Uma das mais acirradas disputas por prefeitura entre as capitais brasileiras terminou com vitória do deputado federal João Campos (PSB) em Recife, com 56,27% dos votos. O resultado surpreendeu por ir de encontro às apurações do primeiro turno e às primeiras pesquisas do segundo, que apontavam preferência à também deputada federal e prima de Campos, Marília Arraes (PT).
Aos 27 anos recém-completados, o filho de Eduardo Campos — ex-governador de Pernambuco e candidato à Presidência morto em acidente aéreo durante campanha eleitoral de 2014 — é o prefeito mais jovem a assumir a liderança da capital pernambucana e também o mais novo entre os eleitos à prefeitura de uma capital brasileira. Em discurso de agradecimento, João prestou homenagens ao pai. “Não tem como vir aqui, hoje, celebrar essa vitória, e não fazer uma homenagem, lembrar, daquele que é referência da minha vida na política, como pessoa, como cidadão, que é o meu pai, Eduardo Campos”.
Ao se inspirar na trajetória do pai, João arrancou lágrimas da mãe, Renata Campos, em um discurso emocionado. “Meu pai me disse uma vez: sempre que puder ajudar uma pessoa, faça sem esperar nada em troca. E sempre que fizer alguma coisa na vida, faça bem-feito. É assim que vamos governar Recife”, completou.
Pelas redes sociais, o prefeito eleito aproveitou para agradecer o eleitorado. “Muito obrigado, Recife. Que caminhada incrível. A felicidade é muito grande por aqui, estamos juntos pelos nossos sonhos. O futuro começa agora”, escreveu. Ao lado de Campos, comemoraram o resultado a vice-prefeita eleita, Isabella de Roldão (PDT); o atual governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB); e a deputada federal Tabata Amaral (PDT-SP), namorada do prefeito.
Rixas
A disputa política e familiar foi marcada por acusações, interferência judiciais e grande rixas partidárias. Até as últimas pesquisas, os dois candidatos apareciam com empate técnico, acentuando ainda mais o tom agressivo para angariar vantagens na reta final para o segundo turno das eleições municipais.
Ainda na manhã das votações, o Partido dos Trabalhadores apostava em Marília Arraes para conquistar, pelo menos, uma capital brasileira, contando com pesquisas internas que apontavam vitória da petista. As expectativas foram frustradas, com diferença de 13 pontos percentuais, cerca de 100 mil votos de vantagem para Campos.
Entre os elementos apontados como cruciais para a reviravolta nos resultados foi o apoio do voto evangélico ao pessebista. Em ofensiva à prima, iniciou-se uma distribuição de material gráfico afirmando ter sido Arraes a responsável por tirar a Bíblia da Câmara Municipal quando ela foi vereadora e a associando com temas como ideologia de gênero, aborto e legalização de drogas, para angariar votos. A divulgação foi barrada pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
A campanha da petista também perdeu espaço com o surgimento de denúncias sobre contratos de funcionários fantasmas quando Arraes era vereadora. Uma fala do deputado Túlio Gadêlha (PDT-PE), divulgada pela revista Veja, foi a cartada final para desmoralizar a candidata. Em um áudio, o parlamentar sugere intenção da petista em montar caixa de campanha com salário de assessores. Gadêlha rebateu dizendo que a fala foi tirada de contexto, enquanto Marília disse não ter cometido crime.
A guerra entre os candidatos também foi marcada por desavenças familiares. Ex-pessebista, Arraes deixou o partido após ser preterida pelo primo Eduardo Campos na disputa por uma vaga na Câmara, em 2014. Quatro anos mais tarde, pelo PT, foi eleita deputada federal, enquanto o primo, João, também conquistou uma cadeira pelo PSB. O encontro de interesses no Executivo foi novamente chacoalhado neste 2020, com direito a pedidos da conselheira do Tribunal de Contas da União Ana Arraes, avó paterna de João e tia de Marília, por respeito às memórias de Miguel Arraes, ex-governador do estado, e de Eduardo Campos.
Após a caminhada marcada por intensa disputa partidária e familiar, João Campos amenizou a richa, em discurso unificador de vitória. “Meu coração, hoje, só tem dois sentimentos: gratidão e esperança. Quero agradecer aqueles que votaram em mim, mas, aqui, eu também quero agradecer a todos os recifenses porque, a partir de agora, fomos eleitos para ser o prefeito de todos os recifenses. Nós governaremos para todos”, destacou.
A vitória garante mais quatro anos de liderança do PSB na capital pernambucana, que já tem hegemonia há oito e cuja perpetuação partidária foi uma das principais fragilidades que quase conduziram Arraes à prefeitura. Com a derrota, o PT não comanda nenhuma capital brasileira e perde força em todos os principais colégios eleitorais.