O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pretende testar, nas eleições municipais em novembro, sistemas para votação pela internet. Seria uma maneira de permitir a eleitores que votassem em casa, além de tornar a votação presencial mais ágil e mais barata, desde que com a mesma segurança. O teste, no entanto, não terá nenhuma relação com o pleito municipal de 2020. O voto presencial permanece obrigatório este ano.
Durante os testes, o TSE usará candidatos fictícios nas bancas de voto pela internet.
O TSE publicou um edital de chamamento público e empresas de tecnologia interessadas precisam se manifestar junto ao tribunal entre 28 de setembro e 1º de outubro. Os participantes apresentarão alternativas de sistemas que poderiam permitir a votação via internet com segurança e possibilidade de auditoria. Em nota, o tribunal avisa que “empresas interessadas poderão demonstrar gratuitamente sua proposta no dia 15 de novembro – data do primeiro turno das Eleições Municipais de 2020 –, nas cidades de Curitiba, Valparaíso de Goiás (GO) e São Paulo.
O projeto, batizado de “Eleições do Futuro”, busca soluções tecnológicas para modernizar o processo eleitoral, mantendo a segurança e a inviolabilidade do voto e transparência nas eleições. O sistema remoto não substituiria a votação presencial, mas poderia beneficiar as regiões mais distantes do país, além de, em caso de pandemia, garantir a segurança e o direito democrático de idosos e pessoas com comorbidade. Além disso, o TSE permanecerá com o controle total da Justiça Eleitoral.
As empresas envolvidas precisam apresentar sistemas que possibilitem identificar o eleitor e contabilizar corretamente o voto. Além disso, os participantes terão que propor soluções, também, que garantam a votação da parcela da população que não tem acesso a smartphones ou internet.
Economia de recursos
O experimento das empresas e a apresentação de sistemas com soluções para votação pela internet serão monitorados por técnicos da Justiça Eleitoral. A gestão dos testes de novas soluções para o processo eleitoral estará sob responsabilidade dos ministros Edson Fachin e Alexandre de Moraes, que também conduzirão as eleições de 2022. De acordo com o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, as urnas eletrônicas são uma “excelente solução”, mas “têm um custo elevado e exigem reposição periódica”. “Mesmo que, em um primeiro momento, os eleitores continuem a ter que comparecer às seções eleitorais, para a proteção do sigilo, só a economia de centenas de milhões de reais com a substituição de urnas já representa um grande ganho", observou.
Para Marcelo Weick, coordenador-geral da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep) e professor da Universidade Federal da Paraíba, o TSE acertou ao entrar no debate. A academia, inclusive, já havia apresentado um estudo sobre o tema ao órgão. Ele alerta, contudo, que se trata de um longo processo. A Estônia, país que já tem um sistema de votação por internet, precisou de 10 anos para desenvolver um sistema seguro. O especialista afirma que um bom sistema de votação pela internet pode deixar o processo eleitoral mais democrático e participativo.
“O legal dessas formas remotas, é que você olha a democracia de baixo para cima. Maximiza a participação dos cidadãos em deliberação municipal. Faltam ferramentas tecnológicas para ajudar. Ninguém tem paciência para ir, uma vez por semana, a um ginásio, votar o orçamento da cidade. Mas, com uma ferramenta, pode ser uma forma de renascer uma democracia mais qualitativa a partir das experiências das cidades, dos municípios, pondera.
Acesso à Internet
Para Weick, porém, é preciso levar em conta que um sistema de voto pela internet tem muitas barreiras para ser implantado no país. “Não é uma panaceia, nem uma ágora digital. O primeiro obstáculo é o acesso à internet. Temos uma rede razoável no Brasil, mas muita dificuldade de acesso. Não é todo mundo que acessa internet com qualidade, também. Nem todo mundo tem smartphone. São obstáculos", afirma o especialista. "Outro desafio é a segurança do voto. Seja do ponto de vista de identificar se quem está votando é a pessoa, e não um robô, seja para assegurar que a pessoa não está sendo coagida por um líder comunitário, miliciano ou traficante. Essa questão da segurança do voto, tem que se analisar”, alerta Weick.
Existe, ainda, a possibilidade de uso de sistemas equivalentes ao sistema bancário para cadastro do celular, e até do uso de terminais eletrônicos de auto-atendimento. “O mais interessante da abertura da simulação é abrir a oportunidade para se discutir isso. Como vai ser a votação nas novas gerações?”, provoca Marcelo Weick. O professor universitário e representante da Abradep lembra, por outro lado, que entidades já utilizam alguns sistemas de votação no Brasil. “A votação da Associação dos Magistrados Brasileiros é feita eletronicamente. Cooperativas de médicos, de créditos, tem votado via internet”, exemplifica.
Segurança
“O que o TSE vai fazer é pegar três cidades e fazer simulação de votação via internet. Pela leitura que fiz do edital, eles trabalham em uma perspectiva intermediária. Procuram uma tecnologia segura sem retirar a necessidade presencial do eleitor. Tem alguns condados americanos na região da Nova Inglaterra, é votação presencial, mas por um aparelho. Uma coisa não exclui a outra. Em um momento de pandemia, você eliminaria a possibilidade de pessoas de grupo de risco estar presente. A tecnologia pode ajudar. Mas tem que ter segurança, auditabilidade, identificação do eleitor, combate a fraude, com muito teste, muita análise para botar um sistema na rua”, avalia o analista.
Marcelo Weick observa que, na Estônia, os cidadãos usam uma identificação única, com um chip reunindo todos os documentos. Essa facilidade ajuda a garantir a segurança do processo eleitoral no país. “É um país pequeno. Tem identidade única, com chip. Mas foi um processo que demorou 10 anos. O importante é que o Brasil começou a pensar nisso. Talvez até repense na ideia da identidade única. Se tivesse, facilitaria. O importante é pensar nisso. O TSE tem o cadastro biométrico. Isso facilita muito um processo de virtualização e criação de mecanismos remoto de votação”, pondera.
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