
A guerra comercial iniciada por Donald Trump, especialmente com a China, abriu brechas e realinhamentos no comércio internacional que o Brasil pode aproveitar estrategicamente para minimizar os impactos da sobretaxação de 10% sobre os produtos nacionais importados pelos Estados Unidos.
Com as tarifas americanas sobre produtos chineses — e vice-versa —, a China passou a buscar outros fornecedores. O Brasil, com sua forte produção agrícola, torna-se uma alternativa ainda mais robusta em áreas como soja, carne bovina e frango. Na indústria de calçados e manufaturados, em razão da imposição de tarifas sobre produtos chineses, países como os Estados Unidos passaram a buscar fornecedores em outras regiões. A indústria brasileira de calçados também pode ocupar parte desse espaço.
Esses são dois exemplos de como o Brasil pode obter algumas vantagens diante da guerra comercial entre a China e os Estados Unidos. As mudanças nas dinâmicas comerciais globais, após a imposição de novas tarifas pelo político republicano, já começaram. Essa perspectiva é compartilhada pelo presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil), Jorge Viana. Entretanto, enfrentamos desafios logísticos, instabilidade regulatória e carga tributária, que podem limitar nossa competitividade. Há, portanto, que se redesenhar nossas estratégias de comércio exterior.
Entre todas as possibilidades, a que oferece mais oportunidades a curto prazo, porque não tem o desafio logístico dos mercados asiáticos, é a velha rota comercial do Atlântico. E a recente declaração de um porta-voz da União Europeia (UE) destacando que a conclusão de um acordo comercial com o Mercosul seria uma "grande oportunidade" para o bloco europeu sinaliza nesse sentido. Após o anúncio do tarifaço, António Costa, presidente do Conselho Europeu, afirmou, na rede social X, ser "o momento de apostar em novas relações comerciais e diversificar a rede do bloco", citando, em seguida, a ratificação do acordo de livre-comércio com o bloco sul-americano.
Com as tarifas impostas pelos EUA, as negociações entre Mercosul e UE podem ser aceleradas, mesmo diante de seus desafios. Países como a França, que sempre expressaram preocupações, especialmente em relação à proteção de seus setores agrícolas e à soberania alimentar, começam a rever suas posições. O presidente francês, Emmanuel Macron, chegou a classificar o pacto como "inaceitável" em sua forma atual. A aprovação da lei da "reciprocidade tarifária" pelo Congresso ajuda institucionalmente.
O acordo com a UE inclui compromissos ambientais alinhados ao Acordo de Paris e prevê medidas para combater o desmatamento. Esses aspectos são cruciais para garantir a sustentabilidade e a aceitação do pacto por todas as partes envolvidas. Nesse aspecto, a COP30, prevista para ocorrer em novembro, em Belém do Pará, pode ser um divisor de águas e superar essa dicotomia entre os interesses comerciais e a agenda ambiental.
Na verdade, as recentes tensões comerciais globais criam uma janela de oportunidade para a conclusão do acordo entre Mercosul e União Europeia. Para isso, é fundamental que as negociações considerem e atendam às preocupações dos diversos atores para assegurar um resultado equilibrado e benéfico para todos.