O presidente Jair Bolsonaro mantém a postura de ataque a países que, segundo ele, importam madeira ilegal do Brasil, mas acusam seu governo de permitir o desmatamento da Amazônia. O chefe do Executivo prometeu divulgar, hoje, na live que faz todas as quintas-feiras, o nome das nações que comprariam o produto de forma irregular. Na terça-feira, durante a cúpula do Brics (bloco que reúne Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul), ele já tinha mencionado que divulgaria a lista. “Estaremos mostrando que esses países, alguns deles que muito nos critica, em parte, têm responsabilidade nessa questão”, afirmou, na ocasião.
Bolsonaro acusa outros países, mas não trata do desmonte que ocorre no Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) nem sobre as flexibilizações nas normas ambientais. Em março, o órgão revogou uma norma que previa a fiscalização nos portos onde madeiras são embarcadas para as nações compradoras.
Na época da decisão, madeireiros do Centro das Indústrias do Pará (CIP) parabenizaram o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, com uma “nota de agradecimento”, por ter liberado a exportação de madeira de origem nativa, sem a necessidade de autorização específica. Com o fim das inspeções dos portos, os produtos florestais passaram a ser apenas acompanhados de um documento de origem florestal (DOF). Esse DOF de exportação, que existe desde 2006, serve, na prática, apenas para que a madeira seja levada até o porto, enquanto a instrução normativa previa autorização para a exportação em si.
Na avaliação de Alessandro Azzoni — diretor da Comissão de Direito Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil/SP —, falta comunicação, por parte do Executivo federal, com outros países para tratar da Amazônia, mas o discurso do presidente serviu para garantir a soberania do país. “Acredito que o presidente e o ministro Salles (Ricardo Salles, do Meio Ambiente) acabam inflamando o discurso e não mostram o trabalho que é feito. Mas a lista dos países serviu para dar uma resposta aos países que colocam o dedo na nossa cara e questionam a soberania da Amazônia”, ressaltou.
Para Suely Vaz de Araújo, ex-presidente do Ibama, a mudança recente na fiscalização dos portos pode alimentar a ilegalidade das exportações. Com a ausência de verificação, é impossível fazer estimativas desse mercado clandestino, conforme ressaltou. “Sem essa etapa específica, a fiscalização acaba ficando mais fraca. A partir do momento em que a madeira chega ao porto, pode ter qualquer origem, e todas as fases anteriores podem ter sido adulteradas”, argumentou. “Infelizmente, o Ibama vive, hoje, um desmonte, e a política ambiental está cada vez mais enfraquecida.”
Ação na Justiça
Em junho, o Instituto Socioambiental (ISA), a Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) e o Greenpeace Brasil entraram com uma ação na Justiça de Manaus para pedir a revogação da decisão do Ibama. A Justiça indeferiu a liminar. As ONGs, então, entraram com recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª Região e aguardam apreciação.
“Atualmente, não existe nenhuma verificação das informações que são repassadas na hora do embarque dessas madeiras. O que vimos foi um abandona completo das fiscalizações e do trabalho preventivo do Ibama”, afirmou Maurício Guetta, consultor jurídico do ISA.
Porta-voz da campanha de Amazônia do Greenpeace, Rômulo Batista afirmou que, quando o governo tira do Ibama o poder de fiscalizar a exportação, “joga em favor do crime”. “Bolsonaro fala como se jogasse no time que atua contra a exploração de madeira ilegal da Amazônia, quando, na verdade, seu governo atua em prol da facilitação desse tipo de atividade, ao inviabilizar instrumentos de fiscalização desses produtos”, criticou. “Se o governo sabe quem compra, é possível rastrear a cadeia até chegar em quem vende. Além de expor quem compra, o que o presidente precisa fazer é expor e punir quem extrai madeira ilegal da floresta e a vende.”
Em nota, o Ibama negou as acusações de que tenha havido flexibilização dos certificados para exportação de madeiras. O órgão alegou que o ato Normativo nº 15/2011 — que foi revogado — baseava-se na apresentação documental e tinha uma fiscalização física amostral (nem todas as cargas eram vistoriadas) e aleatória.
“O procedimento atual requer a apresentação da mesma documentação de outrora, mas, agora, de forma eletrônica. A fiscalização, que antes era aleatória, agora conta com critérios de inteligência e análise risco (quem vende, quem compra, antecedentes do exportador, espécie da madeira, destino etc), permitindo, assim, um monitoramento em tempo real desde a origem da madeira até o seu destino final, inclusive com fiscalizações in loco”, informou.