Poder

Mourão nega racismo no país

No Dia da Consciência Negra, vice-presidente afirma que não há discriminação racial no Brasil. General diz que assassinato de homem negro em Porto Alegre não configura preconceito. Bolsonaro mantém silêncio sobre crime

O vice-presidente Hamilton Mourão lamentou a morte de João Alberto Silveira Freitas, espancado até a morte por dois homens brancos em um supermercado da rede Carrefour, em Porto Alegre (leia mais na página 4 ). Apesar de a vítima ser negra, o general enfatizou que não existe racismo no Brasil.

“Lamentável, né? Lamentável isso aí. A princípio, é segurança totalmente despreparada para a atividade que ele tem de fazer”, afirmou. “Para mim, no Brasil, não existe racismo. Isso é uma coisa que querem importar aqui para o Brasil. Isso não existe aqui.”

Um dos jornalistas que entrevistavam o vice repetiu a pergunta sobre a existência de racismo no país. O general disparou: “Não, eu digo para você, com toda a tranquilidade: não tem racismo aqui”. “Eu digo para vocês o seguinte, porque eu morei nos Estados Unidos: racismo, tem lá. Eu morei dois anos nos Estados Unidos e, na escola em que eu morei lá, o ‘pessoal de cor’ andava separado, (o) que eu nunca tinha visto aqui no Brasil. Saí do Brasil, fui morar lá, era adolescente e fiquei impressionado com isso aí. Isso, no final da década 60”, emendou.

De acordo com ele, nos Estados Unidos, “o ‘pessoal de cor’ sentava atrás do ônibus, não sentava na frente do ônibus”. “Isso é racismo, aqui não existe isso. Aqui, você pode pegar e dizer o seguinte: existe desigualdade. Isso é uma coisa que existe no nosso país. Temos brutal desigualdade, fruto de uma série de problemas, e grande parte das pessoas de nível mais pobre, que tem menos acesso aos bens, às necessidades da sociedade modernas, são ‘gente de cor’, apesar de sermos gente totalmente misturada.”

Presidente
O presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, não se manifestou sobre a morte de João Alberto Silveira Freitas. Ontem, Dia da Consciência Negra, o chefe do Executivo postou, logo cedo, nas redes sociais, uma foto em que Pelé o homenageia com uma camisa autografada do Santos. “Obrigado, Pelé. Bom dia a todos”, escreveu o mandatário. Na camiseta, o atleta do século autografou: “Ao presidente Bolsonaro, com abraço, Edson Pelé”. Na mesma postagem, internautas cobraram manifestação do chefe do Planalto sobre a morte de João Alberto.

Em 2017, durante um evento no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, Bolsonaro atacou a população quilombola. “Fui num quilombola em Eldorado Paulista. Olha, o afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada. Eu acho que nem para procriador ele serve mais”, afirmou, na ocasião. Acusado de racismo, pela declaração, o presidente foi inocentado. Ele, então, voltou à carga, em conversa com apoiadores, em março deste ano. Um simpatizante disse: “Bolsonaro, sou negão, votei em você e, em 2022, vou votar de novo. Você é o melhor presidente do Brasil”. O chefe do Executivo respondeu: “E você está com oito arrobas”.

Para Júlio César Santos, diretor do Instituto Luiz Gama — associação sem fins lucrativos que atua na defesa dos direitos humanos, dos negros e das minorias —, o silêncio de Bolsonaro não surpreende as entidades sociais e negras. “Ele tem visão negacionista para os problemas do Brasil e do mundo. É só observar na questão da pandemia, do processo histórico da escravidão, também com a questão da ditadura. Todos os problemas da sociedade, nega. Tudo aquilo que são problemas nacionais, que dependem de Estado forte, ele tem esse olhar”, frisou.

Gama ressaltou, ainda, o desmonte nas políticas públicas para negros, principalmente na Fundação Palmares. “Através de um de seus representantes, Bolsonaro faz esvaziamento de todas as políticas que versam a igualdade de oportunidades, ao movimento negro. Não há estranhamento por ele não se posicionar. Em nenhum momento, em sua trajetória política, demonstrou simpatia a pautas identitária, negras, orientação sexual”, destacou.

Camargo é denunciado ao MP
Líderes de mais de 50 instituições ligadas ao movimento negro foram, ontem, ao Ministério Público contra o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo. O grupo entregou uma representação por improbidade administrativa à Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão. No documento, divulgado pelo Congresso em Foco, as entidades ressaltam que Camargo “vem desafiando os limites da ordem jurídica e o real compromisso do Estado Brasileiro com a promoção da igualdade racial”. Os representantes questionam a falta de uso de verba da fundação. De acordo com o documento, até setembro deste ano, a pasta usou 47,52% do dinheiro destinado à fundação, a menor porcentagem desde 2012. Camargo, que é negro, também nega a existência de racismo no país. Em postagem, ontem, ironizou o Dia da Consciência Negra: “A partir de amanhã (hoje), os negros do Brasil perdem a consciência”.

Bolsonaro no Amapá
O presidente Jair Bolsonaro, enfim, visitará o Amapá. A viagem, hoje, foi um convite feito pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), na quinta-feira. Na ocasião, o parlamentar cobrou do chefe do Executivo medidas para solucionar o apagão que assola o estado há quase três semanas. A expectativa é de que o mandatário visite a subestação de energia de Santana, às 15h30. Já às 17h, a previsão é de que faça um pronunciamento oficial, no Aeroporto Internacional de Macapá.

TSE: português assume ataque
Desde o dia das eleições, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) suspeita que o principal ataque contra o sistema de informática da Corte partiu de Portugal. Informações iniciais colhidas pela Polícia Federal apontam para esse caminho. As suspeitas foram reforçadas após um morador do país europeu ter assumido autoria da investida criminosa contra o pleito municipal deste ano. As diligências continuam, no âmbito da PF e da Procuradoria-Geral da República (PGR). O jornal Estado de S. Paulo informou que o homem que se identificou como o articulador do ataque disse ter usado um celular na investida. As investigações apontam que ele teria ligação com grupos ideológicos e extremistas do Brasil.