O Supremo Tribunal Federal (STF) vai se debruçar sobre as políticas ambientais do governo do presidente Jair Bolsonaro. Está em tramitação na Corte uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), apresentada pela Rede, que acusa o Executivo de omissão na aplicação de recursos destinados ao meio ambiente. O partido afirma que o Fundo do Clima, voltado para ações de combate ao avanço do aquecimento global, está parado desde o ano passado. A sigla, junto com PSol e PSB, aponta, ainda, uma série de omissões nas políticas ambientais, que estariam gerando retrocessos no setor. O debate começa na próxima semana, com uma série de audiências públicas convocadas pelo ministro Luís Roberto Barroso.
É a primeira vez que a crise do clima chega à Suprema Corte. O Fundo Nacional sobre Mudança do Clima é um dos principais instrumentos de financiamento à luta contra o aquecimento global no país. Barroso ampliou o tema e convidou dezenas de autoridades e especialistas da academia, sociedade civil, setor privado e governo para montar um panorama da situação ambiental do país. Em uma decisão anterior, também por uma ação da Rede, Barroso obrigou o governo federal a criar um plano de emergência sanitária para combater o avanço do coronavírus entre povos indígenas. A determinação está sendo seguida, mas gerou desconforto no governo.
O debate no Supremo terá início na segunda-feira, véspera do discurso de Bolsonaro na Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), no qual se espera que o presidente negue mais uma vez a explosão das queimadas, do desmatamento e da violência contra povos indígenas em seu governo. Porém, os dados indicam que o desmatamento na Amazônia está, há dois anos, fora de controle, com alta de 34% em 2019 e de mais 34% nos alertas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) em 2020; as queimadas na Amazônia já superam as do ano passado, mesmo após quatro meses de ação do Exército na região; o Pantanal vive a pior temporada de fogo de sua história — pelo menos 20% do bioma já queimou. Imprensa, ONGs, ex-ministros do Meio Ambiente e servidores ambientais federais denunciam a destruição de 35 anos de governança ambiental. Investidores e compradores de commodities ameaçam o país com sanções comerciais.
Serão quatro sessões, nos dias 21 e 22. Cada representante inscrito terá 15 minutos de apresentação. Estão previstos para a audiência: os ministros Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional), Marcos Pontes (Ciência, Tecnologia e Inovações), André Mendonça (Justiça e Segurança Pública), Bento Albuquerque (Minas e Energia), Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Tereza Cristina (Agricultura, Pecuária e Abastecimento); os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP); a ex-ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira; o ex-diretor do Inpe Ricardo Galvão; a pesquisadora do Inpe Thelma Krug; a líder indígena Sônia Guajajara; o relator da ONU David Boyd; o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga; e o presidente do Itaú Unibanco, Candido Bracher.
A convocação de audiência pública para tratar do assunto encontrou apoio de especialistas. Fabiana Alves, coordenadora de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil, afirmou que o momento é propício para o debate. “Em meio ao fogo que destrói os biomas do Brasil e à crise do clima, o Judiciário se faz presente abrindo suas portas para discutir como o país apagará a guerra de narrativas travada entre o discurso oficial do governo e o que realmente acontece com o meio ambiente e os brasileiros”, disse. Maurício Guetta, advogado do Instituto Socioambiental, acredita que a Corte vai traçar parâmetros a serem seguidos nas políticas de meio ambiente. “Chegou a hora de o STF determinar a implementação das políticas ambientais de combate à emergência climática, ao desmatamento e às queimadas, sob pena de tornar letra morta os direitos da sociedade brasileira previstos na Constituição”, afirmou o defensor.
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