SENADO

Senadores avaliam possibilidade de votação remota após pandemia

Antônio Anastasia (PSD-MG) relata reforma do regimento interno da Casa. A intenção, segundo ele, é aplicar um sistema misto, que garanta a presença nos debates importantes, mas libere os legisladores em comissões e pautas que gozem de consenso

Luiz Calcagno
postado em 29/10/2020 19:27 / atualizado em 29/10/2020 19:28
 (crédito: Minervino Junior/CB/D.A Press - 29/8/16)
(crédito: Minervino Junior/CB/D.A Press - 29/8/16)

Parlamentares debatem a possibilidade de manter as votações remotas no Senado mesmo após o término da pandemia. A bola está com o senador Antônio Anastasia (PSD-MG), incumbido de relatar a reforma do regimento interno da Casa. A intenção, segundo ele, é aplicar um sistema misto, que garanta a presença dos políticos nos debates importantes, mas libere os legisladores para votar remotamente em comissões e pautas que gozem de consenso entre partidos e bancadas.

Hoje, o regimento exige votação presencial, e um acordo permitiu que os senadores trabalhassem remotamente desde 20 de março, por conta da pandemia de coronavírus. Ainda assim, parlamentares se reuniram nas comissões de Constituição, Cidadania e Justiça, de Assuntos Econômicos, e de Relações Exteriores, para votar a indicação de diversos cargos, entre eles, o de diplomatas e o de Kassio Nunes, para ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).

Muitos parlamentares apontam que o sistema híbrido é um “caminho sem volta”. Mas também há quem aponte para as más experiências das votações durante a pandemia, dentre elas, pouco tempo de fala, pouco tempo de debate e falta de transparência e de contato com a sociedade.

Anastasia argumenta que já havia um debate sobre um sistema de votação mista, mas que o tema sofria com grande rejeição. O assunto só ganhou destaque quando, às pressas, Câmara e Senado tiveram que desenvolver um sistema e implementá-lo para dar seguimento às deliberações no combate ao novo coronavírus. Inicialmente, pensou-se, porém, que o sistema funcionaria por 60 dias. A revisão do regimento que permitirá a mudança será submetida ao plenário da mesma forma que o atual sistema de deliberação remota, aprovado no primeiro trimestre.

“Acompanhamos, na semana passada o esforço concentrado das votações secretas, que impede que seja votação remota. Isso demonstra que o sistema híbrido é o mais adequado. Temos que conciliar o bom dos dois sistemas. Minha proposta tará tanto a deliberação remota como a permanente. Mas as condições dependerão das circunstâncias e da deliberação da mesa diretora ou da comissão”, explicou o senador.

Anastasia falou da reforma no regimento em um evento virtual sobre o sistema híbrido, que contou com a presença de deputados e especialistas. No encontro, foi registrado o risco de votações remotas serem menos transparentes, da necessidade de tornar mais abertas às reuniões dos colegiados de líderes, de o modelo afastar o Congresso da população, dos prejuízos em saltar etapas e abreviar debates de temas importantes e, também, da necessidade de esclarecimento sobre, nos debates, o que é opinião de interessados da população, e o que é o posicionamento de um especialista sobre determinado tema.

Participação da sociedade

O senador admitiu que o sistema remoto, como está, provocou a diminuição da participação da sociedade. “Todos nos afastamos. Não há presença física. O processo ficou corrido, com temas emergentes, MPs, e as comissões paralisaram. Houve esse prejuízo. As comissões sempre foram o lugar adequado para uma discussão mais profunda, com audiências, oitivas, para encarar a realidade”, assumiu. Anastasia acrescentou, porém, que 70% das pautas no parlamento “não são controversas”. E que existem muitos temas que não avançam nas devidas comissões por uma constante falta de quórum.

“Na Comissão das Relações Exteriores, temos um monte de tratados internacionais parados, sem quórum para votar, e nunca tem quórum. O sistema híbrido vai funcionar muito bem para as matérias incontroversas, que representam o grosso do processo legislativo. Aquilo que há controvérsia e a sociedade quer participar, esses temas vão demandar a presença física e vão continuar normalmente. Com um sistema novo, híbrido, numa audiência pública não precisa mais a pessoa vir a Brasília, pagar passagem, diária. É o Zoom (recurso de vídeo). Uns sentados lá, outros na tela do computador. Mas é fundamental nesse projeto mais complexo, que tenhamos a participação da sociedade garantida”, ponderou.

Debate acirrado

O senador Otto Alencar (PSD-BA) concorda. Para ele, é o caminho mais seguro. Até porque, por conta da faixa etária, muitos senadores estão no grupo de risco se contraírem coronavírus. Colega de partido de Alencar e Anastasia, Arolde de Oliveira, 83 anos, está entre os brasileiros que perderam a vida após contrair a doença. “Acho que é um sistema seguro. Não vejo dificuldades de fazer votação no sistema híbrido. Temos senadores com comorbidade, que são faixa de risco, e temos que dar condições para que possam votar”, disse.

Já o líder do Podemos, senador Álvaro Dias (PR) se mostra contrário. “Eu acho que compromete a essência do parlamento, que é o debate. Especialmente, elimina o contraditório. Há muita imposição de cima para baixo, tratoramento em decisões, não há debate. As comissões não funcionam. O parlamento já sofre um desgaste grande para aprofundar com um sistema remoto. Não desejamos, mas se houver outra onda de pandemia que justifique, tudo bem. Mas em período de normalidade, não há necessidade. E não sei se há clima. A maioria se ressente de participação nas sessões. Só os líderes acabam se pronunciando, às vezes, por três minutos. Não consegue aprofundar os conceitos”, disse.

E o senador Paulo Paim (PT-RS), afirma que é preciso calma. Para o parlamentar, a mudança é incontornável e afetará toda a sociedade. Ele destaca que haveria economia, pois senadores não teriam de viajar de seus estados a Brasília para marcar presença, por exemplo, para sessões com votação simbólica. “Se o sistema é misto, os temas polêmicos poderão ser debatidos presencialmente. Temas não polêmicos, sem grandes debates, que todos concordam, aperta o botão e vota. Matérias de bom senso, consenso, não há porque ficar discursando só para discursar. O sistema misto, devagar e sempre, não do dia para a noite, presencial e virtual, podemos avançar para isso de forma natural”, avaliou.

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