Em manifestação enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF), no âmbito da ação em que o ministro Nunes Marques autorizou cultos e celebrações religiosas em todo o Brasil, mesmo em meio ao pior momento da pandemia do coronavírus, a Advogacia-Geral da União (AGU) se manifestou contra o conhecimento da ação. No entendimento da AGU, a Associação Nacional dos Juristas Evangélicos (Anajure) não demonstrou legitimidade para o ajuizamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF).
A referida associação entrou com a ação no Supremo com o objetivo de que fossem declarados inconstitucionais os decretos estaduais e municipais que determinaram a suspensão de atividades religiosas, como uma medida restritiva para conter a disseminação do coronavírus, com estados com o sistema de Saúde em colapso. O ministro Nunes Marques, último a entrar no Supremo após indicação do presidente Jair Bolsonaro, que é um grande crítico às medidas restritivas, autorizou neste sábado (3) a realização de cultos, apontando como justificativa a celebração da Páscoa.
Na decisão, ele determina que seja limitada a presença em cultos e missas a 25% da capacidade do público. A AGU pontuou na manifestação que a associação “sequer constitui uma entidade de classe, uma vez que não tem por finalidade representar uma categoria profissional ou econômica específica”, ressaltando que o grupo é heterogêneo (com advogados, juízes e promotores, por exemplo). O documento é assinado pelo advogado-geral substituto Fabrício da Soller, e não pelo advogado-geral André Mendonça, pastor e figura próxima ao presidente Jair Bolsonaro.
Conforme pontua na manifestação, há o entendimento no STF de que uma entidade de classe, para fins de legitimidade para a instauração de ação de inconstitucionalidade, deve ser composta por categoria homogênea. Além disso, a associação não comprovou atuação no âmbito nacional, sendo que é necessário que uma associação comprove ter membros ou associações em ao menos nove estados para ter caráter nacional. A AGU ainda traz que recentemente o próprio Supremo, na figura do ministro Alexandre de Moraes, entendeu que a associação não possuía legitimidade em uma outra ADPF, em fevereiro deste ano.
“Dessa maneira, constata-se que a requerente não detém legitimidade para o ajuizamento da presente arguição de descumprimento de preceito fundamental, a qual não deve ser conhecida”, ressalta, dizendo ainda que uma ADPF não é a via mais adequada para análise da suposta inconstitucionalidade dos decretos estaduais e municipais, visto que não há na Constituição Federal uma referência a medidas restritivas para proteção da saúde pública.
Apesar disso, quando se fala no mérito - ou seja, na efetiva restrição da abertura de templos religiosos -, a AGU afirma que a completa interdição de atividades religiosas é “uma medida excessivamente onerosa, porquanto poderia ser substituída por restrições parciais, voltadas a evitar situações em que haja o risco acentuado de contágio”. Apesar de entender a competência dos estados e municípios em estabelecer as medidas, avalia que as restrições “deverão sempre observar a razoabilidade e basear-se em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde”, além de ser temporária.
“É certo, portanto, que a implementação de qualquer medida restritiva, no contexto do combate à atual pandemia, depende de lastro técnico idôneo, deve ser espacial e temporalmente limitada e, além disso, deve preservar a dignidade, os direitos humanos e as liberdades fundamentais das pessoas. Isso não significa, contudo, que haja direitos fundamentais absolutos. Com efeito, o cenário pandêmico revelou diversas novas situações em que os direitos humanos entram em rota de colisão, o que exige do legislador e do gestor público um exercício de ponderação no estabelecimento das medidas restritivas”, pontua.
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