No cargo há um mês, o novo ministro da Justiça e Segurança Pública, Anderson Torres, afirma que o governo do presidente Jair Bolsonaro fez o que pôde em relação à pandemia da covid-19, que já matou mais de 400 mil brasileiros. "Não concordo que o Brasil poderia ter reagido melhor. Acho que o Brasil reagiu na medida daquilo que o país tinha em mãos, daquilo que ele sabia", disse, em entrevista ao Correio.
Torres ainda ressaltou que "se você pegar as porcentagens de mortes mundo afora, não estamos tão desproporcionais assim". "A gente fez uma porcentagem de mortes. Não está tão ruim assim. Uma morte (já) é péssima. Ainda mais, quase meio milhão de mortes. É muito ruim. Mas a gente tem feito o que pode ser feito. Vivemos num país continental, desigual, um Brasil de muitos brasis, em que as coisas não são fáceis", disse.
Primeiro delegado da Polícia Federal a chefiar a pasta, o ministro da Justiça defende as ações do presidente Jair Bolsonaro, questionadas por autoridades sanitárias, políticos, e que estão sendo investigadas em uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado. "O que o Brasil poderia fazer, foi feito. E está sendo feito. Talvez a maior distribuição de recursos da história para estados e municípios", afirmou, utilizando dos mesmos argumentos já usados por Bolsonaro.
Confira trechos da entrevista concedida ao Correio:
Qual a prioridade do ministério neste momento?
Costumo começar pelo que tem que ser feito, pelo o que é prioritário na gestão. Estamos vivendo um momento de pandemia, um momento difícil, de solidariedade e de ajuda. E acho que a gente vai começar buscando políticas de Justiça e até a segurança pública, no sentido de ajudar e orientar a população brasileira até a gente sair dessa crise.
Por exemplo?
A gente tem algumas ideias de operações, de medidas daqui do Ministério para poder ajudar as pessoas e não apenas fazer a ação de repressão. E aqui, volto a falar da atuação no Distrito Federal. A gente orientou a Polícia Federal, no início da pandemia, a orientar muito mais do que reprimir as pessoas. E assim foi feito. Todas as medidas tomadas aqui, a polícia ajudou desde o início, nas diversas questões. E, no governo federal, a gente não pensa em fazer diferente. Acho que isso é muito importante, e a população precisa nesse momento.
Mas deu certo?
A polícia pode ajudar, orientar, ajudar inclusive na distribuição de máscaras, na orientação da população, na fila dos hospitais, na distribuição de vacinas, acho que isso deu muito certo. Acho que no governo federal também. Aqui, o Exército já se envolveu nesse trabalho e acho que a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal têm um papel muito importante nisso.
Setores da área de segurança reclamam que falta uma coordenação geral para que possam contribuir. Como o sr. enxerga essa situação?
Na questão do planejamento, essa doença pegou todo mundo muito de surpresa. As pessoas, às vezes, cobram uma resposta do Estado e o próprio Estado não tinha essa resposta. E até hoje acho que não há uma resposta exata. Qual a melhor saída? É o isolamento? Quem tem essa fórmula pronta? A covid está matando no mundo inteiro. A gente procurou no Distrito Federal e vai procurar aqui também organizar e orientar da melhor forma possível. Mas eu digo a você, não foi fácil. Não é tão matemático assim quanto parece. Acho que o país tem acertado muito no que tem feito e, apesar da tragédia das mortes, que todos nós lamentamos, temos conseguido vacinar uma quantidade muito grande de pessoas. Acredito muito que o caminho vai ser esse, a vacinação em massa para que a gente possa sair dessa crise.
O presidente Bolsonaro afirma que pode convocar o Exército e a polícia para garantir o ir e vir. Como o Ministério da Justiça, defensor da lei e da ordem, vai lidar com essa posição do Planalto?
Com muita tranquilidade. Como você bem disse, somos defensores da lei e da ordem e vamos manter a lei e a ordem a todo custo. A população já entendeu o que pode e o que não pode. Já estamos com mais de um ano de pandemia. O momento inicial, de ficar discutindo isso já passou. O cidadão já entendeu e até citei esse exemplo aqui hoje: estamos trabalhando. Trabalhar é uma coisa que o cidadão já entendeu que pode.
E onde está o erro então?
O que tem que ser coibido são abusos que as pessoas insistem em cometer, por exemplo, festas supernumerosas num momento difícil como esse. Agora, o trabalho, a circulação, o ir e vir da população, a gente vai garantir, vai manter, na medida em que as coisas forem acontecendo, porque a gente quer isso e é extremamente importante para o país.
O senhor tem conversado com os secretários de segurança dos Estados, para tentar estabelecer um diálogo nessas ações sobre o ir e vir das pessoas?
Foi a primeira reunião que fizemos aqui, chamar os secretários de Segurança, meus companheiros de jornada até outro dia. Discutimos vários assuntos, o Fundo Nacional de Segurança Pública, pandemia, vacinação dos policiais, tudo isso foi tratado aqui com eles. A gente tem uma pauta bem extensa de pedidos deles e estamos trabalhando aqui para poder adiantar ao máximo, enfim, atender e ajudar os colegas do Estado.
Concorda, então, com a posição do presidente sobre as críticas que ele faz às medidas restritivas? O isolamento não é solução?
De agora para frente, não é mais a solução. A gente já teve um momento inicial em que ninguém sabia o que era certo ou errado. Volto a dizer, ninguém tem essa receita até hoje. Mas de agora para frente, o Brasil precisa andar. A crise não está pequena; a crise financeira está muito grande, o cidadão precisa voltar a trabalhar. Claro, que não tem ninguém aqui dizendo que não precisa tomar os cuidados necessários, mas o Brasil precisa funcionar.
Mas o Brasil não poderia ter reagido melhor? Afinal, estamos falando de 400 mil mortes…
Não concordo que o Brasil poderia ter reagido melhor. O Brasil reagiu na medida daquilo que o país tinha em mãos, daquilo que ele sabia. Se você pegar as porcentagens de mortes mundo afora, não estamos tão desproporcionais assim. Ainda ontem à noite conversávamos sobre isso. A gente fez uma porcentagem de mortes. Não está tão ruim assim. Quer dizer, é péssimo. Uma morte (já) é péssima. Ainda mais, quase meio milhão de mortes. É muito ruim. Mas a gente tem feito o que pode ser feito. Vivemos num país continental, desigual, um Brasil de muitos brasis, em que as coisas não são fáceis. O que o Brasil poderia fazer, foi feito. E está sendo feito. Talvez a maior distribuição de recursos da história para Estados e municípios. Digo, se fosse uma crise de segurança pública? Eu como secretário de segurança do DF, o que eu precisaria do governo federal? Estrutura. Porque lá eu sei o que fazer. E estrutura foi dada para os estados. Isso ninguém pode negar.
O senhor está se referindo a recursos, mas este não é o único papel do governo federal. É dever também coordenar ações para auxiliar os estados.
Aí vamos entrar em questões judiciais, da autonomia dos governadores, do estado federado, vamos discutir aqui até amanhã. Na minha avaliação, o governo federal fez e vem fazendo a parte dele.
Mas o Supremo não impediu o governo federal de coordenar, ela só deu aos governos estaduais autonomia para que tomassem medidas. Até porque o governo federal não estava tomando…
Se eles decidiram desse jeito, o governo federal repassou os recursos. Falo isso com muita tranquilidade. Eu estava num governo estadual, para mim é muito fácil. Vi a importância dos recursos do governo federal no governo estadual para ele poder trabalhar. Volto a dizer a vocês, a autonomia de um governador, a capilaridade dele é muito maior. Não concordo e não acho certo culpar o governo federal pelo que está acontecendo.
Leia a íntegra da entrevista na edição impressa do Correio Braziliense.