Kassio Nunes Marques foi empossado hoje (5/11) como novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) em uma cerimônia simples e curta, que durou menos de 20 minutos. O ministro assume a cadeira de Celso de Mello, que se aposentou no mês passado.
A solenidade foi restrita a poucas autoridades, como o presidente Jair Bolsonaro; os presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, Davi Alcolumbre (DEM-AP) e Rodrigo Maia (DEM-RJ); o procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras; os ministros Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Edson Fachin; o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz; e o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins.
Em um curta fala de boas vindas, o presidente do Supremo, Luiz Fux, afirmou: "Em nome da Corte, eu gostaria de desejar boas vindas a sua excelência, o ministro Nunes Marques. Que vossa excelência seja muito protegida nessa sua sobre missão, tendo em vista que vossa excelência preenche todos os requisitos para assumir a cadeira de ministro do Supremo Tribunal Federal. Vossa excelência tem reputação ilibada, notório saber jurídico, vossa excelência tem conhecimento enciclopédico, e acima de tudo independência olímpica".
Kassio Marques foi nomeado pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 22 de outubro. Antes da nomeação, ele passou por uma sabatina de quase 10 horas (mas longe de ser dura) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, onde foi aprovado por 22 votos a 5. Em seguida, o plenário da Casa Legislativa o aprovou ao cargo de ministro por 57 votos a 10.
Marques será o único ministro do Supremo com origem de um estado do Nordeste. No total, atuou 15 anos como advogado e 12 como juiz. Sua experiência prévia como advogado, tendo um olhar especial para a atuação da advocacia, fez com que a indicação tivesse apoio de defensores e entidades representativas.
Indicação gerou surpresa
A indicação de Marques pelo presidente Jair Bolsonaro gerou surpresa nos bastidores da mais alta Corte do país — pois muitos nunca tinha ouvido falar no nome do magistrado. A intenção de Nunes era trabalhar por uma vaga no STJ, e ele, de fato, não esperava que fosse escolhido para o STF. A primeira “audiência” foi marcada pelo senador Ciro Nogueira (PP), integrante do Centrão e que também é do Piauí.
Bolsonaro e Kassio se encontraram pelo menos duas vezes nos últimos dois meses, de maneira informal, fora do ambiente do Palácio do Planalto. Nos encontros, eles se identificaram, e o presidente gostou muito da personalidade e simplicidade do desembargador. A afinidade foi mútua.
Excesso de judicialização
Marques é fascinado pelo uso da inteligência artificial nos tribunais para acelerar o trâmite dos processos, reduzir a necessidade de arquivos físicos e aprimorar o trâmite jurídico. Ele costuma pensar em como elevar a produtividade pelos tribunais onde passa, visto que sabe que o Brasil enfrenta uma “epidemia” de processos, com a judicialização mesmo de questões simples, como discussões entre vizinhos e indisposições que ocorrem em conversas por meio da internet.
O novo ministro não tem origem abastada. Veio de família humilde, e ele mesmo abriu o caminho profissional após se formar em direito pela Universidade Federal do Piauí. Inaugurou um escritório com amigos, e ali começou a atuar na área de direito civil. Durante os anos de advocacia, o desembargador integrou a Comissão Nacional de Direito Eleitoral e Reforma Política da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Apesar de não ter manifestado interesse em ser magistrado, surgiu uma oportunidade e, em maio de 2008, Nunes foi alçado ao posto de juiz no Tribunal Regional Eleitoral do Piauí (TRE-PI). Foi na Corte nordestina que ele tomou gosto pela carreira de magistrado e decidiu que essa seria sua nova linha de atuação no meio jurídico, como contam amigos próximos.
Em 2011, chegou ao TRF-1 para ocupar uma das vagas destinadas aos profissionais que têm origem na advocacia. Ele foi escolhido pela ex-presidente Dilma Rousseff, com apoio do então vice-presidente Michel Temer (MDB), e desde o ano passado, já confidenciava a interlocutores que pretendia chegar aos tribunais superiores, mas pensava no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Sua experiência prévia fez com que o magistrado tivesse um olhar especial para a atuação dos advogados, a importância do sistema de pesos e contrapesos no ramo do direito, e a necessidade de, ao mesmo tempo que se garante a punição aos criminosos, resguardar o direito de defesa e evitar falhas que podem comprometer a motivação do sistema de Justiça.
Ministro se diz defensor da vida
O novo ministro é garantista, como ele mesmo pontuou durante sabatina no Senado, que serve para conhecer melhor o indicado pelo presidente e avaliar se é a pessoa certa ao cargo. A sabatina foi tranquila, sem muitos questionamentos e vários elogios. Ainda assim, foi possível identificar alguns posicionamentos do novo ministro, como em relação à descriminalização do aborto.
Ao ser questionado, ele disse ser “defensor do direito à vida”. “No meu lado pessoal, eu deixei bem claro na minha apresentação, sou defensor do direito à vida, e tenho razões pessoais para isso. Se eventualmente for necessário até o final, eu exponho. Questões familiares, experiência minha vivida, a minha formação sempre é em direito à vida”, disse.
Um dos assuntos mais abordados pelos parlamentares foi a prisão em segunda instância, que já passou por votação no Supremo, está em debate no Congresso e volta ao palco no Judiciário. Para o desembargador, o assunto deve ser tratado no âmbito do Poder Legislativo. “Essa matéria está devolvida ao Congresso Nacional. Entendo ser o foro mais do que competente para traçar essas discussões, para convocar a sociedade, ouvir os clamores populares. Não entendo que o Judiciário seja o foro adequado”, disse.
Para dar uma resposta aos senadores sobre sua posição, Marques apenas citou uma entrevista concedida em 2018, ao site Conjur, na qual disse ser favorável à prisão após condenação em segunda instância, avaliando, no entanto, que isso depende das circunstâncias concretas.
“Me indagaram qual era minha posição ao que já havia decidido o STF naquele momento, que era autorizando as prisões em segunda instância. Eu apenas, num comentário, disse naquele momento que era favorável àquela decisão do Supremo, e apenas ponderei que, como a própria Constituição Federal exige que toda decisão seja fundamentada, isso pode servir de inspiração do que for decidido aqui”, destacou.
Marques ressaltou, no entanto, que toda decisão precisa ser fundamentada. Como exemplo, citou um cenário em que um “criminoso habitual”, como um traficante, tenha sido condenado, e o mesmo tenha ocorrido com um pai de família, empregado, com residência fixa, que tenha por um “infortúnio” se envolvido com uma briga próximo de casa e cometido uma lesão corporal grave.
“Naquela condenação em segunda instância, se não dermos a possibilidade do Judiciário, iria determinar o recolhimento das duas pessoas”, afirmou. Para ele, é preciso analisar caso a caso “para não se cometer uma injustiça e dar o tratamento igualitário a casos que não merecem ser tratados como simétricos”.
Correções na Lava-Jato
Frente a diversos desgastes que estão sendo sofridos pela Operação Lava-Jato, Marques foi questionado durante a sabatina sobre as forças-tarefas. O novo ministro disse que o Brasil inteiro reconhece o mérito da Lava-Jato, mas afirmou que algumas condutas podem ser corrigidas.
"O que acontece, pode acontecer em qualquer operação, em qualquer decisão, em qualquer esfera, é: se houver determinado ato ou conduta, seja da autoridade policial, seja de algum membro do Ministério Público ou de algum membro do Poder Judiciário, essas correções podem ser feitas, nada é imutável", disse.
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