No caminho pela erradicação da pobreza, o foco do Bolsa Família é na nova geração. Por isso, as diretrizes foram balizadas em torno da exigência de que os filhos dos beneficiários em idade escolar estejam matriculados e frequentando os colégios, com frequência de 85% da carga horária do ano letivo. Cuidados com a saúde, como vacinação em dia, também são condicionantes para o recebimento do benefício. Com isso, o programa se firmou, ao longo dos anos, como um potencializador de frequência e desempenho escolar, melhoria na segurança alimentar e redução da mortalidade infantil.
O receio de que o recurso poderia servir como um gatilho para que o beneficiário se mantenha afastado do mercado de trabalho ou seja estimulado a ter mais filhos para aumentar o benefício foi rebatido ao longo dos anos. O sociólogo Floriano Pesaro diz que o efeito não foi observado pelas pesquisas realizadas no Brasil, pois o recurso disponibilizado é pequeno. Ele também relembra que o programa, no início, era destinado a famílias com até três crianças, o que significa que um quarto filho não aumentaria o valor.
Depois, com a ampliação do programa, o Bolsa Família passou a considerar o núcleo familiar e a renda per capita. “Quanto maior era a família, maior era a chance de entrar no programa, pois era a renda da família dividida pelo número de familiares que importava. No entanto, mesmo considerando a renda per capita, o recurso dado nunca foi relevante a ponto de animar alguém a fazer mais um filho por conta disso. Esse raciocínio nunca foi, de fato, comprovado”, explica Pesaro. À época da implementação, o benefício cedido começava no valor R$ 50. Atualmente, varia entre R$ 89 e R$ 205, dependendo, ainda, da quantidade de filhos por família.
Desafios
Tomando como base os dados da Pesquisa Anual por Amostra de Domicílios (Pnad), de 2001 a 2017, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) realizou, no fim do ano passado, o balanço dos primeiros 15 anos do Bolsa Família, constatando a redução de 25% da extrema pobreza e 15% da pobreza, em razão do programa. O Bolsa Família responde — conforme o levantamento — por 10% de redução da desigualdade no Brasil, entre 2001 e 2015. Os desafios, contudo, não estão superados. O estudo revela que 64% dos beneficiados continuam em situação de extrema pobreza.
Segundo Pesaro, isso acontece porque o programa distribui dinheiro como ação principal, deixando a educação como consequência. “Programas de transferências de renda não distribuem conhecimento, distribuem dinheiro. E há uma desvalorização do poder de compra do beneficiário ao longo do tempo. O dinheiro é algo que nem sempre é gasto de forma estruturante, muitas vezes, é usado com bens de primeira necessidade, como comida. O beneficiário não consegue usar esse recurso para, por exemplo, pagar um curso ou uma formação”, pontua.
O programa, para o especialista, é uma forma de amenizar o sofrimento da pobreza extrema, mas não é capaz de tirar o beneficiário da situação em que está nem é sustentável a longo prazo, “pois diminui a desigualdade enquanto se está recebendo o benefício, mas, depois, a pessoa volta para a situação original”. Ele ressalta ser necessário bater sempre na tecla da educação e na oportunidade de emprego.
Pesaro comenta, também, o aspecto econômico da assistência à renda familiar. “Os programas de transferência de renda contribuem muito para a dinamização da economia, especialmente do pequeno comércio. Os beneficiários estão sempre comprando no comércio local, o que acaba ajudando a economia do Brasil”, frisa. “Esses programas transferem dos mais ricos, por meio dos impostos, para os mais pobres, por meio da renda. E os beneficiários contribuem novamente, tanto com a dinamização da economia quanto devolvendo parte desses recursos em impostos.”