Com a pressão dos caminhoneiros — que ameaçaram fazer nova greve, na segunda-feira (8/2), mas que teve baixa adesão —, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que o governo estuda um projeto de lei, a ser enviado na próxima semana ao Congresso, para diminuir o impacto do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre os preços dos combustíveis. A intenção, segundo ele, é que “a previsibilidade se faça presente, assim como o PIS/Cofins do governo federal, em que temos um valor fixo para o litro do diesel, por exemplo, R$ 0,35. Quanto ao ICMS, é variável. Cada estado decide o seu valor”, conforme explicou, em coletiva de imprensa com a presença de ministros, entre os quais o da Economia, Paulo Guedes, e do presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco.
Bolsonaro ressaltou que a medida será enviada ao Parlamento, caso seja juridicamente possível. “Nós pretendemos ultimar um estudo e, caso seja viável, juridicamente possível, nós apresentaremos, ainda na próxima semana, fazendo com que o ICMS venha a incidir sobre o preço do combustível nas refinarias, ou um valor fixo para o álcool, a gasolina e o diesel”, ressaltou. “E quem vai definir esse percentual ou esse valor fixo? Serão as respectivas assembleias legislativas. Todos sabem que o ICMS é variável de estado para estado. E o que a população quer é essa previsibilidade. Repito: a exemplo do PIS/Cofins do diesel, de R$ 0,35, que não é alterado desde janeiro de 2019, quando nós assumimos o governo.”
Na avaliação de Bolsonaro, o projeto de alteração no ICMS não afetaria a arrecadação estadual. Porém, não deu detalhes. “Os governadores não terão de abrir mão de qualquer arrecadação. Afinal de contas, quem vai definir um valor fixo de ICMS em cada litro de combustível ou de um percentual de cada litro de combustível é sua respectiva assembleia legislativa”, frisou. “Assim como não há interferência nossa na Petrobras, não há nenhuma interferência nossa naquilo que é cobrado dos senhores governadores. Se o estado está arrecadando X por litro de combustível, usando uma metodologia, ele vai arrecadar, com a nossa proposta, o mesmo X, por outra metodologia.”
O chefe do Executivo voltou a agradecer aos caminhoneiros por não terem aderido ao movimento grevista. A principal reivindicação da categoria é a revisão da política de preços adotada pela Petrobras sobre o litro do óleo diesel, que segue parâmetros internacionais. Na última semana, por exemplo, a petroleira reajustou em quase 5% o preço médio do combustível. “Nós somos um governo que não interferiremos em nada nessa política econômica de combustíveis da nossa Petrobras, mas, obviamente, o preço do combustível não interessa apenas aos senhores caminhoneiros”, declarou.
De acordo com Bolsonaro, “se alguém do Parlamento apresentar uma proposta, hoje, melhor do que a nossa, a gente engaveta a nossa. Estaremos, na segunda-feira, conversando com nossas lideranças para buscar a aprovação desse projeto”, afirmou.
Reação
A ideia de alterar o ICMS sofre resistência dos estados, porque o imposto representa uma parcela considerável da arrecadação estadual. O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), criticou a intenção de Bolsonaro. O tucano avaliou que, com a medida, o chefe do Planalto pretende transferir responsabilidade. “Não é cabível que o presidente da República queira vulnerabilizar o equilíbrio fiscal dos estados brasileiros transferindo, sob qualquer aspecto, a responsabilidade pela eliminação ou redução do ICMS do combustível para os estados”, disparou. “O presidente tem mecanismos, no âmbito federal e no âmbito da Petrobras, para estabelecer o entendimento que julgar conveniente para a redução do preço do combustível — seja o diesel, seja a gasolina, seja o etanol — sem penalizar os estados brasileiros.”
Doria alegou que a maior parte do preço do combustível é determinada pela Petrobras, cabendo a São Paulo uma fatia bem menor. “A maior parte do preço do diesel, exatamente 47%, é determinada pela Petrobras. O ICMS é responsável por uma pequena fatia do preço final do produto. No caso de São Paulo, 13,3%”, justificou.
Segundo Doria, vários governadores são contrários à proposta de Bolsonaro e que, caso seja aprovada, os chefes do Executivo locais “agirão conjuntamente para evitar o dano”. “Hoje (ontem), falei com vários governadores do Brasil, não todos, mas vários, absolutamente contrários a essa proposta e, mais uma vez, teremos de agir”, avisou. “Se houver essa deliberação, os governadores agirão, e uma parcela considerável agirá conjuntamente para evitar esse dano aos estados, que estão suportando uma parcela considerável de todo o programa de saúde pública diante da pandemia, além do atendimento da segurança pública, educação, proteção social e do atendimento aos mais vulneráveis”, enfatizou.
Nota assinada pelo presidente do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz), Rafael Fonteles, e por todos os demais secretários estaduais de Fazenda, publicada na noite de ontem, diz que o aumento dos combustíveis não tem ligação com a política tributária dos estados, mas “são fruto da alteração da política de gerência de preços por parte da Petrobras, que prevê reajustes baseados na paridade do mercado internacional, repassando ao preço dos combustíveis toda a instabilidade do cenário externo do setor e dos mercados financeiros internacionais”.
De acordo com o documento, “especular novas políticas de preços para o ICMS pelas variações no preço do combustível são paliativos ante o grau de volatilidade internacional do segmento”.
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Guedes: "Redução de centavos"
O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou, ontem, que o governo está disposto a buscar alternativas para cortar os tributos federais PIS e Cofins sobre o diesel. Hoje, ambos representam R$ 0,35 no preço do litro. “Temos urgência nisso, não podemos esperar a reforma tributária, que vai levar de seis a oito meses”, ressaltou o titular da equipe econômica, na coletiva com vários ministros e com o presidente Jair Bolsonaro.
Segundo ele, o ministério está estudando uma forma de rever os parâmetros de aumento na arrecadação, com maior crescimento da economia, para reduzir os impostos federais nos combustíveis. “Temos algumas medidas, mas, no curtíssimo prazo, em uma ou duas semanas, estamos revendo os parâmetros. Se o crescimento da economia for maior, de 3,5% do PIB (Produto Interno Bruto), vamos fazer a redução de alguns centavos na bomba para os caminhoneiros. Esse é um dos enfoques que estamos examinando. Claro que tem a questão jurídica”, explicou.
A ideia é atacar a questão por meio de compensação. “A arrecadação deve subir bastante, poderíamos até ir para um superavit primário — não este ano, porém com a recuperação econômica —, mas preferimos usar esse aumento para aliviar impostos federais. Não dá para esperar a reforma tributária, devido à urgência da questão para os caminhoneiros”, enfatizou.
Segundo Guedes, o consumo de diesel em janeiro deste ano foi 19% maior do que em 2019. “Com isso, aumentamos a arrecadação e poderemos fazer uma redução sem fonte de compensação”, destacou. Ele ressaltou que o compromisso do governo é com a responsabilidade fiscal. “Por isso, não podemos reduzir tudo de uma vez, mas nosso objetivo é tirar o Estado do cangote do povo brasileiro, que é responsável pela perda de competitividade das nossas empresas, nossa baixa competitividade internacional.”.
Guedes lembrou que o preço na bomba é mais do que duas vezes o valor cobrado pela Petrobras nas refinarias. “O PIS/Cofins, estamos examinando como desonerar. Não podemos fazer de uma vez, mas vamos começar um movimento nessa direção. Os parâmetros fiscais mostram arrecadação crescente”, reiterou.
Outra medida, mais de médio e longo prazos, porque precisaria de estudos jurídicos e de aprovação no Congresso, é estabelecer a cobrança do ICMS no valor da refinaria, para que o imposto estadual não incida em cima do preço já com o PIS e Cofins, o que o presidente Jair Bolsonaro chamou de bitributação.
Sem interferência
O presidente da Petrobras, Roberto Castello Branco, disse que, ao longo de dois anos, o governo nunca interferiu em valores ou qualquer assunto interno da estatal. “Os preços são determinados de forma global. A Petrobras segue, portanto, as cotações internacionais. Fazer diferente disso foi desastroso no passado. A companhia perdeu US$ 40 bilhões”, ressaltou. “Mas o prejuízo não foi só da empresa. Contribuiu para piorar a percepção de risco do país, com reflexo na taxa de juros, no câmbio e na inflação”, explicou, para justificar a política de paridade internacional nos preços praticados pela petroleira.
Castello Branco disse que, nos cinco primeiros meses de 2020, o preço dos combustíveis caiu 40% nas refinarias da estatal. “Nos postos, a queda foi de 14%”, comparou. Ele afirmou que, durante o governo Bolsonaro, a Petrobras fez avanços significativos. “Em 2019, foi a empresa de petróleo que mais investiu no mundo e passou a exportador líquido de petróleo. No ano passado, bateu recordes de produção e exportação. Ao longo dos últimos dois anos, transferiu R$ 379 bilhões para as três esferas de governo em impostos”, listou. (SK e IS)
Desafio a governadores
Em fevereiro de 2020, o presidente Jair Bolsonaro fez uma provocação aos governadores para que acabassem com o ICMS sobre combustíveis. Ele frisou que, se os estados fizessem, a União seguiria o exemplo. Nas redes sociais, o presidente também defendeu impostos fixos sobre os combustíveis e afirmou que os estados não admitiam “perder receita”. Em resposta, governadores chamaram o chefe do Planalto de populista. O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), reagiu: “Se é para construir soluções, vamos buscar um fórum adequado e não simplesmente ficar lançando desafios”, afirmou à época. Por sua vez, o governador de São Paulo, João Doria, chamou a ideia de “bravata”. “Não se faz gestão por WhatsApp. Convide os governadores para discutirem e debaterem o assunto”, disparou.