A Comissão Mista de Orçamento (CMO), que tem a missão de decidir sobre a aplicação dos recursos públicos, terá um papel fundamental neste ano pré-eleitoral de 2021: indicar com clareza ao mercado se vai optar pela redução das desigualdades, com responsabilidade fiscal, ou se vai permitir que interesses políticos contaminem suas deliberações. O foco principal das discussões é como os parlamentares vão tratar a extensão do auxílio emergencial durante a nova onda da pandemia da covid-19.
Pelas declarações da maioria dos membros titulares da CMO (31 deputados e 11 senadores), o benefício será aprovado sem dificuldade. Esse cenário ficou ainda mais claro após o acordo anunciado na última sexta-feira entre o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e o da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro da Economia, Paulo Guedes. O entendimento é de que o auxílio deve voltar a ser pago entre março e junho, em valor ainda não definido. Em contrapartida, seria incluída uma cláusula de calamidade na Proposta de Emenda à Constituição do Pacto Federativo para permitir a criação de um novo Orçamento de Guerra voltado ao pagamento exclusivo do benefício.
Para Neuriberg Dias, analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), o cenário natural é a CMO apresentar e até impor uma continuidade do auxílio. Alguns fatores explicam essa motivação: o econômico, o social e a vitória dos aliados do presidente Jair Bolsonaro, na Câmara e no Senado. “O Congresso Nacional está mais próximo da população, nas bases eleitorais. Deputados e senadores estão cientes de que estados e municípios querem algum tipo de ajuda da União, mesmo que temporária”.
“Possivelmente, o auxílio será apoiado de forma integral pelo colegiado e pelo plenário. O assunto é positivo e estratégico para as agendas de reformas no futuro. Ou seja, o Legislativo dá de um lado e, por outro, reduz a pressão para discutir temas duros, como a PEC Emergencial, a reforma administrativa e a reforma tributária. Essa ajuda tão necessária funcionará para reduzir resistências e facilitar ao governo a condução da agenda no Congresso”, assinala Dias. Já a negociação sobre valores será “um jogo trabalhado”, diz.
“O governo chega com R$ 250 mensais, sabendo que avançará para R$ 300 ou R$ 400. Dá uma vitória ao Legislativo em troca de apoio”, emenda Dias. Jorge Mizael, diretor da Metapolítica Assessoria Parlamentar, lembra que o presidente da República vem se desidratando nas pesquisas eleitorais. “Em apenas uma semana, sua popularidade despencou de 37% para 31%.” O coronavoucher tem um custo mensal de R$ 50 bilhões, pagando R$ 600, em média, enquanto a despesas anual com o Programa Bolsa Família é de cerca de R$ 30 bilhões.
“O cornavoucher é um instrumento caro, mas que garantiu ao presidente seu maior grau de popularidade após as eleições. Dentro do Congresso, já existe um alinhamento muito claro, confirmado pelas eleições nas duas Casas”, diz Mizael. Além disso, acrescenta, tanto a pauta sanitária quanto as que trazem arrocho têm o mesmo relator: o senador Marcio Bittar (MDB-AC). “Ele é o relator do Orçamento e das PEC 188 e Emergencial”, destaca. “Será muito difícil que algum parlamentar se posicione publicamente contra o auxílio, que tem um apelo social e eleitoral muito grande. Imagino uma votação tecnicamente dura, mas com uma maioria clara”, diz ele.
Diálogo
A presidente da CMO, deputada Flávia Arruda (PL-DF), será responsável por conduzir a análise da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Projeto de Lei Orçamentária Anual (Ploa) de 2022. Em relação ao auxílio emergencial, ela preferiu se manter em campo neutro. “A crise social é muito grave e continua exigindo algum tipo de renda para os mais vulneráveis. Vamos fazer esse debate na CMO e, em diálogo com o governo, construir uma solução para disponibilizar recursos nos limites do possível para não desorganizar a economia”, disse. Seu colega Júlio Cesar (PSD-PI) é a favor, mas desde que haja algumas alterações: com valor menor e respeitando o teto de gastos
Zé Vitor (PL-MG) também é favorável. “Acho necessário e urgente. Há milhares de famílias em situação de muita vulnerabilidade. O fim da pandemia não chegou, infelizmente. Temos que garantir apoio para essas famílias ao passo que a vacinação avance. Acredito que a retomada econômica está acontecendo. Junto disso, temos que assegurar um incentivo do Estado e encontrar uma saída, sem deixar de atender ao bom senso fiscal”, afirma.
Entre os senadores, Eliziane Gama (Cidadania-MA) acredita que “uma nova aprovação do benefício não encontrará resistência dos pares”. Felipe Carreiras (PSB-PE) entende que, “diante do cenário que estamos vivendo, é importante uma mão do governo para auxiliar as pessoas em situação de vulnerabilidade”. Fábio Henrique (PDT-PE) também afirma que “o auxílio é fundamental para as famílias mais pobres e para o reaquecimento da economia”. Lucas Vergílio (Solidariedade) garante que é “totalmente a favor, mas é preciso saber de onde vai sair o dinheiro para o pagamento”. Para Jorge Kajuru (Cidadania/GO), “já passou da hora de recriar o auxílio”.
*Estagiária sob a supervisão de Odail Figueiredo