Apesar da pressão de parte da classe política para que o governo prorrogue o pagamento do auxílio emergencial, o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, voltaram a afirmar que o Executivo é contra a proposta. Enquanto o mandatário alega não poder deixar que “medidas temporárias relacionadas com a crise se tornem compromissos permanentes de despesas”, o titular da equipe econômica ponderou que a continuidade do benefício significaria a redução de verbas para outras áreas, como saúde, educação e segurança pública.
Contudo, o retorno da pandemia a um estágio mais severo faz com que o Palácio do Planalto não descarte de vez a retomada do auxílio. Diante da encruzilhada para salvar vidas e preservar a economia, Bolsonaro, enfim, reconheceu a importância das vacinas. Após meses questionando a eficácia dos imunizantes contra o novo coronavírus, o presidente, agora, admitiu que os produtos podem “dar mais conforto à população” e “segurança a todos”, além de fazer com “que a nossa economia não deixe de funcionar”. Guedes, por sua vez, aposta na eficácia das vacinas e no sucesso da aplicação dos imunizantes para não ser necessário o pagamento de novas parcelas do auxílio emergencial.
As declarações de Bolsonaro e do ministro ocorreram ontem, durante um evento com investidores estrangeiros promovido pelo banco Credit Suisse. Mais controverso à volta do auxílio, o chefe do Executivo ponderou que o governo precisa estimular a economia com estratégias que envolvam, sobretudo, o respeito ao teto de gastos, norma que limita o crescimento da despesa pública à inflação do ano anterior.
“No âmbito fiscal, manteremos firme compromisso com a regra do teto de despesas como âncora de sustentabilidade e credibilidade econômica. Nosso objetivo é passar da recuperação baseada no apoio ao consumo para um crescimento sustentado pelo dinamismo do setor privado”, frisou. “As projeções do mercado estimam que a taxa de inflação flutuará dentro da banda, com taxa de juros em nível competitivo e atraentes para novos investimentos.”
Ante as críticas de que o governo atrasa a conclusão das privatizações de estatais, o que motivou a recente saída de Wilson Ferreira Junior da presidência da Eletrobras, o chefe do Planalto ressaltou que um dos focos do Executivo para este ano será acelerar os processos para “dar continuidade a medidas de aperfeiçoamento no ambiente de negócios”. Ele também aposta na inclusão do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e na aprovação das reformas tributária e administrativa para recuperar a economia.
“Queremos regulamentos mais simples e menos onerosos para destravar o imenso potencial do Brasil e facilitar o trabalho da iniciativa privada. A modernização da economia e o aprimoramento das políticas públicas passam pela incorporação das melhores práticas internacionais. Estamos no caminho para um 2021 de crescimento econômico projetado 3,5%”, frisou. “Meu governo entende os problemas estruturais pelos quais passa a indústria brasileira e mundial. Estamos empenhados em realizar mudanças nesse setor, com pensamento estratégico e redefinição de vínculos das cadeias produtivas globais.”
Guedes adotou tom mais moderado sobre o auxílio, mas considera a extensão do benefício apenas para situações extremas, como no caso de o Brasil “falhar miseravelmente” com as vacinas. “Vamos observar a economia e a saúde, os dois andam juntos. E vamos esperar pelo melhor e que, com a vacinação em massa, as mortes estejam descendo”, disse.
O ministro acrescentou: “Vamos observar. Caso o pior aconteça, se a doença volta, como compatibilizar uma coisa com a outra? Bom, temos o protocolo da crise aperfeiçoado agora. Se não for o caso (de retorno à normalidade), porque a vacinação não está andando ou porque as mortes continuam acima de mil, já existe o protocolo da crise”.
Guedes afirmou que, se a prorrogação do benefício for necessária, poderia ser incluída na proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial, que trata da regulamentação dos gatilhos a serem acionados no caso de descumprimento do teto de gastos.
“Quer criar o auxílio de novo? Tem de ter muito cuidado. Se fizer isso, não pode ter aumento automático de verbas para educação e segurança pública, porque a prioridade passou a ser a guerra (contra a pandemia). Pega as guerras aí para ver se tinha aumento de salário, se tinha dinheiro para saúde e educação. Não tem, é dinheiro para a guerra. Aqui, é a mesma coisa. Se apertar o botão, vai ter que travar o resto todo”, pregou.
Para o economista José Luís Oreiro, professor do Departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), é muito difícil que Bolsonaro não renove o estado de calamidade pública e estenda o auxílio emergencial. “Isso daria um desafogo. A realidade vai se impor. Sem algum tipo de renda provisória emergencial, que cubra alguns meses até que uma proporção significativa da população esteja vacinada, vai ser um caos social”, alertou. “Renovando o estado de calamidade pública até junho, o governo estaria desobrigado de cumprir regras fiscais e teria dinheiro para reimplantar o auxílio, mantendo o compromisso com o teto de gastos.”
O economista Roberto Ellery, também da UnB, acrescentou que o governo tem poucas saídas. “Ele precisa repensar programas sociais como um todo. Talvez, seja o caminho, mas tem de ver de onde vai sair o dinheiro”, afirmou.