Apesar da enxurrada de críticas de parlamentares, especialistas e de operadores do mercado sobre a proposta de financiamento do Renda Cidadã, programa que vai substituir o Bolsa Família, usando recursos previstos para o pagamento de precatórios, dívidas judiciais do governo, e parte dos repasses adicionais da União para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), o senador Marcio Bittar (MDB-AC) garantiu que não vai recuar. “O texto irá como o combinado”, afirmou Bittar, em entrevista ao Correio.
Bittar disse que manterá a proposta como anunciou ontem e reforçou que vai apresentá-la amanhã, mas não soube precisar o horário. Para ele, impor um limite de 2% na Receita Corrente Líquida (RCL) para o pagamento de precatório não é calote, "mas definir uma prioridade nas despesas". “O Orçamento está muito enxuto e precisamos achar espaço para respeitar o teto de gastos sem criar novas despesas e essa foi a única saída”, defendeu.
O senador lembrou que outras medidas propostas pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, como congelamento de aposentadorias, desindexação do salário mínimo, despejotização, taxação de lucros e dividendos e uso do abono salarial, foram descartadas pelo presidente Jair Bolsonaro, e, portanto, o uso de precatórios e parte dos recursos do Fundeb foi a única saída para evitar estouro do teto de gastos -- emenda constitucional que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior.
O parlamentar classificou como “fofoca” a possível retirada dos precatórios do texto e, em relação às declarações de que a medida é inconstitucional e às críticas do mercado ele destacou que o governo está mais preocupado em socorrer as pessoas que vão ficar sem auxílio emergencial no ano que vem. “Estamos preocupados também com 10 milhões de brasileiros que precisarão do estado mesmo a partir de janeiro”, destacou Bittar, que também é relator do Orçamento de 2021. Ele não revelou o valor do benefício, mas garantiu que com o pagamento de 1/3 do previsto com precatórios, vão sobrar no Orçamento R$ 37 bilhões dos R$ 55 bilhões previstos para essa rubrica para incluir na previsão adicional para o Bolsa Família no ano que vem, de R$ 34,8 bilhões.
Os mercados reagiram mal à proposta de Bittar e a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) desabou 2,4%, ontem, e, hoje, roda com queda entre 0,70% e 0,80%, em torno de 93 mil pontos. Analistas interpretaram a proposta como uma espécie de calote na dívida ou mesmo uma “pedalada” e demonstraram dúvidas sobre a capacidade de o governo conseguir manter em pé o teto de gastos. Não à toa, o dólar também disparou nesses dias e está sendo negociado em torno de R$ 5,65.
Ao defender o uso de até 5% dos valores acima dos R$ 10 bilhões previstos para o Fundeb a partir do ano que vem, Bittar disse que essa faixa vai acompanhar a gradualidade dos repasses da União. “A crítica é que o governo não pode tirar recurso da educação, mas o dinheiro vai para as famílias com crianças na escola. De que adianta dinheiro para o Fundeb se a pessoa não vai ter recurso para sobreviver?”, questionou. De acordo com o senador, a proposta que está sendo elaborada junto com o Ministério da Cidadania prevê que esse recurso vá para as famílias com filhos na escola, com incentivos para as crianças que tiverem notas altas e um programa adicional para capacitação, ajudando no processo de saída.
Bittar contou que vai incluir o Renda Cidadã na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) Emergencial, que trata da regulamentação dos gatilhos do teto de gastos que serão acionados no caso de descumprimento da regra. Além do relatório da PEC Emergencial, Bittar também pretende entregar amanhã o relatório da PEC do Pacto Federativo, que prevê a desvinculação de despesas e também terá mecanismos para acabar com os penduricalhos nos salários de servidores que rompem o teto do funcionalismo, de R$ 39 mil ao mês, como o fim de férias acima de 30 dias.