A ministra da Agricultura, Tereza Cristina, acredita que, se houvesse mais gado no Pantanal, os incêndios que devastam o bioma há mais de dois meses poderiam ser menores. Segundo ela, quando os bois comem capim seco ou inflamável, impedem que o fogo avance. A ministra expôs o seu ponto de vista ontem, em audiência pública na comissão externa do Senado que discute as queimadas no Pantanal.
O aumento no número de focos de incêndio aconteceu por excesso de matéria orgânica seca, disse Tereza Cristina. “Talvez, se nós tivéssemos um pouco mais de gado no Pantanal, teria sido um desastre até menor do que o que nós tivemos neste ano”, afirmou. “Eu falo uma coisa que às vezes as pessoas criticam, mas o boi ajuda, ele é o bombeiro do Pantanal, porque é ele que come aquela massa do capim”, continuou a ministra.
Segundo Tereza Cristina, o gado come a massa orgânica "para não deixar que ocorra o que neste ano nós tivemos" — ou seja, o número mais alto de incêndios no Pantanal na história. Até o último sábado, 3,9 milhões de hectares do bioma haviam sido devastados pelas queimadas, de acordo com o Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo), do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama).
A ministra comentou que a falta de água piora a situação. A região do Pantanal vive a pior seca dos últimos 60 anos, pelos dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). "Com a seca, a água do subsolo também baixou em seus níveis. Essa massa virou o quê? Um material altamente combustível, incendiário", apontou. Ela não mencionou, no entanto, a possibilidade de indução de queimadas de forma proposital, para abrir espaço para pastagem.
Não é a primeira vez que o governo defende a teoria dos “bois bombeiros”. O presidente Jair Bolsonaro também mencionou, em agosto, que “se o gado não come capim em determinadas áreas, acumula capim seco e graveto sem vida e, quando vem o fogo (...), vai embora”. A mesma teoria é compartilhada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. “A pecuária ajuda a diminuir a matéria orgânica porque o gado come pasto e não deixa acumular”, disse, em live com Bolsonaro, em setembro.
A fala repercutiu mal no Congresso. Vários parlamentares criticaram o posicionamento do Executivo, exposto, dessa vez, pela ministra da Agricultura. “Mais uma declaração absurda desse governo, que adora uma boiada como solução para os problemas ambientais”, comentou a deputada Talíria Petrone (PSol-RJ), no Twitter. Para o deputado Rogério Correia (PT-MG), esse tipo de declaração é um “deboche na cara da população”.
Também na rede social, o deputado Marcelo Freixo (PSol-RJ) classificou como “trágico” o comentário de Tereza Cristina. “Depois do 'se não investigar corrupção, não tem corrupção', agora o desgoverno vem com o 'se destruir a floresta, não tem queimadas em florestas", escreveu. O correligionário David Miranda (RJ) concordou. “Isso mostra a intenção deles. Até porque, 'se não houver floresta nem Pantanal, não tem mais queimada nem desmatamento'”, afirmou.
As queimadas no Pantanal duram mais de dois meses e batem recorde. Até o último dia 3, 3,9 milhões de hectares do Pantanal haviam sido devastados pelas queimadas, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama). A área destruída representa 26% do bioma. Desde janeiro, o Inpe registrou mais de 17 mil focos de calor no Pantanal, número maior do que os 10 mil focos registrados em todo o ano de 2019.
Amazônia
A comissão externa do Senado quer apoio do presidente Jair Bolsonaro para incluir o bioma Pantanal nas atribuições do Conselho Nacional da Amazônia Legal até 2025. A sugestão foi aprovada oficialmente ontem. O mesmo pedido já havia sido enviado pelo Senado ao Executivo em agosto, mas não foi atendido. A intenção, agora, é apresentar a demanda pessoalmente ao chefe do Executivo nas próximas semanas.
Para a senadora Simone Tebet (MDB-MS), autora da proposta, a inclusão representará “o verdadeiro compromisso do governo federal”. Segundo ela, a medida seria uma forma de garantir ações de prevenção e combate a incêndios. A ministra disse não ver problemas na sugestão, mas afirmou que a questão também precisa ser discutida com o vice-presidente Hamilton Mourão, que comanda o Conselho da Amazônia Legal.