As pressões sobre o procurador-geral da República, Augusto Aras, aumentaram a expectativa da Lava-Jato em Curitiba de que não haverá mudanças na estrutura da operação. Em setembro, o PGR terá de decidir se renova a atuação da força-tarefa por mais um ano — há um projeto no órgão para reunir todos os grupos de trabalho do Ministério Público Federal sob comando único, sediado em Brasília. Após reagir com irritação às críticas de colegas na sessão virtual do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF) da última sexta-feira, o procurador-geral baixou o tom em novo encontro ontem.
Durante sessão administrativa, que antecede a reunião ordinária, Aras adotou postura conciliatória e exortou os subprocuradores a evitarem “embates desnecessários”, já que as pressões sobre o MPF já são “muito fortes”. “Estamos todos no mesmo barco. Se esse avião afundar ou cair, todos nós caímos juntos”, disse o procurador-geral aos colegas. Possivelmente por falha técnica, parte da sessão administrativa foi transmitida ao vivo e, logo depois, interrompida.
Na noite da última sexta, em reunião virtual para votar o orçamento de 2021, os conselheiros expressaram, por meio da leitura de uma carta, oposição às críticas públicas de Aras ao funcionamento do Conselho e ao trabalho da Lava-Jato (leia Saiba mais). Em resposta, o PGR subiu o tom e acusou colegas de fazerem “oposição sistemática” a ele e de plantarem notícias falsas contra sua gestão e sua família, de forma anônima e “covarde”.
“Todas as matérias que saem na imprensa, é um procurador ou uma procuradora que fala. O anonimato mais do que inconstitucional e ilegal, é covarde. Eu não tenho medo de enfrentar nenhum argumento, eu tenho o costume de enfrentar tudo o que faço e digo e não tenho receio de desagradar”, afirmou Aras na ocasião. “Quando tivermos condições de conversar com a dignidade, sem a fake news, sem a covardia, sem a traição, sem a mentira propiciada por aqueles que estão aqui na Casa, eu acho que teremos paz”, continuou.
Também na sessão de sexta-feira, o procurador-geral disse ter provas das afirmações sobre irregularidades internas no MPF, como supostos “desvios” da Lava-Jato, e que elas já foram encaminhadas para a apuração dos órgãos competentes.
A pressão sobre Aras aumentou desde que ele ordenou diligência para o compartilhamento de informações da Lava-Jato em Curitiba, em São Paulo e no Rio de Janeiro (veja Memória). O procedimento, inicialmente autorizado pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, foi derrubado, na segunda-feira, pelo ministro Edson Fachin, relator dos processos da operação, mas o gabinete de Aras já informou que recorrerá da decisão.
Reformulação
Uma possível remodelação da equipe da Lava-Jato de Curitiba também vem sendo discutida na PGR. A ideia é instituir a Unidade Nacional de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Unac), subordinada ao procurador-geral, para atuar contra corrupção, atos de improbidade administrativa e crime organizado. Investigadores resistem à proposta e veem risco de perda de autonomia com a unificação.
A Lava-Jato em Curitiba teme que o grupo seja desmobilizado por meio do encerramento da equipe, que pode não ser renovada em setembro por Aras. Outra preocupação é com a possibilidade de abertura de sindicâncias contra os membros da equipe, com base em acusações de que estariam gravando ligações telefônicas sem autorização, assim como coletando dados de pessoas que não são investigadas formalmente.
A investida da PGR já chegou a São Paulo, onde a força-tarefa da Lava-Jato é alvo de uma sindicância para apurar como as operações foram distribuídas internamente. As diligências que correm na corregedoria do MPF serão conduzidas pela procuradora Raquel Branquinho.
Divisão
Na avaliação do cientista político André Pereira César, da Hold Assessoria Legislativa, a queda de braço entre PGR e forças-tarefas “não é questão de um lado ser ou não mais forte que o outro”. “Dada a realidade, essa decisão do Fachin mostra que há um grupo dentro do Supremo que, realmente, não está vendo com bons olhos esse esvaziamento da Lava-Jato por parte do Aras. Então, esse jogo vai longe ainda, haverá muitos desdobramentos, mas é muito ruim, em termos de Suprema Corte, você ter uma divisão como essa”, avaliou.
O especialista lembrou que, neste semestre, haverá mudanças no Supremo. O ministro Luiz Fux assumirá a Presidência da Corte, no lugar de Dias Toffoli, e o decano Celso de Mello se aposentará. “Quer dizer, um semestre que já seria complicado por conta disso ganha ainda mais dramaticidade, digamos assim”, acrescentou.
“Estamos todos no mesmo barco. Se esse avião afundar ou cair, todos nós caímos juntos”
Augusto Aras, procurador-geral da República