O presidente da República enfrentará forte pressão política, nas próximas semanas, para mudar a forma com que seu governo lida com a pandemia de covid-19. Isso ocorre por conta da alta descontrolada no número de mortos pela doença, do risco iminente de colapso de sistemas de saúde em diversos estados e da piora nos índices de avaliação de Jair Bolsonaro. Nomes do Centrão já avisaram que é hora de o chefe do Executivo “acertar ou acertar”. Para especialistas, o casamento entre Bolsonaro e o bloco do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), está em risco, caso uma mudança de rumo não ocorra.
Deputados e senadores sentem a pressão das bases eleitorais. Além disso, o risco de contaminação e morte também cresceu entre a classe política, como evidenciou a morte de Major Olimpio (PSL-SP), aos 58 anos, o terceiro na Casa a perder a luta contra o novo coronavírus. Para alguns congressistas, o anúncio, na semana passada, da terceira troca de comando no Ministério da Saúde, em menos de 12 meses, é um dos sinais mais claros da falta de organização do Executivo, que teve Luiz Henrique Mandetta, Nelson Teich, Eduardo Pazuello e, agora, Marcelo Queiroga.
Do grupo de Lira, o vice-presidente da Câmara, Marcelo Ramos (PL-AM), destacou que Queiroga não terá tempo para “aprender a ser ministro”. “As respostas terão que ser rápidas e efetivas. Passar mensagens claras de compromisso com as políticas de prevenção e acelerar o processo de vacinação devem ser ações imediatas. Se o novo ministro combater a pandemia com a medicina, com vacina, com diálogo com estados e municípios, e não com ideologia, já teremos um grande avanço”, ponderou.
Para esta semana, senadores prometeram convocar Queiroga para uma audiência, para que ele diga como vai trabalhar para a aquisição de vacinas, de insumos médicos e disponibilização de leitos de UTI. Mas o futuro ministro já passa sinais negativos e questionou, por exemplo, o número de mortes diárias pela doença, que caminha para 3 mil. “Nossa expectativa é de que o Queiroga defina, até 30 de março, o cronograma de vacinação”, afirmou o senador Wellington Fagundes (PL-MT), da base do presidente. “O cidadão quer saber o dia que será vacinado, para ter tranquilidade e trabalhar. Precisamos de uma guinada”, avisou. Para o parlamentar, a população se sente desorientada, e falta coordenação por parte do Ministério da Saúde. “Não temos mais tempo a perder.”
Vice-líder do Centrão e da maioria e líder do PP, o deputado Cacá Leão (BA) destaca que trata-se de uma posição unânime. “Não adianta mudar o ministro e continuar com a mesma forma de enfrentamento à pandemia. Tivemos uma notícia boa, a Pfizer e Jansen fecharam acordo com o Brasil. Esse é o caminho, vacinar”, afirmou. A respeito do senador Major Olímpio, o parlamentar destacou que ele e colegas receberam com tristeza a notícia, que leva o Congresso a se preocupar “ainda mais”.
Líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE) prometeu que, ao tomar posse, Queiroga vai ao Congresso. De acordo com ele, o futuro ministro pretende construir um ambiente de diálogo e entendimento com governadores, prefeitos e parlamento, e “reiterar a prioridade na campanha de imunização, recuperar o tempo perdido no planejamento para a mais rápida aquisição das vacinas e viabilizar, em prazo mais curto possível, a ampla vacinação dos brasileiros”.
Para o analista político Melillo Dinis, do portal Inteligência Política, há uma tentativa da base do governo de reduzir a pressão provocada pela incapacidade do governo em lidar com o problema. Ele alerta, no entanto, que o prognóstico é negativo, pois há tendência de piora no cenário da pandemia. A reunião marcada para a próxima quarta, com os presidentes da Câmara, Senado e STF, por exemplo, é uma estratégia de despressurização. “Tudo isso é pandemia, que gera uma pressão. Tem um momento que é preciso reduzir a pressão da base eleitoral. A água está no pescoço. Bolsonaro vai tentar melhorar o quadro enquanto levanta suas cortinas de fumaça”, avaliou.
A “cortina de fumaça da vez”, segundo Melillo, é a declaração de Bolsonaro sobre o estado de sítio. O presidente, porém, precisa provocar desvios no debate público para prejudicar a atenção da classe política. “Esse jogo duplo é para esconder dois problemas graves: a pandemia e a fome, que voltou, e o governo não sabe como resolver. Não tem vacina, não tem estrutura, não se organizou, não imaginou que essa cepa seria mais agressiva. As elites não se convenceram da gravidade da pandemia. Por isso, a situação de Bolsonaro com o Centrão está amarrada enquanto houver uma cortina de fumaça”, apontou.
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