Aos 67 anos, o ministro Luiz Fux toma posse nesta quinta-feira (10/9) como presidente do Supremo Tribunal Federal. Ele vai ocupar a cadeira deixada pelo ministro Dias Toffoli, que deve retornar à Segunda Turma da Corte. Com mandato de dois anos, o magistrado deve enfrentar pautas polêmicas durante sua gestão, como a descriminalização do uso de drogas, e resgatar as controvérsias da prisão após condenação em segunda instância, que, atualmente, está proibida por decisão do plenário da Corte.
Fux precisará preparar o cenário para as eleições gerais de 2022, mas, antes disso, garantir a segurança jurídica do pleito deste ano, dividindo funções com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), liderado pelo colega, Luís Roberto Barroso. Na mesma cerimônia, a ministra Rosa Weber assume a vice-presidência do Supremo.
Toffoli lembrou, nesta quarta (9/9), no discurso de encerramento de sua gestão, que o ministro Fux também é professor e reúne amplo conhecimento na área jurídica, tendo sido aprovado em primeiro lugar no concurso de juiz nas comarcas de Niterói, Caxias, Petrópolis e Rio de Janeiro. “Não são só nove anos: é toda uma história de vida que o ministro Luiz Fux traz nessa bagagem de magistrado, professor, intelectual e como coautor do novo Código de Processo Civil (CPC), dando maior celeridade e segurança jurídica”, afirmou o magistrado.
Nos bastidores, fala-se que o presidente eleito já deixou claro que as visitas não institucionais estão fora de cogitação. Episódios midiáticos, como a ida do presidente Jair Bolsonaro com empresários ao STF, em maio deste ano, para pedir a flexibilização das medidas restritivas contra o coronavírus, não deverão se repetir.
Visto como um ministro extremamente técnico e linha-dura nas questões penais, a expectativa é deque Fux tire o Supremo do holofote político, quando passou a ser alvo de ataques, por parte dos bolsonaristas. As reuniões com presidentes da Câmara e do Senado, e com o presidente e interlocutores do Palácio do Planalto, devem rarear, diferentemente de como vinha acontecendo com o presidente Dias Toffoli, que manteve muito diálogo com os outros Poderes.
Na avaliação de interlocutores da Corte, a intenção do ministro é manter uma harmonia com os demais Poderes, não se furtando de tratar de assuntos importantes ao Judiciário e à segurança jurídica do país, mas com uma distância segura; prezando pela independência. E em caso de ataque ao STF, como se viu quando o ex-ministro da Educação Abraham Weintraub afirmou que integrantes do Tribunal deveriam ser presos, pode-se esperar uma reação firme.
Cabo e soldado
A relação do governo Bolsonaro com o STF é difícil desde antes de o chefe do Executivo assumir a cadeira. Em 2018, antes do segundo turno das eleições, veio à tona um vídeo feito naquele ano do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) dizendo que para fechar o STF, bastariam um soldado e um cabo. Em 2020, o trato entre Planalto e Supremo tornou-se mais problemático.
Dentre as várias declarações do presidente, não se pode esquecer da resposta à ação do ministro Alexandre de Moraes, que autorizou busca e apreensão contra bolsonaristas no âmbito do inquérito das fake news, que investiga informações falsas e ameaças contra ministros do Supremo. “Ordens absurdas não se cumprem, e nós temos que botar um limite nessas questões. Não teremos outro dia como ontem, chega! (...) Acabou, porra!”, afirmou Bolsonaro, em maio deste ano, criticando, ainda, as decisões monocráticas.
Em meio à escalada de tensão, além da ameaça de impeachment pairando sobre o presidente Jair Bolsonaro (antes da aliança com o Centrão), Toffoli buscou uma gestão conciliadora e de muito diálogo. Essa atitude é considerada, por muitos, como fundamental para garantir a ordem democrática no ambiente político tomado por ataques às instituições, disseminação de mensagens de ódio e insatisfação do Planalto com deciões monocráticas do Supremo.
Passado o momento político mais tenso do primeiro semestre, o próximo presidente do Supremo Tribunal Federal deve resgatar à Corte a missão de assegurar a unidade jurídica nacional. O ministro tenderá a conduzir o STF em busca da formulação de uma jurisprudência sólida e inequívoca, a fim de evitar insegurança jurídica, loteria legislativa e outras distorções.
Apoio à operação
Nos bastidores do Supremo, há uma expectativa de que Fux remeta ao Congresso a análise de algum assunto que julgar não ser de competência do Supremo. Internamente, sabe-se que o ministro é contra a interferência em assuntos afetos ao Legislativo ou Executivo, e que caberia aos parlamentares, eleitos pelo povo, discutir políticas importantes à sociedade. A instância hegemônica na democracia não seria, portanto, o Judiciário, ou um governo de juízes.
No entanto, Fux entende que o STF tem o dever de pautar um assunto caso não entre no Congresso — como é o caso de temas que perturbam segmentos conservadores. Neste cenário, quando a questão pode impedir direitos básicos, o Supremo deve interferir, como fez no caso de união homoafetiva ou no aborto de anencéfalos, decidido pelo STF e com voto favorável de Fux em ambas matérias. O novo presidente também guarda uma visão forte de inclusão, assim como a defesa do meio ambiente e a aplicação de análises econômicas nas decisões do Supremo.
É certo, ainda, que a área penal receberá especial atenção de Fux. No momento, a pauta mais em voga está em torno da Operação Lava-Jato. O novo presidente do Supremo é notório defensor da Operação e deve garantir respaldo à força-tarefa, que continua em atividade até 31 de janeiro de 2021. Entre os assuntos previstos para serem julgados nos próximos meses está a constitucionalidade da descriminalização do uso de todos os tipos de drogas, tendo em lados opostos da discussão direitos coletivos e individuais. As sessões devem ocorrer virtualmente até o fim do ano, em razão do risco de contaminação dos magistrados por covid-19.
A advogada Hanna Gomes destaca que além de pautas econômicas, questões do direito penal devem ter destaque na gestão do ministro. “Certamente, o foco será em pautas da economia, trabalhistas, tributárias, da área da Saúde e a definição de marcos regulatórios. Porém acredito que alguns tópicos podem retornar à pauta, principalmente as temáticas processuais penais que circundam a Operação Lava-Jato, como a prisão em segunda instância, a ordem das alegações finais, a fixação da competência dos crimes eleitorais e a possibilidade de delações premiadas a qualquer tempo do processo —tais questões influenciam uma grande quantidade de outros processo e por isso devem ser resolvidas nesta gestão, com a finalidade de acelerar e enxugar o Judiciário”, afirmou.
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