“A princípio, (Joe) Biden tem muita chance de ganhar e (Donald) Trump tem muita chance de não reconhecer. Então, o processo vai se prolongar. E isso pode ter repercussão no Brasil futuramente”. É o que diz o cientista político e professor da Universidade de Brasília (UNB) Lúcio Rennó. Ele e Creomar de Souza, fundador da consultoria política Dharma, avaliaram, nesta quarta (4/11) , no CB.Poder, como a eleição americana pode impactar diretamente os planos de reeleição do presidente Jair Bolsonaro. A entrevista desta edição do CB.Poder — uma parceria do Correio Braziliense com a TV Brasília — foi conduzida pelo editor de Política do Correio, Carlos Alexandre epode ser conferida nas redes sociais do Correio.
Para Rennó, uma vitória do democrata Biden, candidato à presidência dos Estados Unidos, pode enfraquecer o governo Bolsonaro na medida em que as políticas internacionais em relação ao Brasil forem afetadas. “A vitória de Biden pode ter efeitos no público interno e fortalecer os grupos que confrontam Bolsonaro, como os que discutem a área do meio ambiente e dos direitos humanos. Isso pode levar, ainda, o presidente a perder aliados”, ressaltou o especialista.
No entanto, embora o pensamento de Biden e o de Bolsonaro sejam divergentes, Rennó pontuou que “quando se está fazendo um negócio não se pensa em ideologia, mas em lucro”, e esse seria um fator para fazer Bolsonaro não adotar uma postura totalmente anti-Biden.
Além desse fator, o questionamento eleitoral por parte de Donald Trump pode fortalecer o discurso de Bolsonaro que, durante período eleitoral também criticou o sistema de urnas brasileiro. “Bolsonaro já vinha criticando nosso sistema eleitoral, e seus apoiadores adotam essa postura também. Esse é um elemento preocupante, pois há uma deslegitimação das eleições no Brasil por conta desses questionamentos e da impossibilidade de recontagem. Isso será fortalecido, caso a judicialização das eleições norte-americanas aconteçam”, explicou.
Segundo Creomar de Souza, o ideal seria que Trump ou Biden vencessem as eleições com uma vantagem folgada no colégio eleitoral, pois um resultado apertado causará o prolongamento das eleições americanas. Ainda sobre o prejuízo de uma reeleição de Bolsonaro caso Trump perca, Souza afirma que o presidente do Brasil perderia o seu referencial. “Bolsonaro aproveitou a onda que fez o Trump ganhar a eleição. Ele pega parte do discurso de Donald Trump e ainda tem a cooperação técnica da equipe que trabalhou com Trump durante o período eleitoral. Então, imagine se ele tem essa grande referência e, de repente, essa referência é derrotada. Isso acende um sinal de alerta do ponto de vista de dinâmica eleitoral”.
Sistema eleitoral americano
Creomar de Souza explicou que o sistema americano segue o modelo de voto impresso, em primeiro lugar, porque a Constituição do país nunca foi alterada e, em segundo, devido ao medo dos norte-americanos de mexerem na tradição eleitoral do país. “A Constituição americana foi construída para gerar equilíbrio entre os 13 estados independentes que, em coalizão, se libertaram do domínio inglês. Ou seja, os EUA não nascem como um estado unitário, mas como uma coalizão de estados que a princípio eram 13, mas hoje são 50”, esclareceu.
O especialista observou que todo sistema democrático apresenta dificuldades e desafios. E disse que o motivo de os EUA, com tanta tecnologia, adotarem a votação em papel, é o medo de alterar o sistema. “Nos EUA, a sociedade tem o consenso de que esse modelo funcionou tão bem até aqui que não precisa mudar nada, porque uma alteração pode colocar o sistema em risco. Além disso, o elemento da crença é muito importante para a democracia”.
Para Lúcio Rennó, o modelo de colégio eleitoral americano sobrevive porque, quanto mais tempo uma instituição fica em funcionamento, mais difícil é alterá-la. “Os americanos vão ficando resilientes à mudança. Uma alteração do colégio eleitoral, agora, poderia resultar em uma vitória infinita dos democratas, porque os democratas têm o voto popular e o da população mais progressista dos EUA. E os republicanos, por sua vez, ganham nas áreas menos populosas, rurais e do interior do país. Além disso, tem uma questão mais demográfica ligada a isso, que envolve cor da pele, raça, gênero, etnia, renda e nível educacional”, ressaltou.
*Estagiário sob a supervisão de Andreia Castro
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