Os ministros Ricardo Salles e Luiz Eduardo Ramos foram ao Twitter, ontem, para anunciar que a crise aberta na quinta-feira passada –– quando o titular do Meio Ambiente atacou o colega da Secretaria de Governo (Segov) chamando-o de “Maria Fofoca”, pela mesma rede social –– estava resolvida entre eles. Conforme deixaram claro em postagens, estão em paz e que seguem juntos ao lado do presidente Jair Bolsonaro “e pelo Brasil”. Salles disse ter apresentado as suas “desculpas pelo excesso” a Ramos, assim, colocou-se “um ponto final nisso”. Ramos, por sua vez, escreveu que “uma boa conversa apazigua as diferenças”.
As mensagens foram publicadas com 57 minutos de diferença, sendo que o ministro do Meio Ambiente tomou a iniciativa de encerrar a crise que ele mesmo promovera. “Conversei com o @MinLuizRamos, apresentei minhas desculpas pelo excesso e colocamos um ponto final nisso. Estamos juntos no governo, pelo Pres. Bolsonaro e pelo Brasil”, escreveu. Já Ramos ressaltou em seguida: “Uma boa conversa apazigua as diferenças. Intrigas não resolvem nada, muito menos quando envolvem questões relacionadas ao país. Eu e o @rsallesmma prosseguimos juntos em nome do nosso presidente @jairbolsonaro e em prol do Brasil”.
Nos últimos dias, os dois protagonizaram um embate que opôs as alas militar e ideológica do governo. O ataque veio depois de uma nota publicada no site do jornal O Globo, na qual dizia que o ministro do Meio Ambiente resolveu “testar a blindagem” e “esticou a corda” com os fardados ao anunciar que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis interromperia as ações de combate a incêndios por falta de recursos, e recolheria seus técnicos na linha de frete aos incêndios na Amazônia, no Pantanal e no Cerrado para as bases. Salles havia utilizado o mesmo expediente, em agosto, para forçar a liberação de verbas para o Ibama e para o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) –– e terminou sendo admoestado pelo vice-presidente Hamilton Mourão.
A irritação do ministro do Meio Ambiente é que, segundo fontes do governo, Ramos prioriza a distribuição de recursos sobretudo para a Defesa e para a Saúde, ambas pastas dirigidas por colegas de caserna. Além disso, como Mourão preside o Conselho da Amazônia, é quem dá a palavra final para qualquer assunto sobre o bioma.
Em silêncio
Ramos não havia se pronunciado sobre a ofensa de Salles, nem tampouco Bolsonaro. Mas, ontem, em sinal de apoio, o presidente saiu para um passeio de moto ao lado de Ramos, demonstrando apoio a ele, que é o articulador político do Palácio do Planalto junto ao Congresso. Indicando que a situação começava a se ajustar, o secretário de Governo, ao ser questionado por jornalistas numa das paradas que fizeram no Distrito Federal, disse que “não tem briga nenhuma”. “Tem uma definição: briga é quando (tem) duas pessoas”, explicou, afirmando que a sua relação com o presidente “está excepcional como sempre”, a responder sobre o clima no governo.
Depois do “Maria Fofoca”, as duas principais lideranças do Congresso prestaram publicamente, no sábado, apoio a Ramos. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que está envolvido na campanha política do irmão em Macapá, usou o Twitter para dizer que a ação de Salles “apequena o governo” e registrar “a importância do ministro Ramos na relação institucional com o Congresso”. Já o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), não mediu palavras: “O ministro Ricardo Salles, não satisfeito em destruir o meio ambiente do Brasil, agora resolveu destruir o próprio governo”, escreveu.
O ministro do Meio Ambiente terminou por ficar isolado. Ao seu lado, apenas os representantes da chamada da “ala ideológica” dos apoiadores de Bolsonaro. Entre os que o defenderam, estão as deputadas federais Bia Kicis (PSL-DF), ex-vice-líder do governo na Câmara, e Caroline de Toni (PSL-SC). Salles recebeu, ainda, o apoio do próprio filho do presidente Jair Bolsonaro, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) –– que ontem usou o Twitter para alfinetar Rodrigo Maia, ao insinuar que ele, com o apoio que dera a Ramos, interferiu nos assuntos de outro Poder.
Preço do arroz
Bolsonaro perdeu a paciência, ontem, depois que foi questionado sobre o preço do arroz –– que, em algumas regiões do Distrito Federal, chegou a custar até R$ 30 o quilo. Ao passar pela Feira Permanente do Cruzeiro, um homem se aproximou enquanto ele tirava fotos com apoiadores, e disse:
“Bolsonaro, baixa o preço do arroz, por favor. Não aguento mais”.
O presidente rebateu: “Tu quer que eu baixe na canetada? Você quer que eu tabele? Se você quer que eu tabele, eu tabelo. Mas você vai comprar lá na Venezuela”, disse, numa das paradas que fez no passeio com Ramos.
No último dia 14, o presidente também foi questionado por apoiadores sobre o preço do alimento e também respondeu irritado. “Acabaram com os empregos, aí sobe o preço do arroz, né? Já pensou se o homem do campo tivesse ficado em casa? Não teria nem a R$ 30, R$ 35”, reagiu.
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Roupa suja se lava no Twitter
A aproximação entre Jair Bolsonaro e o Centrão não tirou as redes sociais de cena, nem tampouco restringiu decisões estratégicas aos gabinetes. As últimas semanas foram pródigas em mostrar esse movimento e as apostas são as de que quanto mais próximo do período eleitoral, mais o presidente Bolsonaro se renderá ao que desejam seus ferrenhos apoiadores nas redes.
Em duas semanas, dois gestos marcaram essa influência do Twitter no governo. O primeiro, com direito a descompostura pública do presidente da República a um ministro de Estado, no caso Eduardo Pazuello, foi o passo atrás no protocolo para compra da vacina para prevenção da covid-19 produzida pelo Sinovac Biotech, laboratório com sede na China. Bolsonaro não só respondeu que esse imunizante não seria comprado, como acusou o general de “querer aparecer”.
Vinte e quatro horas depois, foi a vez do ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, protagonizar uma briga com o ministro da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, a quem chamou de “Maria Fofoca”. O que começou no Twitter, entretanto, só terminou depois de uma conversa privada, na tarde de ontem, em que colocaram suas diferenças de lado.
O cerne da questão, porém não foi resolvido. Vários ministros consideram que Ramos age mais em atendimento a deputados e senadores, em especial os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), do que em defesa do que os ministros consideram melhor para conduzirem suas pastas. Isso serve tanto para cargos quanto para verbas.
Há quem diga que sempre que há uma queda de braço entre ministros e partidos por nomeações no governo, Ramos fica com os partidos. Esses mesmos integrantes do primeiro escalão apontam a atitude de Ramos, em relação a deputados e senadores, como o motivo para levar tanto Alcolumbre quanto Maia ao Twitter a manifestarem-se com mensagens em apoio ao ministro da Secretaria de Governo.
Pendências
Entre os aliados de Bolsonaro, há a certeza de que, enquanto ele estiver atento ao sentimento de seus apoiadores mais ferrenhos nas redes sociais, mais se distanciará da resolução dos problemas do país. O Renda Cidadã, por exemplo, exigirá corte de despesas em algumas áreas para sair do papel, ou, no mínimo, a reformulação e até a extinção de alguns programas sociais para fazer frente ao pagamento de R$ 300 por pessoa beneficiada. Até aqui, não houve consenso no governo sobre o melhor caminho a seguir, nem tampouco entre os congressistas. Seguindo a máxima de quem tem tempo não tem pressa, o governo entra em procrastinação para ver se consegue chegar a um texto palatável depois da eleição.
Outro assunto pendente –– que, quanto mais longe da redoma bolsonarista nas redes sociais, melhor –– é a disputa de poder dentro do Congresso. Até aqui, Bolsonaro tenta se equilibrar entre seus apoios no Parlamento e os seguidores nas redes. Entre os aliados do presidente, há o receio de que comecem a surgir cobranças nos canais diretos por apoio a algum nome para presidente da Câmara, ou restrições a alguns candidatos. Nesse caso, a prudência recomenda ao presidente fazer “cara de paisagem”, ou seja, não atender aos clamores de apoio a um candidato ou de restrições a qualquer nome. Esse tema, alertam alguns, já é considerado um vespeiro sem a pressão das redes. Se Bolsonaro tomar algum caminho, em função de seus apoiadores, como fez no caso da vacina, ninguém conseguirá acalmar o vespeiro.