Cirurgia robótica: procedimentos menos invasivos e mais qualidade de vida aos pacientes

Hospital Brasília realizou mais de mil cirurgias com apoio dessa tecnologia, que traz diferenciais positivos, como menos dor, menos sangramento e alta precoce

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postado em 29/10/2021 15:00 / atualizado em 04/11/2021 23:10
 (crédito: Acervo Hospital Brasília)
(crédito: Acervo Hospital Brasília)

Por 20 anos, José Roque dos Santos carregou dores e dúvidas sobre o que fazer com as dificuldades para urinar, e o nódulo que começou a avançar, em determinado estágio da hiperplasia prostática benigna. “Esse câncer estava minando meus sonhos”, conta. O temor da cirurgia e possíveis sequelas o afastava da decisão sobre como proceder. Até que chegou a um ponto em que José, de 73 anos, não podia mais se esconder atrás do monitoramento da doença, necessitando de uma prostatectomia.

Encaminhado ao urologista Fransber Rodrigues, ele diz que “tremia nas bases, mas não tinha intenção alguma de operar”. Pacientemente, o médico e coordenador do Centro de Robótica do Hospital Brasília explicou que o uso da tecnologia seria menos invasivo. Que as mãos do robô são mais flexíveis, têm movimentos mais amplos e curvaturas que a própria mão humana não consegue executar. Que o robô atua como se fosse o braço do cirurgião. Que permite uma visão em três dimensões. Que reduz o sangramento. Que diminui o tempo de internação. Que o tempo da própria operação é menor.

(foto: Arquivo pessoal)

“Carrego cicatrizes muito pequenas. Só digo que é muito bom estar vivo e poder usufruir dessas modernidades”

O aposentado José, que nunca tinha sido submetido a qualquer intervenção cirúrgica, mudou de ideia após as explicações minuciosas sobre a cirurgia robótica. “Dr Fransber foi muito transparente. Me disse sobre que o procedimento era seguro, mas me alertou que ainda assim era uma cirurgia e tinha seus riscos”. 20 dias após a consulta, em junho deste ano, o baiano pai de seis filhos e avô de 13 netos submeteu-se à cirurgia robótica por cerca de quatro horas. Saiu na manhã seguinte.

 

Mais de mil cirurgias com auxílio do robô

Um dos poucos a oferecer a tecnologia, o Hospital Brasília já comemora mais de mil cirurgias robóticas, consolidando-se como referência no Centro-Oeste em alta complexidade. “Não estamos falando de futuro; isso é o presente”, adverte o ginecologista Frederico Correa, que tem doutorado pela Universidade de São Paulo, é professor da Universidade de Brasília e comanda uma equipe de cirurgia robótica da área ginecológica no Hospital Brasília.

Dr. Frederico Correa
Dr. Frederico Correa (foto: Acervo Hospital Brasília)

Um dos avanços na área de saúde, essa tecnologia minimamente invasiva é praticada no Hospital Brasília desde 2018, quando a cirurgia robótica completou 10 anos no Brasil. Ela garante mais precisão, incisões menores e tempo de recuperação mais rápido, entre as principais vantagens, em relação a cirurgias abertas. O procedimento já tem uso em várias áreas, como transplantes de rins, cirurgia bariátrica, câncer de próstata, endometriose, histerectomia, câncer ginecológico, retirada de tumor de intestinos, na cabeça e pescoço, e casos raros.

Com mais de 200 cirurgias assistidas por robôs, o urologista Fransber Rodrigues hoje coordena, também, cursos e treinamentos de capacitação nessa área, para o hospital. A cirurgia robótica começou “pequeninha, com apenas alguns braços guiando câmeras, em cirurgias laparoscópicas, que já existem há várias décadas”, explica.

O grande salto é que, enquanto a laparoscopia usa o sistema de vídeo para visualizar órgãos internos e manejo dos instrumentos cirúrgicos no abdômen, o método com auxílio do robô parte de uma plataforma chamada Da Vinci. O sistema é composto de três partes: uma para o processamento com tela; um console onde o cirurgião senta em frente ao visor, vê o campo operatório e maneja uma espécie de joystick para comandar as pinças do robô, e o que chamam de “carrinho do paciente”, onde ficam os braços robóticos, com as pinças que farão os procedimentos comandados pelo cirurgião no console. Nesse “carrinho” vai uma câmera, que envia as imagens necessárias ao console para visualização do cirurgião, já que ele estará afastado do paciente cerca de três metros, em média.

 

Como age o robô

Os braços robóticos se conectam a um tubo, que vai ao abdômen, e às pinças necessárias ao procedimento, também dentro do paciente. “O cirurgião, no console, consegue ver o interior do abdômen, e consegue comandar essas pinças”, segue explicando doutor Fransber.

Dr. Fransber Rodrigues
Dr. Fransber Rodrigues (foto: Acervo Hospital Brasília)

Uma das vantagens é que a visão da área a ser operada é ampliada, em três dimensões, ou seja, agrega a profundidade. E pode ser ampliada em até dez vezes. Permite movimentos semelhantes e até mais precisos do que os da mão humana, com mais destreza e precisão. Inteligente, o robô impede cortes desnecessários ou abusivos, pois a pinça faz alertas, reduzindo a probabilidade de erros. “Evita-se as grandes complicações das incisões em cirurgias abertas”, cita o médico. 

Outra equipe fica ao lado do paciente, auxiliando a operação. Os grandes e longos braços mecânicos em volta do paciente em cirurgia podem assustar alguns pacientes. Mas, lembra o médico, são apenas formas de facilitação do manejo das pinças. “Como se o robô fosse o braço do médico”, ressalta.

 

Visão magnificada

"O robô, não é ele que opera. Ele não tem nenhuma tecnologia autônoma. Ele, simplesmente, repete todos os movimentos que a gente faz no console. A diferença é que ele imita o movimento da nossa mão dentro do paciente, como se nossa mão tivesse três milímetros. Nada mais é do que uma ferramenta que ajuda o cirurgião a ser mais preciso." Arnaldo Nacarato, coordenador da cirurgia geral do Hospital Brasília e cirurgião do aparelho digestivo

“Aqueles braços robustos, braços de aranha, toda aquela máquina, não entra no corpo do paciente, fica para o lado de fora”, tranquiliza Nacarato. “Para se entender melhor, a pinça que entra tem um braço de 8 milímetros e a pinça, 3 milímetros”. Ele explica que o robô enorme tem a função de estabilizar as pinças. É possível, por exemplo, pausar. “Ele fica paradinho”.

“A precisão do uso das pinças. A magnificação da visão. A liberdade de movimento que as pinças dão ao cirurgião, a gente consegue manipular muito menos os tecidos internos, de uma forma mais precisa, gerando uma agressão muito menor ao organismo”, prossegue Fransber. Ele também afirma que o robô é uma ferramenta para ter algumas vantagens no momento da cirurgia. Teoricamente, pode ser usado para todas as doenças. Mas traz benefícios apenas para algumas específicas, em cada especialidade em que a plataforma robótica pode ser utilizada.

 

Cuidada e acolhida

“A qualidade de vida do paciente após este tipo de cirurgia é muito melhor, em relação a uma cirurgia aberta, por exemplo”, diz o cirurgião.

Dezesseis dias após a realização do procedimento robótico de tireoidectomia, Izabel Cristina Gadioli já estava em casa, ajudando os netos nas tarefas da escola. “Senti algum desconforto por conta do local da cirurgia, precisei reaprender a engolir os alimentos e beber líquidos, mas nada comparado ao que precisaria passar se tivesse realizado a cirurgia tradicional” relata a aposentada, de 66 anos.

(foto: Acervo pessoal)

Izabel pode ser um exemplo da qualidade de vida mencionada pelo médico. Ela sentia dores de garganta, acompanhadas por caroço na lateral do pescoço. Diagnosticada com constância como infecção comum, na garganta. No começo de 2020, para melhor visualizar um especialista pediu uma ressonância, que apontou câncer de orofaringe. A intervenção aberta seria muito invasiva: exigiria a abertura do maxilar com imobilização pós-cirúrgica da mandíbula por placas de metal.

Foi sugerida a cirurgia robótica no Hospital Brasília, pela cirurgiã de cabeça e pescoço, Marina Azzi. “Ela foi um anjo, cuidou de me explicar detalhadamente e me tranquilizou, pois era algo completamente desconhecido e é claro que fiquei apreensiva”, conta Izabel, que após a realização da cirurgia robótica, ficou apenas com uma pequena cicatriz atrás da orelha. Feita em abril de 2020, a cirurgia teve 9h30 de duração, mas após 24h na UTI, a aposentada foi para o quarto, onde ficou por cerca de 15 dias.

“Por conta da pandemia eu não pude ser acompanhada pela minha família. Mas me senti cuidada e acolhida com o carinho e apoio da médica e da equipe do Hospital Brasília”, declara ela.

 

Casos de aplicação

Na urologia, a robótica é a melhor opção para operar a próstata, bem como vários cânceres do sistema urinário. A Proctologia faz uso em cirurgias do intestino. A ginecologia, no caso de endometrioses, por exemplo. Cirurgias de câncer de útero, de câncer de ovário. A cirurgia geral faz bariátrica, opera hérnias.

O cirurgião Arnaldo Nacarato, que atua com robótica desde 2016, repete que essa tecnologia surge como um auxiliar potente, para a realização de cirurgias mais detalhadas, “com maior delicadeza e precisão”. Ele aplica em procedimentos do aparelho digestivo, como o esôfago, estômago, intestino, pâncreas, fígado. A cirurgia bariátrica, segundo o médico, é das mais procuradas, em função da crescente obesidade da população.

Ele também indica o procedimento com o robô para casos de refluxo, de tumores no intestino, fígado ou esôfago, casos de maior complexidade.

“E uso o robô para me ajudar em cirurgias difíceis”

Nacarato cita os problemas de aderência no intestino, que impedem intervenções por vídeo. Teria que ter corte. “O robô, como a visão é em 3D, você magnifica esse detalhe e você consegue ser muito mais preciso na cirurgia, mais delicado e ter mais segurança”.

 

Alta médica em muito menos tempo

Acostumado ao uso da laparoscopia há mais de 20 anos para cirurgias da área ginecológica, por ser minimamente invasiva menos agressiva do que a laparotômia ou cirurgia aberta, o médico Frederico Correa passou para a robótica. Ele explica que quanto menos invasiva, menos incisões, menos danos aos tecidos, menor risco de sangramento na parede abdominal e de infecção. E o retorno às atividades normais pela paciente é muito mais rápido.

“Essa cirurgia, minimamente invasiva, vem para resolver problemas operatórios e até um problema social. Porque se a paciente ficava afastada 30, 40 dias, antigamente, hoje ela fica uma semana”, cita. Ele diz que tem procurado usar mais as vantagens do robô, na medida que atenda às necessidades das pacientes.

O doutor Correa destaca, entre as vantagens do robô, a precisão de movimentos cirúrgicos. “O robô não treme”, destaca, elogiando a flexibilidade das pinças e a rapidez da sutura. “Mais precisa e mais rápida, do que quando estou fazendo com a laparoscopia. Por exemplo, ao retirar um mioma, essa tecnologia responde com uma sutura mais precisa na parede do útero, importante para o futuro reprodutivo da paciente”.

 

Divisor de águas

Menos dor, menos sangramento, menos tempo de internação. O paciente se alimenta e caminha mais precocemente. Evita as complicações das grandes incisões. Em alguns casos, reduz o tempo da cirurgia. Em outros, não. Continua a depender, tanto do paciente e sua situação, quanto da atuação do médico. “Mas a robótica torna mais fácil e mais simples os procedimentos para o cirurgião”, cita Correa.

“Outro ponto importante: imagine que um cirurgião pode ficar de oito a 10 horas em pé, com os dois braços levantados mexendo em pinças, ou pode passar esse mesmo tempo sentado, sem luvas, olhando para a cabine, confortavelmente, fazendo a cirurgia. O desgaste físico do cirurgião e até mesmo o cansaço de seus reflexos, certamente com a robótica é menor”, comenta.

Para o Hospital Brasília, é um ganho essa tecnologia. “Hoje, é o que existe de mais avançado, em termos de cirurgia e de tecnologia dentro da cirurgia, para a realização de cirurgias mais complexas e menos invasivas. Acho que é um divisor de águas, e a gente consegue fornecer para nossos pacientes o que tem de mais moderno no mundo”, diz Nacarato. “No futuro, vem muito mais coisas”, arrisca Correa.

Também já é possível usar a cirurgia robótica em tórax, pulmão, traqueia. E opera cabeça e pescoços, tumores da língua, tireoides. Com projeto de aplicação do mecanismo em crianças, em breve.

“No Hospital Brasília, nós capacitamos os cirurgiões. Antes de tudo, você precisa ter as ferramentas adequadas, como o simulador e uma equipe de cirurgiões que vai utilizar a tecnologia”, lembra Fransber, responsável pela área de capacitação tecnológica de profissionais de dentro e de fora do hospital.

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