Queixa-crime ao plenário

Ministra Cármen Lúcia encaminha ao exame do colegiado do STF acusação de genocídio contra o presidente Bolsonaro. Segunda a peça judicial, o mandatário vetou um trecho de lei que previa fornecimento de água potável e insumos médicos à população indígena

A ministra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu que seja levada ao plenário da Corte uma queixa-crime contra o presidente Jair Bolsonaro pela acusação de genocídio dos povos indígenas durante a pandemia de covid-19. Os ministros devem avaliar se a Procuradoria Geral da República (PGR) tem que abrir inquérito para investigar o caso. De acordo com o pedido protocolado no Supremo, o presidente vetou um trecho da lei de assistência aos povos indígenas que previa o fornecimento de água potável e insumos médicos às comunidades tradicionais em meio ao avanço da covid-19 no país.

A queixa-crime também acusa o presidente de genicídio por se omitir das ações de combate à pandemia em relação à população em geral. A PGR se manifestou contra a abertura de investigação. Na avaliação do procurador-geral da República, Augusto Aras, o presidente agiu de acordo com a Constituição ao vetar o envio de insumos médicos aos indígenas, pois não havia recurso destinado para custear a compra do material.

Na ação, o advogado André Barros, representado pelo defensor Max Telesca, pede que o presidente seja investigado e punido por atuar pela disseminação do vírus em território nacional. “O presidente da República buscou, de maneira concreta, que a população saísse às ruas, como de fato saiu, para que contraísse rapidamente a doença, sob a falsa informação da imunização de rebanho”, disse o defensor.

Ele diz, ainda, que é dever do Poder Judiciário atuar para punir os malfeitos. “Se o STF acatar o arquivamento, serão fechadas as portas do Judiciário para a apuração deste genocídio contra o povo brasileiro”, aponta a petição.

Arquivado
O ministro Marco Aurélio Mello determinou o arquivamento de outra queixa-crime contra o presidente Jair Bolsonaro. Na ação, protocolada pelos deputados Ivan Valente (SP), Luíza Erundina (SP) e por Guilherme Boulos, representantes do Psol, o presidente é acusado de violar medida sanitária.

Ao se manifestar sobre o caso, a Procuradoria Geral da República (PGR) afirmou não ver indícios de crimes na conduta do presidente. “O titular de possível ação penal, o Ministério Público Federal, por meio da atuação do vice-procurador-Geral da República, ressalta não haver indícios do cometimento de crime. Conforme o disposto no artigo 3º, inciso I, da Lei nº 8.038/1990, compete ao relator: Art. 3º. [...] I – determinar o arquivamento do inquérito ou de peças informativas, quando o requerer o Ministério Público, ou submeter o requerimento à decisão competente do Tribunal; Ante a manifestação do Ministério Público, mediante ato do Órgão de cúpula, arquivem”, disse o ministro em trecho do despacho.

Marco Aurélio seguiu a manifestação da PGR e arquivou. A decisão não afeta a queixa-crime que a ministra Cármen solicitou que seja votada em plenário.

 

“Pode-se provar com segurança que centenas de milhares de vidas teriam sido salvas, caso o presidente e outras autoridades tivessem cumprido com o seu dever constitucional de zelar pela saúde pública? A resposta é um retumbante sim.”

Trecho de documento publicado por comissão da OAB

Comissão da OAB vê crimes

Uma comissão criada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para avaliar as ações do governo federal à frente da pandemia de covid concluiu que o presidente Jair Bolsonaro cometeu crimes de responsabilidade e contra a humanidade. Segundo o colegiado, Bolsonaro agiu deliberadamente contra medidas de proteção ao coronavírus e se omitiu em diversas situações que poderiam reduzir o número de óbitos causados pela doença.

A comissão foi presidida pelo ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Carlos Ayres Britto e contou com a participação dos juristas Miguel Reale Jr.; Carlos Roberto Siqueira Castro; Cléa Carpi; Nabor Bulhões; Antonio Carlos de Almeida Castro; Geraldo Prado; Marta Saad; José Carlos Porciúncula;e Alexandre Freire. O relatório de 24 páginas é dividido em análises sobre possíveis sanções a Bolsonaro no plano nacional (processo de impeachment e denúncias criminais) e internacional (denúncia ao Tribunal Penal Internacional).

“A questão que se põe no presente momento é a seguinte: pode-se provar com segurança, e de acordo com as leis da natureza, que centenas de milhares de vidas teriam sido salvas, caso o presidente e outras autoridades tivessem cumprido com o seu dever constitucional de zelar pela saúde pública? A resposta é um retumbante sim”, apontou o relatório dos juristas.

O colegiado relembrou três ocasiões em que omissões e ações do governo pesaram no combate à pandemia: a falta de interesse de Bolsonaro em negociar vacinas com a Pfizer no ano passado; as ações do presidente ao desautorizar o então ministro da Saúde Eduardo Pazuello a comprar doses da Coronavac do Instituto Butantan; e a resistência do governo federal em adotar medidas sanitárias que ajudariam a minimizar a transmissão do vírus, como o distanciamento social e o uso de máscaras.

O relatório da comissão será levado para discussão no plenário do Conselho Federal da OAB, que reúne representantes das seccionais estaduais da entidade e o seu presidente, Felipe Santa Cruz. Com base no parecer, a Ordem poderá apresentar um pedido de impeachment contra Bolsonaro. Até o momento, a OAB não elaborou nenhum pedido de afastamento do presidente.