A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin de anular os processos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na 13ª Vara Federal de Curitiba tornou o petista elegível novamente.
Com isso, ele poderá se candidatar inclusive nas próximas eleições presidenciais, em outubro de 2022.
Em decisão monocrática nesta segunda (8/3), Fachin reconheceu que a vara de Curitiba não tem competência para julgar os casos da Lava Jato envolvendo o ex-presidente porque os atos julgados não aconteceram no Paraná. À época, Lula era presidente e estava em Brasília — assim, a competência para julgar o caso seria do Distrito Federal.
Segundo a decisão, a 13ª Vara de Curitiba, onde o ex-juiz Sergio Moro atuava até 2018, poderia julgar apenas casos da Lava Jato que envolvesse desvio de dinheiro da Petrobras — o que não é o caso das acusações contra Lula.
Até a tarde desta segunda-feira, Lula estava impedido de concorrer a qualquer cargo público por ter sido condenado nos casos do triplex do Guarujá e do sítio de Atibaia.
As condenações, hoje anuladas, enquadraram Lula na Lei da Ficha Limpa, legislação sancionada por ele próprio, em 2010, quando ainda ocupava a cadeira de presidente da República.
A lei impede que pessoas condenadas por um colegiado — ou seja, por uma corte de segunda instância — possam se candidatar.
Ou seja, não foi a sentença de Moro sobre o triplex do Guarujá, dada em 2017, que impediu o petista de se candidatar, mas sim a confirmação dessa condenação pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), em Porto Alegre.
Em janeiro de 2018, os magistrados confirmaram a sentença de Moro, e aumentaram a pena de prisão de Lula para 12 anos e um mês em regime fechado. Posteriormente, a condenação foi ratificada em terceira instância por uma turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Lula ficou preso por 580 dias na Superintendência da Polícia Federal do Paraná, em Curitiba. Ele foi solto no dia 8 de novembro de 2019.
"A decisão de Fachin afirma que Lula não deveria ter sido julgado pela vara de Curitiba, pois agora, segundo o ministro do STF, está claro que os casos envolvendo o ex-presidente não têm relação com os desvios da Petrobras", explica Vera Chemim, especialista em direito constitucional e mestre em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.
"Fachin não julgou o mérito. Não disse que Lula é inocente ou culpado. Afirmou apenas que ele deve ser julgado pelo juízo do Distrito Federal, e não pela vara que julgou os casos da Lava Jato", diz.
Com a decisão de Fachin, Lula pode se tornar réu novamente, mas o processo volta à primeira instância caso a Justiça decida aceitar a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) mais uma vez.
Ou seja, o petista se tornou elegível novamente porque seu processo voltou à estaca zero: por não ter sido condenado por um colegiado, ele deixa de ser enquadrado pela Lei da Ficha Limpa e pode concorrer a qualquer cargo público, como um cidadão comum.
Ainda há possibilidade de recurso, que pode ser pedido pela Procuradoria Geral da República (PGR) na forma de um chamado agravo regimental. Segundo o jornal Folha de S. Paulo, assessores do Procurador-Geral, Augusto Aras, confirmaram que ele deve entrar com o recurso.
Caso Aras entre de fato com o agravo, a 2ª Turma do STF decidirá se concede ou não o recurso, ou seja, se reverte ou não a decisão de Fachin.
Uma pesquisa recente realizada pelo Ipec (Inteligência em Pesquisa e Consultoria) apontou que, no momento, apenas Lula venceria o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas eleições do próximo ano.
Segundo o Ipec, 50% dos entrevistados disseram que votariam com certeza ou poderiam votar em Lula caso ele se candidatasse novamente a presidente. Outros 44% afirmaram que não o escolheriam de jeito nenhum.
Bolsonaro apareceu no levantamento com 12 pontos porcentuais a menos no potencial de voto (38%), e 12 a mais na rejeição (56%).
Por que Fachin tomou essa decisão?
A decisão de Fachin, relator da Lava Jato no STF, foi tomada a partir de um recurso da defesa do ex-presidente.
Os advogados de Lula argumentam que seus processos não deveriam ter sido julgados na 13ª Vara de Curitiba, comandada até novembro de 2018 pelo ex-juiz Sergio Moro.
Fachin aceitou o pedido, considerando que 13ª Vara de Curitiba "não era o juízo competente para processar e julgar Luiz Inácio Lula da Silva".
Advogados de acusados na Lava Jato há muito questionavam por que processos que envolviam possíveis crimes em diversas partes do Brasil eram julgados nesta vara.
Na visão desses defensores, isso contrariava o princípio do juiz natural, segundo o qual a vara para a qual um caso é remetido tem relação com o local dos crimes investigados.
Uma decisão do plenário do STF do início da Lava Jato, porém, permitiu que todos os casos envolvendo corrupção na Petrobras fossem mantidos em Curitiba.
O que mudou desde então?
Na decisão que anulou as condenações contra Lula, Fachin diz que hoje há novos entendimentos do Supremo que levaram diversos processos a serem distribuídos para outras varas do país.
Nesse contexto, ele considerou que as acusações contra o ex-presidente devem ser julgadas pela Justiça do Distrito Federal.
"Embora a questão da competência já tenha sido suscitada indiretamente, é a primeira vez que o argumento reúne condições processuais de ser examinado, diante do aprofundamento e aperfeiçoamento da matéria pelo Supremo Tribunal Federal", diz nota do gabinete do ministro.
"Inicialmente, retirou-se todos os casos que não se relacionavam com os desvios praticados contra a Petrobras. Em seguida, passou a distribuir por todo território nacional as investigações que tiveram início com as delações premiadas da Odebrecht, OAS e J&F. Finalmente, mais recentemente, os casos envolvendo a Transpetro (Subsidiária da própria Petrobras) também foram retirados da competência da 13a Vara Federal de Curitiba", diz ainda o comunicado, ao listar ações do STF que restringiram o alcance da competência da 13a Vara Federal.
Segundo a decisão de Fachin, os supostos atos ilícitos citados nos processos contra Lula iniciados em Curitiba "não envolviam diretamente apenas a Petrobras, mas ainda outros órgãos da Administração Pública".
"Especificamente em relação a outros agentes políticos que o Ministério Público acusou de adotar um modus operandi semelhante ao que teria sido adotado pelo ex-Presidente, a Segunda Turma tem deslocado o feito para a Justiça Federal do Distrito Federal", ressalta ainda a nota do gabinete do ministro.
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