PEC da Impunidade

Nova versão da PEC 3/2021 vem sem duplo grau de jurisdição

Trecho retirado funcionaria nos casos de inelegibilidade. Candidatos condenados por crimes só seriam impedidos de disputar vaga na Câmara ou Senado durante as eleições após o caso ter sido julgado novamente, em uma instância superior, enfraquecendo a Lei da Ficha Limpa

A relatora da proposta de emenda à Constituição (PEC) 3/2021, deputada Margarete Coelho (PP-PI), e o deputado que assina o texto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), defenderam o texto após a reunião de líderes desta quinta-feira (25/2). Ambos admitiram, porém, a retirada do duplo grau de jurisdição do texto, medida que enfraquece a Lei da Ficha Limpa. O dispositivo funcionaria justamente nos casos de inelegibilidade. Candidatos condenados por crimes só seriam impedidos de disputar vaga na Câmara ou Senado durante as eleições após o caso ter sido julgado novamente, em uma instância superior.

A PEC foi duramente atacada na sessão desta quarta-feira (24), mas teve a admissibilidade aprovada por 304 votos a 154. Sabino defendeu o duplo grau de jurisdição, que disse ser constitucional. “Mas, entendemos que não é o momento e retiramos”, afirmou.

Sobre a possibilidade de parlamentares serem presos em flagrante somente em casos previstos na Constituição, o parlamentar destacou que a norma já vale hoje. A Constituição já fala que (parlamentares) só podem ser presos em flagrante por crime inafiançável. Agora, estamos explicando quais são os crimes”, justificou.

O parlamentar rebateu as críticas de colegas, e disse que muitos falaram do texto sem lê-lo. “Ontem (quarta-feira) falaram que o texto era para dificultar prisão de deputados. Não muda nada. Facilita a prisão preventiva. Estamos endurecendo a lei restringindo o foro privilegiado. Será julgado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) pelas condutas praticadas no mandato e relacionadas ao mandato. É uma robusta revisão. Algumas pessoas se pautam para se movimentar pela opinião publicada. É um absurdo. Chamaram de PEC da imunidade, depois, de PEC da impunidade, da dificuldade da prisão. Vou chamar de PEC das versões, pois muita gente não leu o texto e saiu comentando”, reclamou Sabino.

A nova versão

Margarete Coelho explicou que a nova versão do texto se limita ao artigo 53. Segundo ela, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) não será beneficiado pelas mudanças, pois o crime de opinião não tem relação com o mandato, e somente essa seara estaria sendo tratada pela PEC. Silveira está preso no Batalhão Especial Prisional da Polícia Militar do Rio de Janeiro após atacar a Suprema Corte, incitar o linchamento de ministros do STF, e fazer apologia ao Ato Institucional Número 5, o mais violento dos atos institucionais da Ditadura Militar. De acordo com a parlamentar, não há mudanças pois ele é processado pela Lei de Segurança Nacional.

“Continua da mesma forma. O crime de opinião não tem relação com o mandato. O decoro é para proteger a dignidade da Casa. É aquilo que quebra a dignidade da Casa. O sujeito passivo da quebra de decoro é o parlamento, não o parlamentar. Outra coisa são os crimes, que serão punidos da mesma forma. E a jurisprudência do Supremo é pacífica com relação a isso”, disse. “Esses crimes (previstos da Lei de Segurança Nacional) já são inafiançáveis”, completou.

De acordo com a deputada, a preocupação seria afastada por “uma leitura atenta do que diz o texto da lei”. O texto manteve a prisão em flagrante de parlamentares somente em casos de crime inafiançável. “São os crimes inafiançáveis pela natureza. Aqueles que a lei disse que seriam inafiançáveis. No texto original, seriam aqueles com sede constitucional. Por acordo, o texto passará a constar nos termos da lei. Deixa mais claro, embora, substancialmente, não haja grande diferença. Na verdade, os crimes inafiançáveis estão na Constituição. A lei de crimes hediondos pode ser emendada a qualquer dia para acrescentar novas espécies. O rol de crimes hediondos é bem extenso”, afirmou.

Prisão preventiva

Ainda de acordo com Margarete Coelho, a PEC cria a prisão preventiva para parlamentares, tornando a lei mais dura para os deputados. “Não temos possibilidade de prisão preventiva para parlamentar hoje. A partir dessa emenda, vamos ter a possibilidade de prisão preventiva, até para deixar a Constituição mais clara. Hoje, o parlamentar é preso em flagrante, a prisão tem duração de 24h. Passou o período e nós confirmamos a prisão, como fizemos no caso de Daniel Silveira? Tem um limbo aí. A PEC pode transformar, a pedido do MP, a prisão em flagrante em preventiva. Ficou mais rígido”, disse.

“Restringimos imunidades. Inafiançáveis são os (crimes) que estão na forma da lei. Estamos tornando a lei mais severa, ao contrário do que temos ouvido alguns parlamentares a defenderem da tribuna. O parlamentar só pode ser preso em flagrante, se o flagrante puder ser transformado em preventiva. E hoje, não poderia. É nisso que estou dizendo que há enrijecimento. Agora, taxativamente, é o que a Constituição diz. Seria incontestável a manutenção dele (Daniel Silveira) na prisão”, argumentou. “Claro que o Supremo tem poder e competência legal para interpretar a Constituição. E é possível essa interpretação. Mas não há mais necessidade de hermenêutica para dizer isso”, acrescentou.

Presos no Congresso

Sobre a custódia de parlamentares presos pela Câmara, outro ponto polêmico, a relatora afirmou que o parlamentar não ficará, necessariamente, detido nas dependências do Congresso Nacional. Ela lembrou que a custódia do parlamentar pela Câmara já é prevista no regimento. Segundo Margarete Coelho, os presos poderiam aproveitar espaços que já existem em outras instituições, salas para a prisão de juízes, promotores e ministros.

“A questão da custódia não é física. É sob a guarda. E pode ser determinado um lugar onde vai ser feito. Nunca vi um juiz preso em uma cela. Ficam em uma sala de estado maior construída exclusivamente para isso. Os parlamentares também poderiam aproveitar esses espaços para serem custodiados. Não se trata de uma apreensão física do parlamentar ou das provas”, destacou.

A relatora foi contrária ao afastamento de parlamentares do cargo por decisão judicial, como aconteceu com a deputada suspensa do PSD Flordelis (RJ), acusada de arquitetar a morte do marido, Anderson do Carmo, 42 anos, em junho de 2020. “O parlamentar precisa que a decisão transite em julgado. E depois da condenação, nesse caso como tivemos o da Flordelis, ele vai para o Tribunal de Ética, para o Tribunal de Ética cassar o mandato dele. Não há possibilidade de afastamento de mandato e cassação pelo Judiciário. Não houve grande alteração. Só explicitamos melhor o que já diz a lei”, afirmou.

Outro trecho delicado que permaneceu foi a da busca e apreensão em caso de parlamentares denunciados. Ainda assim, Margarete Coelho admitiu que o trecho, “talvez, precise de maior clareza”. Para expedir um mandado de busca e apreensão contra deputados e senadores, segundo a PEC, será necessário um referendo do Supremo.

Para completar, no caso de o cumprimento da ordem ocorrer nas dependências do Congresso, será preciso avisar previamente a polícia legislativa. Se a busca não for confirmada pelo STF, o material apreendido será devolvido lacrado e o responsável pela busca e apreensão poderá responder por abuso de autoridade.

Segundo a relatora, a resposta do Supremo seria imediata tanto no caso do mandado de busca e apreensão quanto no caso da prisão em flagrante.

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