O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), recebeu o ministro do Superior Tribunal de Justiça Nefi Cordeiro para discutir o anteprojeto de lei que regulará a gestão e o uso de dados pessoais dos brasileiros, como uso de tecnologias de reconhecimento facial e outras. Nefi preside uma comissão de especialistas que trata do tema. O próximo passo é entregar a pesquisa a parlamentares para que se possa dar início à tramitação de um projeto de lei. Segundo Maia, a intenção é que um futuro PL seja votado entre fevereiro e março do próximo ano.
Nefi Cordeiro explicou que a falta de uma legislação para regular como a segurança pública pode fazer uso de certos dados e tecnologias é uma lacuna para o país, bem como a falta de um órgão independente que possa reunir e gerir essas informações. Isso, segundo o ministro, gera impedimentos caso a polícia brasileira precise de dados armazenados no exterior.
“Não tínhamos nenhuma lei definindo o que poderia ser obtido como dado, como seria tratado, e essa comissão tentou, e acredito em um resultado muito técnico, elaborar definições de princípios e limites para que se tenha acesso a informação eletrônica, para que dados possam ser usados pelas polícias, agentes da segurança pública, setores de inteligência, em investigação e processos criminais”, explicou.
O ministro alertou que “conhecimento é poder” e, por isso, o Brasil precisa definir as políticas para acesso a esse poder, como já ocorre nos Estados Unidos e em países da Europa. “Tínhamos uma indefinição de como poder fazer acesso a dados de novas tecnologias, geolocalização, reconhecimento facial, e a proposta é que isso seja definido pela lei, e o Congresso é competente para definir em que situações se pode fazer uso de reconhecimento facial para processo criminal, em que situações se poderá fazer o compartilhamento de dados em novas hipóteses”, disse.
“A lei passa a ser o limite para acesso a dados. Fora dessas situações gerais, fica o juiz o responsável para definir, em cada caso concreto, sobre a possibilidade de acessos não previstos em lei”, completou. O ministro destacou a importância de regular o uso do reconhecimento facial que, lembrou, é uma tecnologia com “índice de eficiência controverso”. “E assim, vamos tendo outras novas tecnologias, como cavalos de troia em celulares de criminosos, compartilhamentos de dados para fiscalização de fronteiras. É necessário que a lei seja um fundamento primeiro, e isso é muito claro nessa proposta”, explicou.
Autoridade nacional
“Outro ponto importante é a necessidade de uma definição, pela Câmara, dessa autoridade nacional controladora de dados. O Brasil não consegue compartilhamento de dados com a Europa porque não há uma autoridade autônoma, independente, entre outras razões. Há proposta dessa definição. A Câmara fará todo o exame da ponderação de quem será a autoridade. Pensamos na CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O CNJ é autoridade autônoma e independente. Mas é uma proposta inicial”, afirmou.
Questionado sobre o risco de a regulamentação interferir no trabalho da imprensa, o ministro afirmou que isso não deve ocorrer. Destacou que, para a definição de um crime, é preciso um dolo de querer prejudicar alguém e que a atividade jornalística é prevista constitucionalmente. “Previmos como sugestão para a Câmara, um crime de tratamento, divulgação de dados, com a finalidade de prejudicar alguém. É preciso o dolo, o desejo não apenas de divulgar, mas de divulgar para prejudicar”, amenizou.
Independência do Executivo
Maia elogiou o trabalho do grupo e afirmou que o levantamento está pronto para ser entregue a líderes e começar a tramitar. Inicialmente, o texto será discutido em um grupo de trabalho, já que as comissões estão suspensas por conta da pandemia do novo coronavírus. “O trabalho está apresentado, um anteprojeto de lei será apresentado pelos próprios deputados, e vai se criar um encaminhamento de tramitação, que não necessariamente precisa ser votado até dezembro, afirmou o parlamentar.
Para o presidente da Câmara, é importante que o órgão responsável não tenha vínculos com o Poder Executivo. “O importante é que a gente está avançando, inclusive, em termos nos quais eu concordo com o grupo, em uma recomendação, pelo menos, por exemplo, em relação à autoridade. Tentamos que fosse independente do Executivo. O presidente Michel (Temer) mandou uma medida provisória com ela vinculada ao governo, que não é o melhor caminho. Não pode nenhum governo ser dono dos dados da sociedade. Os dados são poder, e esse poder não pode ser do governo que está administrando o Brasil em um determinado momento”, ressaltou.
“Talvez, esse seja o encaminhamento. Tem uma PEC do (senador) Eduardo Gomes (MDB-TO) que está pronta para votar na Câmara, que vai nessa linha. Mas vamos ter que fazer esse debate. Um órgão responsável vinculada ao governo dá problemas na troca de informação com outros países, e também não é bom. Não estou criticando esse governo. Não foi desse governo a ideia de vinculação. Não é bom que ninguém tenha o poder tão grande sobre dados, que hoje é o principal instrumento de qualquer democracia moderna”, explicou.
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