A primeira semana após as eleições das lideranças do Congresso foi de reacomodação e estabelecimento de pautas prioritárias. No entanto, de pronto, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) tem dominado a cena em relação ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), líder do Centrão e responsável pela construção de uma base no governo.
Um dos pontos de divergência de estilos está na discrição adotada por Lira, mais voltado para causas internas no Parlamento e atuante nos bastidores como articulador. A postura diverge ainda em comparação ao ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que concedia entrevistas à mídia quase que diariamente. Lira prefere ser mais comedido no relacionamento com a imprensa. Já Pacheco indica um perfil pacificador, com crescente desenvoltura retórica. Em entrevista ao Correio Braziliense/Estado de Minas, publicada ontem, Pacheco afirmou que pretende buscar saídas em meio à crescente polarização política. “Sempre haverá caminhos para solucionar quando não há consenso”, comentou.
O contexto da pandemia, com enfrentamentos políticos de toda ordem, torna o cenário mais complexo. O deputado Marcelo Ramos (PL-AM), vice-presidente da Câmara, alerta para o perigo de uma guerra de egos em meio à pandemia da covid-19. No entanto, ressalta que os líderes das Casas não se contrapõem, mas se completam. “O Brasil vive um momento sensível com mais de 200 mil mortos. Os dois são grandes quadros da política brasileira e têm a qualidade de não fazer de uma disputa por protagonismo algo maior do que a responsabilidade com o país”, declara.
Ramos destaca que uma das qualidades de Lira é ser prático. “O que o governo precisar e tiver convencimento, ele (Lira) sabe os caminhos e vai construir a maioria em torno porque tem palavra. É cumpridor de acordos. Pacheco é um quadro político destacado, preparado, de formação consistente. Eles se complementam”.
E afirma não ver procura por protagonismo. “Não vejo, nem deveriam criar. Em alguns momentos, tivemos disputas entre Câmara e Senado, e quando as Casas brigam por holofote quem perde é a população. Lira tem nossa confiança. Uma maioria na Câmara que confia nele e grande parte dos parlamentares não está preocupada com isso”.
Vice-líder do governo no Congresso Nacional, o senador Marcos Rogério (DEM) analisa que a boa desenvoltura de Pacheco é uma característica natural. “Pacheco não busca protagonismo. Ele tem outro estilo, não significa que seja melhor ou pior. Pacheco é um presidente com performance na administração da Casa, conectado com temas para fora. Ele projeta a presidência para fora com temas que devem ser debatidos. Quem olha em uma semana vê protagonismo, mas não que ele chame para ele, é natural dele”.
“Presença mais firme”
Entre as diferenças, o parlamentar afirma que o presidente do Senado apresenta características mais técnicas, enquanto que o titular da Câmara, mais política. “Lira é um articulador habilidoso e conhece os temas da pauta. É natural que o presidente do Senado tenha uma presença mais firme porque o chefe do setor legislativo é ele e acaba sendo destacado. O Lira tem perfil que joga tanto internamente quanto por fora. Como líder, sei que é absolutamente habilidoso, com pouco tempo ele vai ganhar o plenário, com o jeito como comanda. Pacheco tem uma linguagem mais técnica. Lira é mais política”, opina.
Mayra Goulard, professora de ciência política da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora do Laboratório de Partidos, Eleições e Política Comparada, explica que, pela dinâmica legislativa, é o presidente da Câmara que decide sobre a votação de leis, indica presidentes das Comissões e avalia, também, o impeachment. “Nesse aspecto, a Câmara possui um protagonismo maior que o Senado”, ressalta.
Contudo, a especialista pontua que esse protagonismo do presidente da Câmara em relação ao Senado também traz maior possibilidade de desgaste. “A Câmara fica responsável por fazer as composições, aprovações das agendas e das pautas. E nesse cenário, no qual o Executivo não está cumprindo o seu papel de articulador e negociador, esse papel pesa mais”.
A cientista política também disse que, pela negociação de cargos de segundo escalão, é perceptível que o Executivo não está disposto a negociar sua agenda. “Acaba que esse esforço de negociação recai muito sobre os presidentes das Casas, por isso, nos últimos anos, assistimos a um protagonismo em relação a Rodrigo Maia, por exemplo”.
Mayra aponta que, com a saída de Maia, a Câmara deve voltar a ser mais reativa. “Maia ganhou protagonismo nacional ao não ter uma relação tão submissa com o chefe do Executivo. Nesse aspecto, o Legislativo era mais ativo e menos reativo. Agora, pelo perfil de Arthur Lira, ele vai ter uma relação contígua com o Executivo e o parlamento deve adquirir uma função menos protagônica”, opina.
Paulo Ramirez, cientista social e professor da graduação em Administração da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-SP), define as atitudes de Rodrigo Pacheco como conciliadoras. “Ele adotou essa postura até porque obteve apoio tanto do bolsonarismo como do PT”, salienta.
Na visão de Ramirez, as pautas morais de Bolsonaro dificilmente chegarão à mesa para serem votadas no Senado. “O Pacheco também assumiu uma aliança com a oposição, ou seja, isso significa que as pautas econômicas do governo, como Reformas, serão discutidas, mas pautas morais da ala bolsonarista não”.
Em contrapartida, Ramirez pontua que Arthur Lira presta total apoio ao presidente da República. “Na Câmara as pautas de cunho moral serão aprovadas, no Senado que será algo complicado. A posição de Pacheco se parece um pouco com a de Alcolumbre, porque o Davi Alcolumbre não peitou o Bolsonaro publicamente em nenhuma ocasião, e o Pacheco tende a continuar essa perspectiva de dialogar com a oposição”.
*Estagiário sob a supervisão de Andreia Castro