Após a tensão nas últimas semanas com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), o ministro da Economia, Paulo Guedes, elogiou o deputado e afirmou que há muitas convergências entre eles, especialmente, na crítica sobre os orçamentos "capturados por grupos de interesses" das elites do funcionalismo e do empresariado.
“Apesar do aparente desentendimento, temos mais convergências do que divergências”, afirmou Guedes, durante o “Seminário de Administração Pública”, organizado pelo Instituto Brasiliense de Direto Público (IDP). Com a mediação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, o evento, realizado na noite desta quarta-feira (14/10), contou com participação de Maia e dos governadores do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), e do Maranhão, Flávio Dino (PC do B). O ministro saiu em defesa do Pacto Federativo e da responsabilização da classe política sobre o debate de um orçamento público mais amplo.
Em sua explanação, Guedes lembrou que mais de 90% das despesas primárias do governo estão carimbadas e gerenciadas por um software, sobrando pouco para o Legislativo arbitrar sobre o Orçamento. Ao defender mudanças nesse quadro, o ministro concordou com Maia de que os incentivos fiscais são distribuídos de forma desequilibrada e defendeu o fim de todos os subsídios em troca de avanços na reforma administrativa proposta. “Seria o ideal. Estamos juntos de novo nesse ponto. O fim de todos os subsídios seria ideal”, disse o chefe da equipe econômica apoiando a proposta do parlamentar.
Contudo, em seguida, o ministro reconheceu que a iniciativa é complicada, porque é difícil identificar as receitas equivalentes aos mais de R$ 300 bilhões de renúncia fiscal da União, pois “os impostos são disfuncionais” e acabam gerando um enorme contencioso tributário, muito superior a essa fatura, de R$ 3,5 trilhões.
Maia e Guedes afinaram o discurso na defesa do teto de gastos — emenda constitucional que limita o crescimento das despesas pela inflação do ano anterior — e sinalizaram que o diálogo está aberto para um acordo em relação à reforma tributária.
Nova CPMF
Guedes voltou a defender o imposto digital, alegando que vários países na Europa começam a discutir uma modalidade de tributação sobre as transações digitais das grandes empresas digitais durante as conversas dos ministros das Finanças no encontro do Fundo Monetário Internacional (FMI) desta quarta.
"Eu detesto imposto, mas pensando no imposto digital, todos reconhecem que a dimensão digital chegou para ficar e o crescimento das bases tributárias vai ser digital. A Espanha, que é mais ousada, criou dois impostos sobre transações digitais", afirmou. Segundo ele, a discussão passa sobre os centros consumidores, que buscam ampliar a tributação porque há uma erosão das bases tradicionais.
"Estamos observando o debate e fazendo uma base para o imposto digital", afirmou ele, em referência à nova Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF). "Não é um retorno à CPMF, porque transcende às operações eletrônicas e incide sobre uma infovia digital. É uma base muito mais ampla",disse o ministro.
Pacto Federativo
Quando foi questionado sobre qual é a prioridade do governo, Guedes disse que era o Pacto Federativo e, nesse sentido, defendeu uma reforma mais ampla do que a que ele enviou ao Congresso, passando por desindexação e desvinculação das despesas, inclusive, dos subsídios. “Temos um consenso sobre as reformas, mas sabemos que há limites temporal, de modo que eu subescrevo a análise do Rodrigo", afirmou.
O ministro não poupou elogios a Rodrigo Maia, especialmente, ao afirmar que o parlamentar foi um dos poucos do Congresso a compreenderem a necessidade do pacto e da necessidade de reduzir o tamanho do Estado com reformas. “Maia tem uma capacidade de abstração enorme. Ele foi o que entendeu e se dispôs a nos ajudar”, disse Guedes.
Perestroika
Durante sua apresentação, o ministro comparou as mudanças com as reformas que prometeu propor para fim de “garantir o futuro de filhos e netos”, como uma espécie de Perestroika e Glasnost (medidas econômicas e políticas adotadas no processo de abertura da extinta União Soviética).
Guedes contou que, no fim do ano passado, o combinado para enviar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Pacto Federativo foi dividir em três partes, a pedido do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), a fim de agradar as maiores bancadas da Casa. Com isso, a PEC dos Fundos ficou com o senador Otto Alencar (PSD-BA). A PEC Emergencial, que trata da regulamentação dos gatilhos no caso de descumprimento do teto de gastos, a princípio, com o senador Oriovisto Guimarães (PODE-SC). Já a PEC do Pacto Federativo, com Marcio Bittar (MDB-AC), relator da PEC, e que, agora, também ficou com a relatoria da PEC emergencial, com o compromisso de incluir no texto a proposta do Renda Cidadã, programa que deverá substituir o Bolsa Família.
"Liberal radical"
Guedes denominou-se um "liberal radical" e chamou para a briga governador que quiser fazer o acordo para acabar com a batalha judicial no STF sobre a Lei Kandir, se incluir a rolagem de dívidas e indexação. “Aí, vamos para a briga de novo. Eu farei uma aliança de centro direita para impedir isso”, disse o ministro, citando o governador maranhense Flavio Dino, alegando que estava tentando “colocar um bom humor na conversa”.
Dino, em tom conciliador, disse que não poderia aceitar o duelo proposto por Guedes. “Não é o meu estilo e tenho noção do meu limite, mas haverá um tempo para fazermos uma contenda”, afirmou. O governador ainda disse que também é um liberal, mas destacou que “o liberalismo tem muitas matize e, sobre ele, há muitas visões”.
Alfinetada
Ao contrário de Guedes e de Maia, Flavio Dino criticou o teto de gastos. “O Brasil é o único país do planeta que tem teto de gastos na Constituição”, destacou ele, lembrando que, na Carta Magna, havia uma “anomalia” que era a taxa de juros de 12% ao ano, mas foi tirada. “É obvio que tem que ter teto, mas ele precisa estar na LRF (Lei de Responsabilidade Fisca), por exemplo. Na Constituição, é crise toda hora”, disse. Ele, inclusive, sugeriu que a emenda do teto não deveria impor um limite anual, que, certamente, não será cumprido no ano que vem, por conta da recessão provocada pela pandemia. "É um equívoco jurídico formal ter um teto na Constituição e é um equívoco ele ser anual", pontuou.
Flavio Dino ainda aproveitou para dar uma alfinetada em Guedes por não apresentar "soluções práticas" quando ele defendeu que quer deixar um país menos endividado para filhos e netos. "Temos que governar aqui e agora. Quem cuida de nossos filhos e netos é Deus. Precisamos financiar o estado para ter um país melhor", disse.
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