uso de medicamentos sem comprovação científica contra a covid-19 confirma que o governo optou por esse caminho em detrimento das medidas científicas?

Eu acho que sim. Não somente a contraposição, mas também a adoção de medidas contrárias ao que deveria ser feito, especialmente no que diz respeito à medicação, mas está se reforçando uma tese, que nós estamos defendendo, de que o governo liberou geral. Fez a escolha de que a melhor maneira de enfrentar a pandemia é permitindo a transmissão rápida e intensa do vírus na população, com a expectativa da criação de uma imunidade coletiva.

O senhor quer que a CPI tome o depoimento do vice-governador do Amazonas, Carlos Almeida Filho. Qual sua opinião sobre as revelações dele?

São muito graves, muito graves. Ele fala, inclusive, de um acordo entre o governador do Amazonas e o presidente Bolsonaro para se fazer uma espécie de experiência. Numa cidade como Manaus, liberar geral, no meio da pandemia, para o povo adoecer logo e gerar essa imunidade.

Como o senhor avalia a primeira semana de depoimentos da CPI?

Eu acho que foi positiva. Nós tivemos dois ministros da Saúde que confirmaram as pressões do presidente da República contra as iniciativas do trabalho deles na linha correta da prevenção, com decisões que não envolviam nada de remédios, essas coisas, mas que eram fundamentais, como testagem, como isolamento social. E o [ex-ministro Luiz Henrique] Mandetta foi além, ele mostrou, ou melhor, os dois mostraram essas pressões por conta do uso da cloroquina sem qualquer embasamento científico. Eu acho que foram muito importantes as declarações que eles fizeram.O Teich disse que saiu do ministério porque queriam pressioná-lo a criar um protocolo do uso de cloroquina, e ele não aceitava, e o Mandetta disse que tinha sido pressionado por causa das posições dele sobre isolamento social, cloroquina. Mandetta falou da presença dos filhos de Bolsonaro nessa espécie de assessoramento paralelo, falou do papel do ministro das Relações Exteriores [Ernesto Araújo], que criou todo esse problema. Então, eu acho que foi muito importante.

Os depoimentos atenderam às suas expectativas?

Eu acho que estão sendo atendidas essas expectativas, porque vai ficando cada vez mais claro que o governo não somente adotou uma postura pela ideia da imunidade coletiva, expôs a população brasileira a um tremendo risco, ele próprio [Bolsonaro] cumpriu um papel de disseminar o vírus e eu acho que isso caracteriza, sem dúvida, crime contra a saúde pública, crime de responsabilidade e crime contra a humanidade.

Como ex-ministro da Saúde, como o senhor vê essas deficiências de uma pasta que já foi excelência em várias áreas da prevenção e da assistência?

Eu acho que esse processo de militarização que aconteceu, especialmente, foi muito danoso para um ministério que teve uma excelência técnica, sempre trabalhou profissionalmente, e que agora está nessa situação.

Notícias pelo celular

Receba direto no celular as notícias mais recentes publicadas pelo Correio Braziliense. É de graça. Clique aqui e participe da comunidade do Correio, uma das inovações lançadas pelo WhatsApp.


Dê a sua opinião

O Correio tem um espaço na edição impressa para publicar a opinião dos leitores. As mensagens devem ter, no máximo, 10 linhas e incluir nome, endereço e telefone para o e-mail sredat.df@dabr.com.br.

Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor. As mensagens estão sujeitas a moderação prévia antes da publicação