O presidente do Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), desembargador Claudio de Mello Tavares, suspendeu o depoimento que o governador afastado Wilson Witzel prestaria nesta segunda-feira (28/12) ao Tribunal Especial Misto (TEM), no qual o político responde a processo de impeachment. O magistrado tomou a decisão em cumprimento ao despacho do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal (STF), que determinou a suspensão do depoimento Witzel.
A decisão de Moraes foi tomada no sábado, a pedido da defesa do governador afastado. O ministro determinou que o interrogatório de Witzel só poderá ser realizado após a defesa ter acesso a todos os documentos remetidos pelo Superior do Tribunal de Justiça (STJ) e que incluem a delação premiada do ex-secretário de Saúde do estado Edmar Santos. O ministro do Supremo também ordenou que um novo depoimento de Edmar seja tomado. Com a decisão, o processo, previsto para terminar em meados de janeiro, poderá se estender.
O depoimento de Witzel nesta segunda-feia seria realizado depois de o TEM - composto por cinco deputados estaduais e cinco desembargadores - ouvir seis testemunhas e marcaria o fim da fase de instrução processual do processo de impeachment.
O desembargador Mello Tavares disse, na abertura da sessão do tribunal misto, que prosseguirá ouvindo testemunhas, como a ex-subsecretária de Saúde Mariana Scárdua. O magistrado ressaltou que o depoimento do ex-secretário Edmar Santos, que ficou calado na sessão do dia 17 de dezembro por estar finalizando delação premiada, foi pedido pela própria defesa.
"Ao arrolar a testemunha, sabia, tanto a defesa como a acusação, que sua participação seria restrita às perguntas que não guardassem relação com a colaboração premiada", disse o presidente do TJ-RJ.
Demonstrando contrariedade com a atuação da defesa de Witzel, o desembargador lembrou uma frase de Rui Barbosa, de que a "justiça tardia nada mais é que injustiça institucionalizada".
"Por este motivo esse tribunal sempre se pautou pela retidão e cumprimento irrestrito dos preceitos fundamentais, entre eles o contraditório, a ampla defesa, mas também a duração razoável do processo", declarou o desembargador.
Já o deputado estadual Luiz Paulo (Cidadania), autor do pedido de impeachment contra Witzel, entrou com dois recursos no STF para reverter a decisão do ministro Alexandre de Moraes.
Com a suspensão do depoimento do governador afastado, o TEM se dedicou a ouvir as seguintes testemunhas: o ex-assessor especial da subsecretaria de gestão da Atenção Integral à Saúde, Luiz Octávio Martins Mendonça; a ex-subsecretária da área, Mariana Scardua; e os ex-secretários estaduais de Saúde Alex Bousquet e de Defesa Civil, Roberto Robadey.
Luiz Octávio Martins Mendonça, que ficou no cargo do início de 2019 até abril de 2020, afirmou que a chegada de Gabriell Neves à Subsecretaria-Executiva de Saúde, em fevereiro deste ano, causou uma "desorganização completa" na área. O depoente disse que, a partir da posse de Neves no segundo cargo mais importante na Saúde do estado, a área técnica deixou de ser ouvida antes da tomada de decisões.
"A situação foi ficando muito critica com atraso de pagamento de salário, de fornecedores, uma desorganização completa na estrutura gerencial da secretaria", contou Luiz Octávio Martins Mendonça. Ele detalhou que os técnicos passaram a não ser consultados nos processos de contratações de Organizações Sociais e de compras, entre outros.
Conforme a testemunha, a área técnica não foi consultada nem na decisão pela construção dos hospitais de campanha, no início da pandemia da covid-19.
Gabriell Neves, que responde a processo sobre desvios de recursos na Saúde, evitou, durante depoimento ao tribunal misto em 17 de dezembro, responder à maior parte das perguntas. Segundo disse na ocasião, os contratos firmados pela Saúde durante a pandemia eram de conhecimento do gabinete de crise, do qual Witzel participava. A defesa do governador afastado nega que o político tenha tido participação nas contratações emergenciais.
Já a médica Mariana Scardua, ex-subsecretária de Atenção Integral à Saúde do Rio, afirmou, em depoimento nesta segunda-feira, que os técnicos da Saúde estadual não foram consultados sobre as contratações realizadas em março, no início da pandemia. Ela acrescentou ter ficado sabendo pela imprensa da contratação da Organização Social Iabas para a construção de sete hospitais de campanha.
"Não fui consultada em momento algum sobre nenhum processo de contratação, desde medicamento, UTI, até organizações sociais e hospitais de campanha, que inclusive não estavam nos planos da SES para a primeira, segunda e terceira etapas, apenas na quarta etapa", assegurou Mariana Scardua.
Segundo ela, as contratações começaram a ser feitas à revelia da área técnica a partir da nomeação de Gabriell Neves para a Subsecretaria-Executiva da pasta, em fevereiro. A médica também disse ter alertado o então secretário Edmar Santos sobre o risco de contratação da organização, mas acabou exonerada.
"Quando eu fiquei sabendo pela mídia e depois no gabinete de crise que os hospitais de campanha estavam sendo realizados pelo Iabas, eu fui ao secretário e avisei que o Iabas tinha um histórico de não entregar o que promete", relatou Mariana. "E, quando eu faço um novo alerta sobre o Iabas ao secretário à época, no dia 2 de abril eu fui comunicada pelo subsecretário geral que eu estaria exonerada no dia seguinte, 3 de abril", detalhou a médica.
Ela negou ter sido indicada politicamente, e afirmou que foi apresentada à então equipe de transição de governo, no final de 2018, por Ramon de Paula Neves, então assessor de Wilson Witzel, com quem tinha amigos em comum.