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Gilmar mantém Queiroz em casa

Ministro considera que fatos narrados para justificar a recolocação do homem próximo aos Bolsonaro em regime fechado não são suficientes, e salienta que deve-se considerar "o grave quadro de saúde do paciente". Decisão se estende à mulher, Márcia



Durou pouco o retorno de Fabrício Queiroz, ex-auxiliar do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) quando era deputado estadual no Rio de Janeiro, e da mulher, Márcia Aguiar, para a prisão em regime fechado. Ontem à noite, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar mantendo o casal em detenção domiciliar. Segundo a decisão, que revogou a determinação pelo encarceramento decidida, quinta-feira, pelo ministro Félix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os fatos narrados para justificar a colocação do casal em unidade prisional, de 2018 e 2019, não têm atualidade e não são suficientes para levá-los à penitenciária.

“Além de recair fundadas dúvidas sobre a contemporaneidade dos fatos invocados para justificar a segregação dos pacientes, a suposta conveniência para fins de instrução criminal e de garantia da ordem pública parecem se referir muito mais a conjecturas, como as de que o paciente teria influência em grupos de milícias e no meio político”, manifestou o ministro na decisão.

Gilmar, porém, determinou que os dois usem tornozeleira e sejam impedidos de deixar o país. O ministro salienta na decisão que deve-se considerar “o grave quadro de saúde do paciente, que deve ser compreendido dentro de um contexto de crise de saúde que afeta gravemente o sistema prisional”.

Mandado

Mas, até as 21h, prevaleciam os mandados de prisão contra Queiroz e Márcia, expedidos pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ). O despacho do desembargador Milton Fernandes salientava que Queiroz não pode ser levado para o Batalhão Especial Prisional, como solicitado no pedido de prisão do juiz de primeira instância Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal do TJ-RJ, cumprido em junho.

Os mandados cumpriam determinação de Fischer, desfazendo liminar que fora concedida pelo presidente do STJ, João Otávio de Noronha, que justificou a passagem de Queiroz do regime fechado para a prisão domiciliar devido a problemas de saúde.


Relatório do Ministério Público do Rio (MP-RJ), anexado à decisão de Fischer, a que o Correio teve acesso, aponta que Queiroz e a mulher atuaram para obstruir as investigações sobre o suposto esquema montado no gabinete de Flávio na Alerj. As investigações apontam que o ex-assessor recebeu pelo menos R$ 2,6 milhões do salário de então auxiliares do hoje senador. Parte do dinheiro, de acordo com as diligências, foi pago via depósitos em espécie cujo objetivo é não configurar a rachadinha.

Fischer ressaltou que não havia provas, nos autos, de que a saúde do ex-assessor esteja debilitada “ou mesmo que o seu tratamento não possa ter continuidade na própria penitenciária/hospital de custódia respectivo”. Além disso, segundo o ministro, a documentação reflete “estado de saúde pretérito, e não atual” de Queiroz.

Sumiço

O ministro cita decisão do juiz Flávio Itabaiana que pontuou que o ex-auxiliar de Flávio não compareceu a diversos depoimentos, em 2018, alegando necessidade de fazer uma cirurgia em São Paulo –– após a alta do hospital, não foi mais encontrado. Também citou o fato de a defesa ter informado como endereço de Queiroz ao Ministério Público, em julho do ano passado, um hotel no qual ele não se hospedou.

Fischer ressalta, ainda, trechos que afirmam que parte da rotina de ocultação de paradeiros do ex-policial militar “envolvia restrições em sua movimentação e em suas comunicações”, e que ele e Márcia, ao chegarem ao imóvel de Wassef em Atibaia, desligavam os seus celulares. “As manobras acima transcritas, para impedir a própria localização/rastreamento pela polícia, salta aos olhos”, anotou. (Colaborou Fabio Grecchi)

Fantasmas no gabinete de Carlos

O Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) está apurando possível contratação de funcionários fantasmas pelo gabinete do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos), filho do presidente Jair Bolsonaro, desde o primeiro mandato, em 2001, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro. Os indícios constam no inquérito que investiga o episódio e ao menos oito pessoas foram ouvidas desde julho de 2019 pelos promotores.

De acordo com o relatório, há servidores que não possuíam nem sequer o crachá da Câmara. Haveria ainda servidores idosos, que moram em outras cidades ou estados, enquanto estavam lotados no gabinete, algo que “inviabilizaria o cumprimento das funções de assessoria parlamentar”, segundo investigação.

Um dos casos citados é o da moradora de Nova Iguaçu (RJ) Diva da Cruz Martins, de 72 anos, que ficou no gabinete entre 2003 e 2005. Ela afirmou que nem sabia quem era funcionário do gabinete e que distribuía panfletos para o vereador. “Eu não encontrava com ninguém. Eu ia lá e voltava, não sei nem quem trabalhava lá”, disse.

Outro caso citado pelo MP na investigação é o do casal Ananda e Guilherme Hudson. Ela foi servidora entre 2009 e 2010, e enquanto atuava na Câmara cursou faculdade no município de Resende, a aproximadamente 170 quilômetros do Rio de Janeiro. Aos investigadores, ela disse que ia e voltava todos os dias, e que frequentava as aulas à noite. Ananda afirmou que não se recordava do nome de nenhum servidor e que jamais participou de reunião com Carlos.

Já Guilherme, que foi chefe de gabinete do vereador por 10 anos, disse que nunca teve crachá da Casa. Garantiu que “fazia análise da constitucionalidade e elaborava textos para projetos de lei”. Ele é primo de Ana Cristina Siqueira Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro e que também já foi chefe de gabinete de Carlos.

Pelas redes sociais, o vereador comentou o caso. “Procedimento que corre em segredo de Justiça misteriosamente vazado. Muito tranquilo e os esclarecimentos sendo prestados à Justiça e não a estes cujo objetivo todos sabem qual é!”, escreveu. (ST e RS)