Ao retornar ontem do feriado em Guarujá, na cidade paulista, o presidente Jair Bolsonaro volta as atenções para o cenário eleitoral norte-americano. Segundo interlocutores palacianos, o chefe do Executivo acompanhará o desenrolar do resultado das eleições americanas na noite desta terça-feira (03/11) do Palácio do Alvorada. Auxiliares se preparam para dar assistência a Bolsonaro durante a madrugada. O presidente deverá acompanhar a contagem junto com o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo e demais aliados.
O chefe do Executivo não esconde a ansiedade em ver seu “amigo” e candidato preferido, Donald Trump, ser reeleito, em detrimento do democrata, Joe Biden. Caso Trump vença, Bolsonaro já avisou que quer ser “o primeiro a dar os parabéns”.
No último dia 20, Bolsonaro disse que espera comparecer à posse de Trump, reeleito. "Com toda certeza, espero, se essa for a vontade Deus, comparecer à posse do presidente brevemente reeleito nos EUA. Não preciso esconder isso, é do coração, não interfiro, mas do coração e pelo respeito que tenho ao povo americano e pelo trabalho e pela consideração que Donald Trump teve conosco, é que me manifesto dessa maneira neste momento", declarou.
No entanto, especialistas avaliam que o chefe do Executivo deveria mostrar mais cautela. A média das pesquisas nacionais nos Estados Unidos mostra Biden com vantagem sobre Trump.
Caso Biden ganhe, a Amazônia e o Pantanal devem ganhar mais importância para os Estados Unidos. O candidato democrata já criticou a política ambiental brasileira e avisou que colocará o tratamento ao meio ambiente sob uma lupa. Em declarações recentes, Biden reforçou que pretende “reunir o mundo” caso o país não seja eficiente em defender a Amazônia.
O cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que Bolsonaro rompeu a tradição de manter um distanciamento salutar com os EUA e se alinhou ao governo Trump, especialmente por questões ideológicas. Prando defende que caso Trump seja reeleito, o bolsonarismo sofrerá impacto.
“Presidentes não têm amigos, têm interesses. Se Trump for derrotado, será um impacto na própria trajetória de Bolsonaro. Se Biden for vitorioso, o que vai mudar é o tom com o qual Biden vai ser relacionar com o Brasil. Biden coloca como atenção especial a falta de política ambiental do governo brasiliero. Ele vai ficar mais atento, assim como outras organizações internacionais em relação ao que ocorre na Amazônia e o Pantanal”, ressalta.
Política interna
Na análise do especialista, Bolsonaro introduz no plano internacional questões ligadas à política interna. “Ele faz uma mistura de amigos, família e política. As questões do Estado devem ser guiadas por lógica impessoal, e o governo está distante desses princípios. Tem retórica de confrontar China e favorecer os EUA, mas na prática, não se sustenta em uma realidade em que dependemos de ambos”.
Ele aponta também que Biden sofrerá ataques da base bolsonarista ideológica, mas que sua eleição fortalecerá o discurso da oposição política brasileira contra Bolsonaro. “Vão colocar Biden na lista de comunistas. Todos os democratas desejam uma vitória de Biden. Uma derrota do Trump vai arejar o mundo e fortalecer o discurso antibolsonarista no Brasil, demonstrando que, se Trump for derrotado, Bolsonaro também pode sê-lo em 2022”, acredita Rodrigo Prando.
O especialista afirma que, em caso de vitória de Biden, o presidente brasileiro seria obrigado a rever a relação com a Casa Branca, com uma reestruturação dentro do Ministério das Relações Exteriores. “O problema é que, para ter saída diplomática, precisa ter diplomatas. E o bolsonarismo fez terra arrasada na diplomacia brasileira, que, historicamente sempre teve bom trânsito internacional. Se tiver que pensar numa saída, o governo precisa reestruturar o MRE, o que significa tirar poderes do chanceler Ernesto Araújo, que é muito mais ideológico do que pragmático”, argumenta Prando.
Para Marco Antonio de Meneses Silva, coordenador de Relações Internacionais do Centro Universitário IESB, em um cenário com Biden vencedor, as relações comerciais não sofreriam mudanças. Porém, Bolsonaro teria que adotar um tom mais ameno, pois o novo presidente norte-americano estará propenso a exercer pressão maior sobre o Brasil na área ambiental.
“A depender de como será a composição da equipe de Biden, isso acaba sendo fator que influencia esse ajuste e moderação por parte de Bolsonaro. O Ministério das Relações terá que fazer reajuste de política autônoma em relação à subserviente que vinha implantando. A expectativa está deixando todo mundo apreensivo. Será um duro golpe na ala ideológica do governo e também para os filhos do presidente, que vem demonstrando apoio incondicioanal a Trump”, aposta o acadêmico.