Única mulher entre os nove candidatos à presidência da Câmara dos Deputados, Luiza Erundina foi escolhida pelo PSol, após o partido ser o único da oposição a não fechar acordo com o bloco do também candidato Baleia Rossi (MDB-SP). A parlamentar, de 84 anos, chega na disputa apenas dois meses depois de ter concorrido como vice-prefeita na chapa de Guilherme Boulos à prefeitura de São Paulo.
Em entrevista ao Correio, a parlamentar destaca que vem sofrendo pressão de diversas lideranças partidárias para que abra mão de sua candidatura, no entanto, ela descarta essa possibilidade. Na sexta-feira, Erundina criticou o partido no Twitter ao reclamar de supostas negociações da sigla com outras legendas: “É lamentável que o PSol negocie suas convicções e compromissos políticos históricos ao aderir ao fisiologismo e à barganha por cargos na Mesa da Câmara. Essa é uma prática dos partidos de direita com a qual eu não compactuo”.
O PSol foi o único partido da oposição que não aceitou embarcar na candidatura de Baleia Rossi. A senhora concorda com esse posicionamento da esquerda e qual o objetivo da sua candidatura?
Eu aceitei esse convite com muita honra. O PSol tentou um acordo com os diversos partidos da oposição, para que nós tivéssemos uma candidatura própria e de forte oposição ao governo Bolsonaro. Não precisava ser o meu nome, mas, infelizmente, não chegamos a um acordo, pois eles entenderam que a melhor opção para derrotar o candidato do Bolsonaro era apoiar o Baleia no primeiro turno. Respeito. Mas acredito que nossa candidatura abre discurso para debatermos com a sociedade e com esse espaço vamos poder apresentar nossas ideias. É assim que se faz política.
A senhora faz várias críticas ao governo, mas de certa forma aCâmara não influencia nas
pautas do Executivo?
Totalmente. A Câmara tem o poder de segurar um governo. Nos últimos anos, o presidente (Michel) Temer tinha popularidade baixíssima, mas tinha o apoio da maioria da Câmara e do presidente Rodrigo Maia. Então, ele conseguiu sobreviver. O mesmo ocorre agora com o presidente Bolsonaro. Não tem como culparmos apenas o Temer ou o Bolsonaro; o Maia e a Câmara também são culpados.
Em um eventual segundo turno entre os dois principais candidatos, Baleia Rossi (MDB-SP) e Arthur Lira (PP-AL), o PSol irá se juntar aos demais partidos da oposição na candidatura do Baleia?
Estou sofrendo muita pressão, nos últimos dias, para que eu abra mão da minha candidatura, mas isso eu garanto que não irei fazer. Vamos até o final. Eu respeito à decisão dos companheiros, mas também entendo que um partido como o PSol nasceu para fazer aquilo que acredita. Em um eventual segundo turno, nós iremos votar no Baleia, pois é a opção contra o candidato do Bolsonaro. Sabemos que ele não é a melhor opção, mas, como foi colocado como o contraponto ao bolsonarismo, é nele que iremos votar.
Na Câmara, o PT embarcou na candidatura do Baleia justamente pelo discurso de ser contraponto ao candidato do Bolsonaro. No entanto, no Senado, o PT está apoiando Rodrigo Pacheco (DEM-MG). A senhora ver alguma incoerência?
Vemos lá uma composição de companheiros e companheiras que, na prática, são de esquerda. Acredito que essa posição não seja a melhor, mas eu respeito às convicções das pessoas. Eu acho um equívoco dos companheiros que acham que com aquele candidato vão salvar a pátria. Não vão. Não vão derrotar o Bolsonaro elegendo um candidato ou outro. O que vai derrotar o Bolsonaro são as ruas, as pessoas ocupando as ruas e batendo panela. É isso que derruba governo.
Todos os demais candidatos afirmam que a solução para o Brasil são as reformas que estão paradas no Congresso, como a tributária, a administrativa e outras. Como a senhora vê essa discussão?
Se a gente chegar lá na presidência, vamos tirar de pauta essas matérias para pensarmos de outra forma. Quando eles falam de reforma tributária, não é para tributar grandes fortunas, não é para combater a sonegação de impostos, não é para tirar dos ricos e diminuir os tributos dos pobres. Se for para isso que eles querem reforma tributária, aí, sim. Sabemos que não é para isso, eles querem é diminuir o tamanho e a força do Estado. A gente precisa de uma reforma tributária que faça justiça fiscal, que tire mais do rico e menos do pobre. Nenhum deles toca nesses assuntos. Portanto, essas reformas que estão pautadas nos termos que o Paulo Guedes (ministro da Economia) quer e que a direita quer, não servem para o nosso povo. Por isso, precisamos tirar de pauta. A reforma administrativa deles é para demitir servidor público, já que eles têm ódio de servidor público. Eles querem privatizar e terceirizar tudo. Passar a saúde e a educação para a iniciativa privada. É isso que eles querem.
O presidente Bolsonaro defende a adoção do voto impresso no Brasil, pois não confia no sistema eletrônico das urnas brasileiras. A senhora acha necessário que haja mudanças no sistema de apuração dos votos no Brasil?
Isso é um pretexto que ele (Bolsonaro) está criando para criar dúvidas na população brasileira. Ele vem com esse discurso desde que não ganhou no primeiro turno das eleições presidenciais. Isso é um absurdo. O pretexto dele é dizer que, se ele não chegar em 2022 como candidato ou sair antes, será por conta do sistema eleitoral. É simples colocar no método, sabemos que não é por aí. Ele usa tudo para justificar os crimes dele. Ele não assume como responsável pelos crimes, pelas mortes, pelos 14 milhões de desempregados, ele não quer se sentir o responsável por tudo isso. O nosso sistema eleitoral é celebrado no mundo todo.
O partido da senhora protocolou um projeto na Câmara para acabar com o voto secreto nas eleições para a Mesa Diretora do Congresso. Qual a intenção dessa proposta?
A gente pode surpreender-se em alguns momentos, mas sabemos que é muito remota a aprovação de uma proposta dessas, mas nós temos que apresentar. É inaceitável o que eles fazem durante essas eleições. O PSol tem que cutucar e tem autoridade para isso. Somos um partido pequeno e com ideologia. Viemos para isso, não temos outra função. Estamos aí para tentar mudar as coisas, mesmo que não haja força neste momento. Mais cedo ou mais tarde essa militância política vinga. As sementes políticas que eu plantei vingaram, pois elas tinham sentido.